Mercado

Com Milei, bolsa argentina teve alta de 84% no 1º tri de 2024. Vale investir?

Especialistas afirmam que cenário atual do mercado é de otimismo, mas também de difícil previsibilidade

Com Milei, bolsa argentina teve alta de 84% no 1º tri de 2024. Vale investir?
Casa Rosada, a sede da presidência da República da Argentina. (Foto: Envato Elements)
  • No primeiro trimestre de 2024, o Merval (índice medido em dólares da bolsa de valores argentina) obteve uma alta de 84,41% em relação ao ano anterior, de acordo com a TC Economatica
  • Sua política econômica consiste na eliminação do déficit fiscal, a saúde financeira do Banco Central do país e tornar o gasto público eficiente
  • Para o analista Thiago Guedes, investir na bolsa argentina pode servir como uma opção de diversificação de portfólio

A postura fiscalmente dura do presidente da Argentina, Javier Milei, vem sendo vista com entusiasmo pelo mercado financeiro. No primeiro trimestre de 2024, o Merval (índice medido em dólares da bolsa de valores argentina) obteve uma alta de 84,41% em relação ao ano anterior, de acordo com a TC Economatica.

As expectativas são fundamentalmente otimistas. Mas será que vale a pena mesmo investir no país vizinho?

Na noite desta segunda-feira (22), Milei anunciou que o governo registrou seu terceiro superávit mensal consecutivo. No discurso, ele chamou o feito de “milagre econômico”, e afirmou que o excedente fiscal foi de aproximadamente 275 bilhões de pesos em março.

Publicidade

Invista em oportunidades que combinam com seus objetivos. Faça seu cadastro na Ágora Investimentos

Empossado em 10 de dezembro de 2023, Milei foi eleito no segundo turno superando o ministro da Economia do governo anterior, o peronista Sergio Massa. Sua política econômica feroz consiste em eliminar o déficit fiscal, aumentar a saúde financeira do Banco Central do país e tornar o gasto público eficiente. Logo no início, foi iniciado o chamado “Plano Motosserra”, visando o ajuste fiscal.

Como comparativo, durante o governo de Alberto Fernández (2019-2023), o desempenho do Merval foi aumentando gradativamente: de -35% (2020), 16% (2021), 41% (2022) e 63% (2023), de acordo com os dados da TC Economatica. Isso ocorreu principalmente devido à pandemia e às expectativas de mudanças de governo, pois os ativos se encontravam a preços muito baratos.

O analista da TC Economatica, Ricardo Amarilla, afirma que o atual governo argentino é totalmente pró-mercado. “Milei teve que tomar medidas de urgência, entre as quais se destaca uma forte depreciação do peso, passando o dólar atacado de US$ 366,45 para US$ 800 (118%) estabelecendo um crawling peg (flutuação cambial) de 2% mensal”, diz.

Para o analista, a principal medida foi o ajuste draconiano (ou severo) do déficit fiscal. O governo realizou um ajuste rigoroso nas contas públicas, visando zerar a dívida do país. Isso incluiu cortes substanciais em despesas como aposentadorias, obras públicas e transferências para as províncias.

Além disso, foi iniciado um processo de saneamento do Banco Central, acumulando reservas internacionais. Até o momento, estima-se que o Banco Central possua mais de U$ 700 bilhões em reservas, o que representa um saldo positivo.

Publicidade

Soma-se isso a uma política de taxas negativas e eliminação de passivos remunerados, e o resultado é uma forte queda no nível da atividade, esperando-se a desaceleração da inflação.

De acordo com o analista e diretor de negócios da Bridgewise, Thiago Guedes, uma das políticas adotadas por Milei que mais impactou a bolsa foi o controle de câmbio, para que o preço oficial ficasse próximo ao “dólar blue” – uma expressão usada na Argentina para se referir ao dólar norte-americano negociado no mercado paralelo. “Isso facilitou a condição de exportação das empresas exportadoras, principalmente as agrícolas. Acabou promovendo mais resultados e facilidades de importação para as empresas, impactando bastante a bolsa”, diz.

