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- No começo do ano, a invasão comandada por Vladimir Putin levou a uma disparada dos preços do petróleo, comercializado acima dos US$ 130, à medida em que países aplicavam sanções à Rússia, um dos maiores exportadores mundiais da commodity
- Agora, o movimento de queda ocorre na esteira de temores de uma inflação global e seu reflexo sobre a demanda
- O E-Investidor conversou com o CEO da BRZ sobre a baixa nos preços das commodities e os impactos na Bolsa de valores
Na última quinta-feira (14), o petróleo chegou a seu menor valor desde o início da invasão da Ucrânia, em fevereiro deste ano. O barril de brent chegou a ser negociado abaixo dos US$ 95.
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No começo do ano, a invasão comandada por Vladimir Putin levou a uma disparada dos preços do petróleo, comercializado acima dos US$ 130, à medida em que países aplicavam sanções à Rússia, um dos maiores exportadores mundiais da commodity.
Agora, o movimento de queda ocorre na esteira de temores de uma inflação global e seu reflexo sobre a demanda.
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“O recente alívio no preço das commodities pode ser entendido pela duração da guerra entre Rússia e Ucrânia — que está se estendendo para além de muitas previsões. Com o passar do tempo, as cadeias de suprimentos conseguem se estabilizar de alguma forma”, afirma Ricardo Propheta, CEO da BRZ Investimentos, gestora independente com R$ 3 bilhões em ativos sob gestão e 25 fundos.
A maior queda desta semana ocorreu exatamente um dia após a inflação nos Estados Unidos ter renovado a maior alta em quatro décadas, o que levou os mercados a apostar que o Federal Reserve (Fed) deve seguir aumentando os juros. “A alta de juros e inflação apontam para uma eventual recessão no mundo. Neste cenário, a atividade econômica tende a se desacelerar, o que comprime potencialmente os preços das commodities”, pontua Propheta.
Esse cenário leva investidores a estimarem quedas da atividade industrial, no consumo e na arrecadação de impostos. É uma percepção que provoca desvalorização das ações de empresas e depreciação das matérias-primas como o petróleo.
Para o CEO da BRZ, a perspectiva mais provável é a de que tenhamos um cenário de estagnação da atividade global. “Ainda que seja prematuro para avaliar, o que é possível inferir com mais segurança é que os preços das commodities tendem a seguir em queda, caso se configure este cenário de recessão”, diz.
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No entanto, na avaliação de Propheta, o cenário continua favorável para quem investe em petroleiras. “As teses de investimento de quem acredita em empresas de petróleo continuam válidas. Apesar do recuo recente, os preços continuam atraentes, e o preço de produção, sobretudo das empresas listadas, estão bem menores do que os de venda”, afirma.
O E-Investidor conversou com o CEO da BRZ sobre a baixa nos preços das commodities e os impactos na Bolsa de valores. Veja os principais pontos da entrevista:
E-Investidor – Quais fatores influenciam no preço das commodities?
Ricardo Propheta – Com a pandemia, tivemos alguns grandes desarranjos em termos de cadeia de suprimentos de uma série de itens, commodities e industrializados. Tivemos a quebra de importantes cadeias de suprimentos que estavam e continuam, apesar de um pouco menos agora, acostumadas a lidar com um ambiente de mínimos estoques, de “tranquilidade” em termos de produção e logística. A pandemia interrompeu isso. No primeiro momento, a retomada da atividade econômica e do consumo, talvez um pouco mais acelerada do que era previsto pelos agentes econômicos, acabou promovendo o aumento da demanda das commodities.
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Passando desse raciocínio dos impactos da pandemia, temos a questão do conflito Rússia e Ucrânia, que atingiu duas regiões que não são relevantes quando se trata de cargas industrializadas pelo mundo, mas são importantes em produção e preço de commodities.
Rússia, Ucrânia e Belarus são grandes produtores de fertilizantes, fundamentais para a cadeia do agronegócio, além de terem produções agrícolas importantes, como trigo e girassol – que produz o óleo de girassol – e isso impacta no preço dos óleos vegetais. Então esse é outro fator.
Por trás disso tudo, tem o fato de que os Bancos Centrais do mundo há muitos anos estão despejando uma quantidade enorme de dinheiro para estimular as economias. Desde a crise de 2008 e 2009, temos visto muita emissão de dinheiro, taxas de juros que chegaram a ser negativas em partes do mundo e isso tudo acaba trazendo um potencial de inflação de uma forma generalizada, que reflete nos frutos que estamos colhendo agora.
Talvez a pandemia e o conflito entre Rússia e Ucrânia sejam catalisadores de um processo que já vem sendo construído muito antes.
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E-Investidor – A Guerra na Ucrânia permanece sem solução, mas as cotações das commodities registraram queda nas últimas semanas. O que mudou para o mundo sentir um alívio nos preços?
Propheta – O recente alívio no preço das commodities pode ser entendido pela duração da guerra entre Rússia e Ucrânia — que está se estendendo para além de muitas previsões. Com o passar do tempo, as cadeias de suprimentos conseguem se estabilizar de alguma forma. Em um primeiro momento, tivemos impactos mais intensos, com grandes sanções à Rússia e Belarus, e uma escalada nas cotações como efeito colateral.
Mas, num segundo momento, isso se normaliza, em termos relativos. Outro fator é de ordem macroeconômica global, com a alta de juros e inflação apontando para uma eventual recessão no mundo. Neste cenário, a atividade econômica tende a se desacelerar, o que comprime potencialmente os preços das commodities.
