

O Ibovespa vivencia um surpreendente rali de alta que, até então, parecia estar fora do radar dos investidores. Dos últimos 16 pregões, o índice de referência da B3 fechou no campo negativo em apenas quatro dias, segundo dados da Elos Ayta Consultoria, enviados ao E-Investidor. A maior queda aconteceu no pregão do dia 11 de março, quando o índice encerrou com uma desvalorização de 0,81%. Do lado contrário, a sessão do dia 14 de março garantiu à bolsa brasileira a maior alta diária do mês ao registrar um avanço de 2,64%.
Com esse fôlego, o IBOV acumula hoje um desempenho mensal de 8,80% até o pregão desta quinta-feira (27), além de ser negociado acima dos 133 mil pontos. Nesta sexta, a principal referência da B3 recuou 0,94%, aos 131.902,18 pontos. Em março, o índice avança 7,41%. Se o índice continuar com esse ritmo até o fim do mês, consolidará o seu maior desempenho mensal desde novembro de 2023, quando registrou uma alta de 12,54%. No ano, o ganho está em 9,66%. Os ganhos se mantiveram mesmo com a presença de eventos desfavoráveis para os ativos de Bolsa.
Na última semana, o mercado acompanhou a apresentação do projeto de lei que propõe o aumento da faixa de isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil. Para compensar a perda na arrecadação, a proposta do governo prevê uma taxação com alíquotas de até 10% para quem possui uma renda mensal superior a R$ 50 mil – equivalente a R$ 600 mil por ano. E entre as rendas que passarão a entrar na base de cálculo desses contribuintes, estão os pagamentos de dividendos de empresa.
Logo na sequência, já na quarta-feira (19), veio a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central (BC), que elevou a Selic para o patamar dos 14,25% ao ano – o maior nível desde 2016. A autoridade monetária ainda comunicou ao mercado que deve manter a taxa Selic em patamares elevados por mais para assegurar a convergência da inflação à meta. Apesar do novo aperto monetário, o Ibovespa se mostrou resiliente e encerrou a última semana com uma alta de 2,63%, saindo de 128.957,09 pontos para 132.344,88 pontos. Diante desse cenário, surge a dúvida para o investidor: o que está sustentando os ganhos do IBOV?
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A resposta para essa pergunta está na dinâmica dos mercados lá fora. Desde fevereiro, as incertezas em torno dos efeitos das tarifas sobre os itens de importação, anunciadas pelo governo dos Estados Unidos, influenciaram na realização de lucros dos investidores sobre as ações das big techs americanas. Como mostramos aqui, as “7 Magníficas”, grupo que reúne as principais empresas do setor de tecnologia americano, como Apple (AAPL) e Tesla (TSLA), perderam mais de US$ 2 trilhões em valor de mercado em 2025.
“Com valuations elevados e um ciclo de alta expressiva nos últimos anos, os investidores podem estar buscando alternativas com melhor relação risco-retorno, como ações brasileiras que, em alguns setores, ainda estão descontadas”, diz Sidney Lima, analista da Ouro Preto Investimentos. Aliado a isso, houve também a decisão do Federal Reserve (Fed, o banco central americano), na última quarta-feira (19), que sinalizou a possibilidade de retomar o ciclo de afrouxamento monetário em 2025 após manter inalterados os juros americanos.
Se isso acontecer, a tendência é que o mercado brasileiro fique mais atrativo para os “olhos” do investior estrangeiro devido à diferença entre as taxas. “Teremos uma diferença de juros que resula em um prêmio interessante para o gringo. Isso favorecia uma vinda de capital estrangeiro ou a continuidade dela”, diz Enrico Cozzolino, head e sócio de análise da Levante Investimentos. Até o momento, esses fatores contribuíram para a vinda do capital gringo em direção ao Brasil, embora em volumes tímidos. Em 2025, segundoos dados mais recentes da B3, esse fluxo permanece com um saldo positivo de R$ 13,4 bilhões, contra a saída de R$ 21,8 bilhões durante o primeiro trimestre de 2024.
O que pode barrar a entrada do fluxo estrangeiro?
A consistência do fluxo de capital estrangeiro para o Brasil nos próximos meses vai depender de alguns fatores. Do lado externo, a guerra comercial, iniciada em fevereiro com o anúncio das tarifas de importação dos EUA, pode mudar essa dinâmicas devido aos seus efeitos na economia americana. Isso porque a medida pode pressionar a inflação dos Estados Unidos e atrasar o início da flexibilização da política monetária no país.
O mercado teme ainda que a maior economia do mundo entre em uma recessão ou caminhe para uma estagflação, quando há a combinação rara de alta dos preços junto com uma queda da atividade econômica, fenômeno bastante temido pelos economistas. “Nesse ambiente, a bolsa americana tende a passar por uma realização de lucro e a bolsa brasileira não estaria imune a esse movimento. A situação elevaria a aversão ao risco no mundo inteiro e, como consequência, reduziria o fluxo de capital estrangeiro para o Brasil”, diz André Barbosa, especialista em investimentos
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Além dos riscos em torno da economia americana, o campo fiscal brasileiro pode ser um fator preponderante para afastar o investidor estrangeiro do mercado doméstico. No ano passado, quando os investidores se depararam com mudanças das metas fiscais e retorno do ciclo de alta de juros para lidar com as projeções de alta da inflação, os rendimentos dos títulos do Tesouro Direto, como os papéis indexados ao IPCA+, alcançaram patamares históricos e roubaram a atratividade da bolsa brasileira. O pessimismo fez o Ibovespa cair 10,36% no acumulado de 2024.
O dólar também chegou a superar a marca dos R$ 6, reforçando a preocupação dos investidores com a trajetória da dívida pública. “Isso preocupa porque nós temos um tripé econômico, formado pelo campo fiscal, monetário e cambial, que continua desacordada. No momento que esse risco começar a ganhar força novamente, o estrangeiro vai ficar de fora”, avalia Alan Martins, analista da Nova Futura Investimentos. Esse gatilho pode ser desencadeado com a presença de novas medidas que possam expandir os gastos públicos para melhorar a popularidade do governo federal.