A visão do mercado sobre o governo Milei

De acordo com o economista argentino Héctor Rubini, as políticas do presidente que tiveram maior repercussão positiva foram a interrupção de interferências do Estado em questões regulatórias e a retirada de cargas tributárias anticompetitivas. “Tentou-se aprovar rapidamente um pacote para desregular os mercados, através de um decreto de urgência e de um projeto de lei, que foram rejeitados pelo Congresso. Agora o governo está tentando obter sua aprovação, mesmo várias mudanças em relação ao texto original”, afirma.

Rubini se refere ao Decreto de Necessidade e Urgência (DNU), que pretendia modificar ou revogar mais de 350 normas, como o fim da lei de terras, lei de aluguéis, lei de abastecimento e lei das gôndolas. Diversos artigos foram revogados e o texto ainda segue em debate no Senado.

Embora o mercado financeiro tenha registrado ganhos significativos em dólares a curto prazo devido à desvalorização dos ativos negociáveis, persiste uma grande incerteza sobre a sustentabilidade do plano econômico, principalmente em relação ao déficit fiscal, segundo Ricardo Amarilla, da TC Economatica.

Isso se deve ao uso da inflação como meio de reduzir as despesas públicas, o que pode não ser uma solução sustentável no longo prazo. Além disso, a aprovação legislativa é necessária para garantir a viabilidade do ajuste fiscal e estabelecer as bases para uma mudança estrutural na economia, que possa atrair investimentos e impulsionar um crescimento econômico sustentado, algo que não ocorre há uma década.

Apesar de sua determinação em abordar os problemas econômicos do país, o governo de Milei carece de uma base política sólida para aprovar as leis necessárias para desregulamentar a economia, estabelecer um orçamento nacional e implementar um novo regime monetário. A complexidade da situação inicial e a falta de apoio político dificultam a implementação eficaz das medidas econômicas.

Publicidade

Apesar desses desafios, é importante ressaltar o apoio popular significativo que o governo de Milei possui, com números próximos de 50% de aprovação na sociedade argentina, de acordo com a última pesquisa AtlasIntel.

No entanto, os efeitos negativos da recessão econômica, decorrente das políticas de austeridade, estão sendo sentidos pela população. A questão crucial é até quando o governo manterá esse apoio e quando os resultados de suas políticas econômicas poderão ser observados.

É hora de investir na Bolsa argentina?

Para o analista Thiago Guedes, investir na bolsa argentina pode servir como uma opção de diversificação da carteira. “Assim como em qualquer investimento, é importante não concentrar todos os recursos em uma única área, mas sim diversificar entre diferentes classes de ativos, países, moedas e tipos de empresa”, ressalta.

Dessa forma, esse investimento pode ser uma opção interessante se o portfólio também for composto por papéis de bolsas do Brasil, dos Estados Unidos, entre outros. Segundo Guedes, isso proporcionará uma maior segurança e a capacidade de participar do movimento de recuperação econômica da Argentina.

Segundo o economista Rubini, as expectativas para o mercado financeiro do país são otimistas. “A tendência nos mercados de ações e títulos é de compra, o prêmio de risco país está em queda e a tendência à dolarização tem diminuído”, diz.

Para ele, a diferença entre as taxas de câmbio paralelas e oficiais está diminuindo e a inflação está em queda. Sob essa perspectiva, o mercado financeiro está observando a possibilidade de liberalização do mercado cambial nos próximos meses, impulsionado pela entrada de dólares das exportações agrícolas, o que pode iniciar uma recuperação econômica até o final do ano.

Como investir na bolsa argentina?

A Merval se assemelha muito à B3, com a mesma ideia de negócio: um sistema para compra e venda de ações, tudo digitalizado e com uso intensivo de tecnologia. Ela é a terceira maior bolsa da América Latina, atrás apenas da brasileira e da mexicana.

Pessoas físicas do Brasil podem investir em ações argentinas por meio de plataformas globais, pois algumas empresas possuem ADRs (American Depositary Receipts) – recibos que permitem que investidores consigam comprar nos EUA ações de empresas não americanas.

Publicidade

Normalmente, por questões cambiais, os investimentos são realizados em dólares, para evitar a conversão para pesos argentinos.

Guedes, especialista da Bridgewise, cita um exemplo: “Você pode abrir uma conta na plataforma global do BTG e ter acesso às ações argentinas listadas na bolsa de Nova York. No entanto, investidores institucionais costumam realizar as transações diretamente na bolsa americana”.

Informe seu e-mail

Faça com que esse conteúdo ajude mais investidores. Compartilhe com os seus contatos