Alta do dólar é uma das consequências do aperto monetário nos EUA. (Foto: Envato)
Enquanto o mercado global acompanha com cautela o aperto monetário nos Estados Unidos – que nesta quarta-feira (27) elevou a taxa de juros norte-americana em 75 pontos-base para o intervalo entre 2,25% e 2,5%–, os investidores brasileiros têm ainda uma outra preocupação. De que forma a desaceleração da economia dos EUA, e até uma possível recessão, vai impactar o mercado doméstico?
O movimento começou a ser sentido no Ibovespa nos últimos meses, com pregões de muita volatilidade, acompanhando as quedas das bolsas norte-americanas. Por mais que o Brasil tenha antecipado o ciclo de juros e já vislumbre o final das altas na Selic, a taxa básica de juros da economia doméstica, a alta nos juros dos EUA torna os ativos brasileiros menos atraentes aos olhos do investidor estrangeiro.
Para Marcus Labarthe, sócio-fundador da GT Capital, o momento é de “volta aos Estados Unidos”, com o capital global retornando para onde se sente mais protegido. “Vemos os títulos brasileiros a patamares pouco vistos e ainda sim com dificuldades de atrair capital internacional. Isto é reflexo do medo com o futuro”, afirma.
Esse cenário gera dois movimentos principais para o Brasil: redução do fluxo de capital gringo na B3 e aumento do dólar. E ambos já estão acontecendo.
De dezembro de 2021 a março deste ano, a entrada de capital estrangeiro na bolsa de valores brasileira foi bastante positiva. De lá para cá, porém, o movimento se reverteu. O único mês em que a entrada de recursos estrangeiros no País superou a saída foi junho por causa da privatização da Eletrobras, explica Gustavo Cruz, estrategista da RB Investimentos.
“Quando começou a ficar mais claro que os EUA iam precisar subir mais a taxa de juros, o fluxo estrangeiro vira para o negativo. A continuidade do aperto monetário lá atrai mais recursos para os Estados Unidos e acaba afastando um pouco dos mercados emergentes”, afirma Cruz.
Publicidade
Mas não é só os juros que estão afastando os gringos do investimento no Brasil. Na visão da gestora global Janus Henderson, tem um outro fator que impede uma alocação maior no País; veja a entrevista completa.
A proximidade das eleições também entrou no caminho. Fabio Louzada, economista, analista CNPI e fundador da Eu me Banco, afirma que propostas como a PEC Kamikaze, que libera gastos bilionários do governo às vésperas do pleito, aumentam os temores com a situação fiscal do Brasil. Outro fator que colabora para essa fuga do capital estrangeiro.
“Isso alimentou o temor do mercado em relação à percepção de risco fiscal e furo do teto de gastos. Diante desse cenário de insegurança, o investidor prefere migrar para outras economias”, diz.
Com a saída dos estrangeiros, quem sofre é o Ibovespa, que amarga quedas e vem lutando para se manter na faixa dos 100 mil pontos desde que o Fed iniciou o aperto monetário nos EUA. Nos primeiros meses do ano, a alta dos preços internacionais de commodities ajudaram a sustentar as altas no índice, assim como valorizar o real frente ao dólar. Mas o cenário foi se ajustando conforme o medo nos mercados globais aumentou.
Publicidade
Marcus Labarthe, da GT Capital, explica que poucas ações conseguem se beneficiar nesse cenário, mas aquelas empresas que conseguem repassar ao consumidor a alta nos preços em seus produtos são mais beneficiadas. “Vejo com destaque setores de seguros, como BB Seguridade (BBSE3), e os exportadores atrelados ao dólar , como Suzano (SUZB3). Os menos beneficiados são os setores que têm maior dificuldade em repassar a alta da matéria prima e da inflação, como varejo e construção civil”, diz.
Dólar pode continuar em alta
Quem também tende a jogar contra os investidores brasileiros é o dólar. Desde junho, a moeda norte-americana vem acentuando as altas frente à brasileira, chegando a bater os R$ 5,50 na última semana.
E a decisão do Fed em aumentar os juros pode contribuir para manter a moeda dos EUA em alta. “Há uma crescente preocupação com uma possível recessão que pode ser causada pelo aumento de juros lá fora. Em um cenário desse, com aversão a risco, medo global de uma possível recessão, há uma corrida por ativos seguros como o dólar”, diz Felipe Steiman, gerente comercial da B&T Câmbio.
A tendência é que a moeda norte-americana continue valorizada, ao menos até que o banco central dos EUA comece a dar indícios de uma redução nos juros por lá. “ A partir do momento em que o Fed indicar que deve diminuir o ritmo, o dólar deve dar uma aliviada.”, diz Gustavo Cruz, estrategista da RB Investimentos.