

O mercado acionário brasileiro vive um momento conturbado, impulsionado principalmente pela guerra comercial entre China e Estados Unidos, intensificada pelo aumento das tarifas impostas pelo presidente Donald Trump. Desde a máxima do ano, registrada em 27 de março, até a última sexta-feira (11), o Ibovespa recuou dos 133.149 pontos para os 127.682 pontos, queda de 4,11%. Analistas ouvidos pelo E-Investidor apontam quais empresas devem ser mais impactadas pelas medidas e quais podem representar um porto seguro para os investidores neste momento.
Nesta sexta-feira (11), a China anunciou que aumentará suas tarifas de importação sobre produtos dos EUA de 84% para 125%. A medida é uma resposta às elevações impostas por Trump, que aumentou as tarifas para 145%. Uma nota divulgada pelo governo chinês criticou as medidas norte-americanas, afirmando que “mesmo que os EUA continuem a impor tarifas mais altas, isso não fará mais sentido econômico e se tornará uma piada na história da economia mundial”.
O impacto da guerra comercial também se reflete no Brasil. Na primeira semana de abril, os Estados Unidos impuseram tarifas de 10% sobre produtos brasileiros, somando-se às taxas anteriores de 25% sobre aço, alumínio, veículos e peças automotivas.
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Segundo Chrystian Matias, analista da Levante Inside Corp, essas medidas afetam diretamente empresas brasileiras do setor industrial, e o investidor deve ficar atento aos possíveis reflexos no desempenho dessas companhias. “O impacto da guerra comercial chegou ao Brasil. Na primeira semana do mês, os EUA impuseram tarifas de 10% sobre produtos brasileiros, além de medidas anteriores sobre aço, alumínio, veículos e peças automotivas.”
Para Matias, as empresas que ficam na mira do tarifaço de Trump são Embraer (EMBR3), Iochpe-Maxion (MYPK3), Tupy (TUPY3) e Mahle Metal Leve (LEVE3). De forma mais indireta, também podem ser afetadas Kepler Weber (KEPL3) e Rumo (RAIL3). Já Virgílio Lage, especialista da Valor Investimentos, e Ilan Arbetman, analista da Ativa Investimentos, lembram que outras companhias também estão na mira, caso das siderúrgicas Usiminas (USIM5) e CSN (CSNA3).
Arbetman lembra que as siderúrgicas de capital aberto devem ser menos impactadas, pois o peso das exportações para os EUA no portfólio destas empresas é muito pequeno. Mais de 80% das exportações brasileiras são realizadas por outras empresas. Ele diz que no cenário desafiador que o setor se encontra, dado o crescimento das importações de aço, a maior dificuldade em acessar um importante mercado via exportação tende a ser considerada mais uma notícia negativa. No entanto, ele ressalta que o verdadeiro impacto às empresas ainda é incerto.
Segundo Matias, a Tupy registrou, em 2024, 23,1% de sua receita com vendas diretas aos Estados Unidos, enquanto 17,4% foram destinadas ao México — onde os clientes podem adquirir os produtos e exportá-los incorporados em veículos acabados para o mercado norte-americano.
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Ele destaca que a Tupy ocupa uma posição única como líder na produção de blocos e cabeçotes de motor em ferro fundido para montadoras ocidentais, com contratos de longa duração e cláusulas de repasse de preços. “Acreditamos que a Tupy conseguirá repassar a tarifa de 10% imposta sobre produtos brasileiros. No entanto, esse ajuste pode pressionar volumes e afetar a demanda”, avalia o analista.
Para a Iochpe Maxion, a exposição à América do Norte é mais significativa, com uma distribuição de receitas bastante equilibrada entre América do Sul, América do Norte e Europa. “A companhia, no entanto, se beneficia do fato de que as novas tarifas não foram estendidas ao México — base importante de produção voltada ao atendimento de clientes norte-americanos”, explica.
Já na visão dos analistas do Itaú BBA, há a possibilidade de uma reorganização na produção de veículos do México para os EUA, resultando na Iochpe e na Tupy exportando seus produtos mexicanos ou de outras regiões para os EUA. Eles explicam que ambas as empresas fabricam peças usadas em veículos pesados que não foram incluídas nas novas tarifas. Ou seja, embora a situação não seja tão otimista por causa das tarifas, há a possibilidade de o caminho ser menos nebuloso para as duas companhias.
