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Lula: como o mercado avaliou a “Carta para o Brasil do amanhã”

O E-Investidor escutou fontes do mercado para entender como a Faria Lima recebeu o documento do petista

Lula: como o mercado avaliou a “Carta para o Brasil do amanhã”
O governo Lula (2003-2010) teve bons marcos econômicos, mas o anúncio do fim do teto de gastos gera dúvidas sobre o equilíbrio fiscal em um possível 3° mandato. (Fonte: José Cruz/Agência Brasil)
  • O ex-presidente Lula (PT) publicou um documento prometendo uma política fiscal “responsável” e com “regras claras e realistas” se for eleito no domingo (30)
  • A “Carta para o Brasil do amanhã”, disponível nas redes sociais do petista, tem 9 páginas e traz 13 pontos, com resumos de propostas para diferentes áreas
  • O documento foi lido como um aceno positivo ao mercado, que cobra do candidato maior clareza em relação às propostas econômicas, mas alguns outros pontos do documento podem não agradar tanto

O pregão da bolsa de valores já tinha se encerrado nesta quinta-feira (27) quando o ex-presidente e candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT) publicou um documento prometendo uma política fiscal “responsável” e com “regras claras e realistas” se for eleito chefe do Executivo no domingo (30).

A “Carta para o Brasil do amanhã”, disponível nas redes sociais do petista, tem 9 páginas e traz 13 pontos, com resumos de propostas para diferentes áreas – uma espécie de segunda edição da “Carta ao povo brasileiro”, assinada por Lula na campanha de 2002.

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Entre as propostas, há algumas ligadas ao desenvolvimento econômico com investimentos, trabalho e renda, infraestrutura e reindustrialização. Um aceno ao mercado financeiro, que cobra do petista maior responsabilidade fiscal. Na tarde desta quinta-feira, o Datafolha mostrou Lula com 49% das intenções de voto, frente a 44% do presidente Jair Bolsonaro (PL). Veja o penúltimo levantamento do instituto antes do segundo turno.

Idean Alves, sócio e chefe da mesa de operações da Ação Brasil, destaca que o mercado aguardava há um bom tempo por alguma sinalização do candidato em relação a seus planos econômicos, que ainda não tinha acontecido. “Havia um hiato sobre qual seria a postura e a plataforma da diretriz econômica que ele adotaria, então esse comunicado de certa forma tranquiliza os investidores”, diz.

Por outro lado, alguns pontos deixam o documento menos “palatável” aos olhos do mercado. É o caso, por exemplo, da parte em que o documento de Lula cita o BNDES e a Petrobras como “empresas indutoras do crescimento e inovação tecnológica”, que terão “papel fundamental neste novo ciclo”.

“A parte boa para o mercado é que eles realmente parecem estar mais próximos de um Lula 1 do que um Lula 2 ou eventualmente um novo governo Dilma”, diz Mário Lima, analista sênior de política e macroeconomia da Medley Advisors. “Mas também não parece que o PT assimilou muito bem alguns dos ensinamentos do que o mercado julga como erros nos governos deles”, ressalta.

Veja a repercussão no mercado da “Carta para o Brasil do amanhã”:

Bruno Mori, economista e sócio fundador da Sarfin

“Na hora da divulgação, o dólar caiu forte, quase dez centavos e a bolsa subiu bastante. Depois foi corrigindo aos poucos. A carta não traz novidades, mas de certa forma é um afago. Fez um efeito imediato, mas o conteúdo não traz nada de novo.

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Lula vem sinalizando responsabilidade fiscal em um provável governo dele, embora já tenha anunciado que provavelmente irá mexer no teto de gastos. Apesar de não ter divulgado nenhum nome para o ministério da Economia, o mercado o conhece e entende que é um risco adicional, mas é um risco que já existe no governo atual. Manobras foram feitas para driblar o teto”.

Flávio Conde, analista de ações da Levante Ideias de Investimentos

“Com certeza é um aceno ao mercado e animou investidores que voltaram a comprar ações de Petrobras e Banco do Brasil, que vinham caindo desde segunda-feira (24). Porém, além da intenção de ser responsável fiscalmente, Lula escreveu que responsabilidade social também era importante, o que pode ser entendido como um aumento do déficit fiscal em 2023 visando o social.

Ainda quero saber qual será a postura em relação à Petrobras, principalmente em relação à política de paridade de importação, pois Lula disse em abrasileirar os preços dos combustíveis e isso já foi feito no governo Dilma e não deu certo. O mesmo vale para construção de refinarias que ele disse que investiria. Lembramos do prejuízo que deu na Abreu e Lima, que foi orçada em R$ 12 bi e saiu por cerca de R$ 100 bi”.

