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5 motivos que mostram por que o mercado está criticando o pacote fiscal

Investidores se frustraram com a proposta de isenção do IR para quem recebe até R$ 5 mil mensais

5 motivos que mostram por que o mercado está criticando o pacote fiscal
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, durante coletiva para explicar o pacote de corte de gastos do governo. Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

O tão aguardado pacote fiscal do governo federal foi anunciado na noite de quarta-feira (27). Em pronunciamento feito em rede nacional de TV, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, deu mais detalhes sobre as medidas e informou que as iniciativas devem gerar uma economia de R$ 70 bilhões aos cofres públicos em dois anos. Um outro anúncio, no entanto, mexeu com os ânimos dos investidores: a proposta de isenção de Imposto de Renda (IR) para quem ganha até R$ 5 mil por mês.

Em seu discurso, Haddad afirmou que o benefício não trará impacto fiscal, porque será compensado por quem recebe mais de R$ 50 mil mensais, que “pagará um pouco mais”. As contas do governo, porém, ainda geram dúvidas nos investidores, que carecem de mais informações sobre o modo como irá funcionar a mudança na faixa de isenção do IR.

Para a equipe da Ágora Investimentos, a mistura de dois grandes processos complexos do ponto de vista legislativo – cortes de gastos e alteração de tributação – foi uma sinalização ruim para os mercados. “Em outras palavras, podemos dizer que os investidores passaram mais de um mês aguardando o anúncio de medidas efetivas e foram surpreendidos com a notícia de isenção de impostos que deve gerar uma despesa de R$ 40 a 50 bilhões”, afirma a casa em relatório.

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A mudança no IR preocupa, porque poderá representar perda de receita, a depender de como for desenhada a compensação citada por Haddad. O sentimento é de que a medida deve anular os efeitos positivos do pacote fiscal, colocando em xeque o real comprometimento do governo com as contas públicas.

Em relação às propostas anunciadas para contenção de despesas, as principais foram:

  • Alinhamento do modelo de reajuste do salário mínimo à regra de despesas do arcabouço fiscal (com crescimento de no máximo 2,5% e, no mínimo, 0,6% ao ano acima da inflação);
  • Imposição de um teto para reajustes salariais no setor público;
  • Regras mais rígidas de elegibilidade e triagem para o acesso a benefícios sociais.
  • Idade mínima de aposentadoria para membros das Forças Armadas, além de outras regras que devem gerar economias no regime de pensões militares;
  • Proibição de criação ou ampliação de benefícios e isenções fiscais em caso de déficits fiscais primários.

De acordo com o governo, as medidas serão enviadas ao Congresso em dois blocos – por meio de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) e de projeto de lei (a quantidade de propostas legislativas ainda não foi confirmada).

A reação negativa dos investidores com o pacote fiscal pode ser observado no pregão desta quinta-feira (28). O dólar sobe 1,24% a R$ 5,986, depois de chegar a atingir máxima a R$ 6,0036. Já o Ibovespa recua 1,35%, aos 125.944,66 pontos. A seguir, elencamos os principais motivos que deixaram o mercado frustrado com as medidas anunciadas pelo governo:

Atraso do pacote

Antes do anúncio do pacote propriamente dito, a demora na apresentação das propostas já havia deixado os investidores decepcionados. Inicialmente, o conjunto de medidas estava previsto para ser divulgado após a realização do segundo turno das eleições municipais. Depois, a previsão passou para a data posterior à reunião da Cúpula de Líderes do G20 no Rio de Janeiro. Veio então um novo adiamento, com o plano sendo apresentado apenas na quarta-feira.

Em relatório, o diretor de pesquisa macroeconômica para a América Latina do Goldman Sachs, Alberto Ramos, afirma que o pacote parece “muito atrasado” para as atuais necessidades da economia brasileira. Na visão dele, as medidas apresentadas também são excessivamente concentradas no longo prazo.

Isenção do IR para quem ganha até R$ 5 mil

Ramos acredita que a inclusão de uma medida de estímulo que reduz a arrecadação do IR, combinada com uma tributação incerta de contribuintes de alta renda, reforça a percepção de que o governo mantém uma estratégia de “arrecadar e gastar”, em vez de focar no ajuste fiscal.

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Por outro lado, Felipe Miranda, co-CEO e fundador da Empiricus, avalia que a reação inicial do mercado foi mais pessimista e negativa do que deveria. “Se a isenção vier acompanhada de medidas de compensação para a redução da arrecadação, ela pode ser neutra”, indica.

Propostas incertas e difusas

Outra crítica de Ramos, do Goldman, é em relação à elaboração das propostas, que parecem “pouco direcionadas”, em sua opinião. Ele também enxerga que as medidas apresentam um rendimento incerto e não são tão claras quanto aos seus benefícios para a política fiscal.

Já na visão da Ágora, o pacote foi frustrante, na medida em que as incertezas não foram dissipadas. “Para mercados, dificilmente teremos alívio nos juros futuros, no câmbio e nem tampouco melhora para os ativos de risco”, afirma a corretora.

Em nota enviada à imprensa, Felipe Salto, economista-chefe da Warren Investimentos, pondera que as ações do governo são positivas, em geral, colaborando para o ajuste das contas, mas são insuficientes para produzir um resultado primário adequado à meta estabelecida em lei.

“Apesar da estimativa contida no pronunciamento indicar um efeito de R$ 70 bilhões, esse montante, incerto, se viabilizado, seria insuficiente para as necessidades do ajuste fiscal e do alcance das condições de sustentabilidade da relação dívida/PIB (indicador que mostra o tamanho da dívida de uma nação em comparação com sua economia)”, pontua.

Tamanho das medidas

O mercado ainda tem dúvidas de que o pacote atingirá realmente a economia de R$ 70 bilhões projetada pelo governo. “Devemos ficar entre R$ 40 e R$ 50 bilhões. Interpretamos o anúncio de ontem como uma tentativa de evitar um colapso fiscal. O pacote apresentado tem falhas e deveria ser muito mais restritivo, mas é o que é viável no momento”, diz Miranda, da Empiricus.

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Ele ressalta que o conjunto de medidas cria uma ponte até 2026, quando será essencial promover uma rediscussão das propostas. “A partir de 2027, independentemente de qual governo for eleito em 2026, será inevitável, por uma questão aritmética, revisitar a questão fiscal e redefinir o tamanho do Estado brasileiro”, destaca.

Dificuldade de aprovação pelo Congresso

Mais uma preocupação está relacionada às dúvidas quanto à aprovação das propostas pelo Congresso nacional. “Atuação firme nesse sentido será essencial, já que as medidas ainda precisam ser aprovadas, o que, além de poder significar que parte das discussões devem ficar apenas para o ano que vem, pode levar a uma desidratação, o que significaria novas pressões sobre o dólar e sobre o mercado brasileiro”, destaca Paula Zogbi, gerente de research e head de conteúdo da Nomad.

Ela afirma que agora, além de calcular os impactos do pacote fiscal, será importante acompanhar se de fato haverá um comprometimento do governo com as medidas anunciadas.