No caso da Mahle Metal Leve, aproximadamente 10% das vendas da companhia têm como destino os Estados Unidos. Além disso, há exposição indireta à região por meio da Europa, onde clientes utilizam seus componentes de motor em veículos posteriormente exportados ao mercado norte-americano.
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A Embraer (EMBR3) também está na lista. O Citi calcula que a Embraer (EMBR3) pode ter uma redução de 9% no Ebitda (lucro antes de juros, depreciação, amortização e impostos) de 2025, por conta do impacto das tarifas dos EUA de 10% sobre as importações da companhia. O analista da Levante diz que a fabricante de aviões também pode ser afetada pela desaceleração econômica dos Estados Unidos.
Ainda assim, ele pondera que a Embraer se beneficia da posição relativamente mais desfavorável de alguns concorrentes, como a divisão de jatos comerciais da Airbus, que exporta aeronaves da França e estará sujeita a tarifas mais elevadas. “Por outro lado, concorrentes no Canadá, como a Bombardier e a divisão executiva da Airbus, devem enfrentar condições tarifárias mais favoráveis, o que pode limitar esse diferencial competitivo”, diz Chrystian Matias.
Quais ações ter na carteira para se salvar das tarifas de Trump?
Para evitar uma taxação, os analistas estimam algumas empresas que podem sofrer praticamente nenhum impacto. Virgílio Lage, especialista da Valor Investimentos, lembra que as melhores small caps e ações para fugir do tarifaço de Trump são empresas com maior consumo interno no Brasil, bancos e empresas do setor elétrico.
Ilan Arbetman, da Ativa Investimentos, concorda que empresas do setor elétrico e do mercado interno podem ser uma boa alternativa para o investidor. Ele comenta que há também a possibilidade de aportar em empresas de commodities. Ele afirma que a Gerdau (GGBR4), uma siderúrgica, tende a se beneficiar da questão tarifária.
“Em um primeiro momento, acreditamos que a Gerdau pode se beneficiar por dispor de cerca de 30% do seu Ebitda anual. Isso porque a empresa possui produção nos EUA, ou seja, ela não será taxada e terá um produto de valor mais atrativo em relação aos concorrentes que produzem fora dos Estados Unidos”, diz Arbetman.
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Mesmo assim, o analista mantém recomendação neutra para a companhia por causa do preço da ação, que, para ele, está esticado. As ações preferidas da Ativa agora são Equatorial (EQTL3), Sabesp (SBSP3), Copel (CPLE6) e Suzano (SUZB3). São companhias do setor elétrico e saneamento com preços atraentes, o que condiz com a estratégia da Ativa e da Valor Investimentos. A Suzano é uma empresa de commodity com exportação ligada à China, o que pode ser uma boa opção para fugir da taxação dos Estados Unidos.
Já as desejadas pela Levante são Fras-le Mobility (FRAS3), Randon (RAPT4), WEG (WEGE3) e Marcopolo (POMO4). No caso da Fras-le, o especialista diz que a empresa destina um pouco menos de 10% de suas vendas ao mercado norte-americano. Por outro lado, o mercado dos Estados Unidos possui, de forma geral, baixa capacidade de produção local para os tipos de peças que compõem o portfólio da Fras-le. Isso pode tornar seus produtos mais competitivos em relação aos itens importados da China, especialmente diante de possíveis alterações tarifárias de Trump. Para a Randon, o preço descontado do ativo justifica a recomendação de compra do analista.
A Marcopolo possui exposição direta muito limitada aos Estados Unidos, tornando os impactos das tarifas praticamente nulos. “O mercado de ônibus brasileiro permanece resiliente após os anos desafiadores da pandemia e do subsequente período de sub-renovação, com uma frota envelhecida que hoje demanda modernização”, diz Chrystian Matias. Ou seja, mesmo com a empresa sendo do setor automotivo, taxado por Trump, o fato dela focar no mercado interno deixa a ação interessante para o investidor.
Já para a WEG, a estimativa é de que grande parte das vendas destinadas aos Estados Unidos seja atendida a partir do México, conferindo maior resiliência frente à imposição de tarifas adicionais. Ele lembra que a companhia ainda se beneficia da recente aquisição da base industrial da Marathon, nos próprios EUA, que possui capacidade ociosa e pode ser utilizada para expandir a produção local, se necessário. Ou seja, os analistas mostram que o ideal é diversificar a carteira, com parte dela na economia local em ações resilientes e outra em ações do próprio setor industrial que não será tão impactado pelas tarifas de Trump.
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