Gustavo Cruz, estrategista da RB investimentos

“Eu acredito que, mais do que essa carta, o que a Faria Lima vai acompanhar com bastante cuidado é a definição da equipe de ministros. Isso assim vai fazer bastante preço no mercado, porque, como foi dito ontem pelo Banco Central, ainda parece bem incerto qual a política econômica dos candidatos que chegaram na reta final e boa parte dos gestores dizem isso.

O que vai fazer preço mesmo, que pode ser pra cima ou para baixo, é a definição das pautas. O que vai ser prioridade para o ano que vem, qual a equipe econômica. Essa carta é mais do que ele já disse em outras entrevistas, bem parecido com o discurso que ele fala, de que ele tem credibilidade, de que sempre teve superávit. Mas o que a gente que vai fazer a diferença mesmo para afastar um pouco a incerteza eleitoral vai ser uma definição de equipe, caso ele seja vitorioso”.

Idean Alves, sócio e chefe da mesa de operações da Ação Brasil

“A divulgação da carta de Lula é positiva, já que o mercado esperava há um bom tempo por alguma sinalização do candidato em relação ao plano econômico.

O mercado olha com bons olhos, pois havia um hiato sobre qual seria a postura, e a plataforma da diretriz econômica que ele adotaria, então esse comunicado de certa forma tranquiliza os investidores.

O posicionamento dos candidatos em prol da responsabilidade fiscal era a sinalização que o mercado precisava para ficar mais confiante. A impressão passada era de que haveria expansão fiscal a qualquer custo.

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Na minha visão, a formalização de compromisso ajuda a animar os investidores que podem aguardar uma postura mais focada no desenvolvimento econômico, sem aumentar o endividamento do Estado de forma drástica”.

Juan Espinhel, especialista em investimentos da Ivest

“Dá para ler essa carta em duas vertentes: o lado econômico, olhando mais para o mercado, e de forma eleitoral. Foi bem mais do que ele já tinha sinalizado durante toda a campanha. Essa carta esclarece alguns pontos: claro que não dá pra detalhar ali em algumas páginas como ele pretende abordar isso de fato no governo, mas algumas sinalizações são importantes.

Usar o investimento público pra alavancar a economia, utilizando os bancos públicos. BNDES, Caixa e Banco do Brasil também; esses dois últimos são papéis que já estavam sensíveis e podem abrir o mercado amanhã bastante voláteis.

De certa forma, achei até prudente esperar o mercado fechar para divulgar a carta, porque a carta com certeza amanhã vai gerar preço. O ponto 13 do documento é bem importante: estabilidade fiscal. É uma sinalização super importante, porque hoje não temos âncora fiscal e isso impacta muito na hora de fazer alguma projeção para daqui a 5, 6 anos. Não ter uma âncora fiscal tem impacto nos juros, no dólar e na inflação. Então essa sinalização de responsabilidade fiscal com regras claras e realistas é muito positiva no mercado.

De maneira geral, politicamente isso pode ser muito bom para o Lula. Remete à “Carta ao povo brasileiro”, de 2002, que tem peso histórico, e provavelmente vai repercutir bastante”.

Mário Lima, analista sênior de política e macroeconomia da Medley Advisors

“Na parte do fiscal, o que a carta sinaliza para o mercado é que eles realmente parecem estar muito mais próximos do governo Lula 1 do que do governo Lula 2 ou mesmo dos da Dilma, e, nesse aspecto, isso é bom.

Alguns pontos ali acredito que não são bons para o mercado. Eles citam tanto o BNDES como a Petrobras para terem um papel de mais relevo na política econômica. Também acho que não é muito positivo ver a questão das obras públicas. Não parece que o PT assimilou muito bem alguns dos ensinamentos que o mercado julga como erros do governo dele.

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Existem também outras partes vagas, como a questão do mercado de trabalho, o que me parece que foi um pouco uma sinalização para a base que não deve ter um efeito muito prático, porque nesse Congresso que foi eleito provavelmente não terá como passar muitos projetos nessa linha. Existem algumas partes importantes, como a do meio ambiente, os compromissos que eles assumem em um mercado que está muito preocupado com a questão do ESG.

Me parece que sim, que ele faz uma sinalização um pouco na direção correta sob o ponto de vista do mercado financeiro”.

Ubirajara Silva, gestor da Galapagos Capital

“O mercado reagiu muito positivamente no momento em que a carta foi publicada. O dólar caiu e a bolsa subiu. Só que à medida que o pessoal foi lendo e vendo que era apenas um resumo do plano de governo dele, não falava nada sobre responsabilidade fiscal, o mercado acabou devolvendo todo o movimento. O movimento só mostra que segunda-feira (31) vai ser um dia bem animado por aqui”.

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