O petróleo voltou para patamares pré-invasão da Ucrânia, ou seja, abaixo dos US$ 100. Como fica quem investe em petroleiras?
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Propheta – As teses de investimento de quem acredita em empresas de petróleo continuam válidas. Apesar do recuo recente, os preços continuam atraentes, e o preço de produção, sobretudo das empresas listadas, estão bem menores do que os de venda. Então, no geral, o panorama continua favorável às empresas de petróleo e aos investidores de petroleiras.
E-Investidor – Há previsão para a normalização dos preços das commodities?
Propheta – É difícil utilizar a palavra normalização porque os preços podem não voltar ao patamar anterior. A Guerra na Ucrânia não terminou. O cenário é incerto: pode ser que termine rápido, mas também que se prolongue. A perspectiva mais provável é a de que tenhamos um cenário de estagnação da atividade global.
Ainda que seja prematuro para avaliar, o que é possível inferir com mais segurança é que os preços das commodities tendem a seguir em queda, caso se configure este cenário de recessão.
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Na Bolsa, quais setores ganham e quais perdem com a instabilidade no preço das commodities?
Propheta – Instabilidade de preços é ruim de forma geral — ou seja, todos os setores envolvidos, direta ou indiretamente, têm mais dificuldades em fazer planejamento de produção, entre outros pontos. Agora, na Bolsa, quem ganha com a alta dos preços das commodities são os setores produtores, como petróleo, celulose, carne, entre outros.
Na outra ponta, quem perde são as empresas consumidoras, ou que têm commodities como insumo para suas produções. Exemplo: se a soja a sobe, as empresas produtoras de carne são impactadas. Se o petróleo sobe, as transportadoras sentem um reflexo, por exemplo, e assim por diante.
O conflito entre Rússia e Ucrânia ainda causa impactos nesse sentido?
Propheta – Na Bolsa, podemos pensar que existem empresas que produzem fertilizantes e poderiam se tornar substitutos. Existem as empresas produtoras agrícolas que, se por um lado se prejudicam com insumos mais caros, por outro são produtoras de commodities que têm os seus preços elevados. É saudável para o investidor acompanhar o desempenho dessas empresas.
Ainda que o preço do petróleo tenha recuado recentemente, há um impacto, pois o patamar de preços ainda está acima do período pré-conflito. A Rússia é uma grande produtora e o preço do petróleo naturalmente sobe. São preços bem superiores ao que estávamos acostumados e isso tem um impacto em toda economia. Há empresas que são diretamente produtoras, como a Petrobras. E há o impacto da alta do custo da energia, que causa inflação e afeta todas as empresas, das pequenas até as grandes companhias.
Pensando em mercado externo, como a desorganização da logística das exportações reflete na Bolsa brasileira?
Propheta – Temos efeitos de curto prazo em empresas que necessitam de itens industriais chineses para sua produção ou que exportam para a China. Mas, nesse segundo caso, pouco impacta na bolsa brasileira, já que o Brasil pouco exporta produtos industrializados para a China. Acredito que, com a normalização das cadeias logísticas da China, o impacto não será relevante.
A descoberta de uma nova variante do coronavírus na China e o risco de novos lockdowns também ligam o sinal amarelo para os investidores. Como proteger o portfólio?
Propheta – Depois que atravessamos a pior parte da pandemia, o mundo segue atento a novos riscos epidemiológicos. Esta nova variável na China já está no radar do mercado. Ao investidor, para se proteger, é preciso fazer uma releitura retrospectiva da covid-19: setores que performaram bem neste período são logística, agrícola e infraestrutura — mais resilientes — e que seguirão merecendo atenção.
De outro lado, é importante evitar setores mais expostos, como o de turismo, restaurante e tudo que depende de mobilidade das pessoas. De forma geral, acredito que estamos melhor preparados e já saberemos como conduzir a situação de forma mais controlada.
No atual momento de incertezas na Bolsa, o senhor entende que investir em infraestrutura é uma boa opção?
Propheta – Sim. Os fundos de participação em infraestrutura, por exemplo, tiveram uma onda de lançamentos no pré-pandemia. Temos visto descontos nos preços desses fundos que não fazem sentido no atual momento, principalmente se você pensar que os ativos existentes neles, em sua maioria, são resilientes a momentos de crise, com perspectiva de estabilidade de fluxo por longo prazo, e têm as suas receitas atreladas ao crescimento da inflação.
Os investidores deveriam ficar atentos a essa classe de ativos, já que podem ser portos seguros rentáveis em momentos de alta volatilidade.
No Brasil, temos características diferentes em relação aos países desenvolvidos. Quando falamos sobre retornos de infraestrutura nesses locais, pensamos em investimentos de longo prazo, estáveis, resilientes, mas com baixas taxas de retorno. Aqui ainda temos as altas taxas de retorno pelo fato de ser um país em desenvolvimento e com uma carência grande em infraestrutura.
A única restrição que faço é que os fundos de investimentos em participação, independentemente de serem de infraestrutura ou não, são restritos ao investidor qualificado. Ou seja, não é todo investidor que tem acesso a esses fundos. No entanto, há empresas de logística e infraestrutura que são listadas na Bolsa e podem ser boas alternativas para investidores que não são qualificados.
Teremos eleições no final do ano. Há alguma recomendação específica para o investidor para esse período?
Propheta – Eleições trazem momentos de volatilidade para o mercado. O investidor que não está disposto a encarar essa fase não deve fazer novos investimentos. No entanto, são esses momentos que acabam trazendo boas oportunidades de compra. Para quem tem apetite, acredito que vale ficar atento às oportunidades.