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- O número de OPAs para cancelamento de registro na Bolsa anotado junto à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) chegou a sete em 2023
- Ainda que a alta de pedidos seja uma realidade, a leitura das informações por especialistas consultados pelo E-Investidor diverge
- As condições macroeconômicas são apontadas como a principal justificativa para esse crescimento
O número de Ofertas Públicas de Aquisição de Ações (OPAs) para cancelamento de registro na Bolsa anotado junto à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) chegou a sete em 2023. O número, antes mesmo de acabar o ano, já é mais que o dobro das três OPAs para deslistagem registradas em 2022 e se iguala à quantidade de 2019. Há ainda mais dois pedidos em análise da CVM.
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Com o aumento anual percebido, resta a pergunta: há uma debandada em curso na B3?
Ainda que a alta de pedidos seja uma realidade, a leitura das informações por especialistas consultados pelo E-Investidor diverge. Não há consenso se os dados indicam uma tendência consolidada de companhias abertas abandonando a Bolsa brasileira. As condições macroeconômicas são apontadas como a principal justificativa para esse crescimento. Cenário adverso que também paralisou os processos de abertura de capital (IPOs) na B3 desde 2021.
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As empresas que pediram cancelamento de registro neste ano foram IGB Eletrônica, Banco Besa, Têxtil Renauxview, Longdis, EDP Energias do Brasil, CEEE-G e BR Properties. Além destas, Corrêa Ribeiro (CORR4) e Banrisul (BRSR6) têm os pedidos em análise – o banco informou, no entanto, que o pedido abrange apenas sua controlada Bagergs, empresa que não possui papéis negociados no mercado.
Felipe Pontes, sócio da L4 Capital, explica que, em linhas mais gerais, a lista reúne empresas em recuperação judicial, com pouca liquidez e que perderam muito valor de mercado nos últimos anos. “A Têxtil Renauxview, por exemplo, tem cerca de 70% de perda de valor de mercado nos últimos dois anos. A Fertilizante Heringer perdeu 72%. A BR Properties perdeu 60% nos últimos seis meses”, aponta Pontes.
No caso da Energias do Brasil, a OPA foi anunciada pela controladora, sediada em Portugal, que avaliou as ações em um patamar depreciado no Brasil e que ia pagar um preço bom por elas, explica Leonardo Piovesan, CNPI e analista fundamentalista da Quantzed.
“Geralmente essas OPAs de deslistagem acontecem em empresas bem pouco líquidas, cuja ação praticamente parou de ser negociada e o controlador decide fazer um resgate desses papéis, que sobraram na mão de poucos acionistas, para fechar o capital da empresa e acabar com custos regulatórios”, diz Piovesan.
Conforme a série histórica da CVM, iniciada em 1999, o número de empresas que buscaram deslistagem variou da seguinte forma:
OPAs para cancelamento de registro de listagem na B3 |
|
Período |
Nº de pedidos |
1999 |
0 |
2000 |
0 |
2001 |
0 |
2002 |
16 |
2003 |
15 |
2004 |
15 |
2005 |
13 |
2006 |
9 |
2007 |
7 |
2008 |
10 |
2009 |
5 |
2010 |
2 |
2011 |
9 |
2012 |
10 |
2013 |
5 |
2014 |
5 |
2015 |
7 |
2016 |
13 |
2017 |
6 |
2018 |
3 |
2019 |
7 |
2020 |
2 |
2021 |
3 |
2022 |
3 |
2023 |
7 |
Fonte: CVM |
A redução do número de companhias abertas também pode ser vista nos destaques operacionais mensais da B3. Em setembro deste ano, a quantidade de empresas listadas ficou em 437, recuo de 2,7% ante setembro de 2022, e queda de 0,2% em relação a agosto de 2023.
Debandada na B3?
As fontes consultadas pela reportagem não caminham na mesma direção ao avaliar se há uma debandada em curso na B3. João Vítor Freitas, analista da Toro Investimentos, não considera haver uma tendência devido à grandeza dos dados.
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“É um número pequeno de empresas. Não acho que conseguimos enxergar uma relação significativa, estatisticamente falando, para tirar uma conclusão direta. Se começássemos a ver 15, 20, 30 empresas, poderíamos chamar de movimento, de fato, muito outlier (fora dos parâmetros)”, avalia Freita.
Já o analista da Quantzed visualiza uma tendência justificada pelo cenário macroeconômico “bem ruim”, com taxas de juros elevadas, ainda em dois dígitos, além de diversas preocupações no cenário externo e doméstico que geram incertezas quanto a continuidade do ciclo de queda de juros.
“Nesse contexto, essas OPAs ocorrem por essas empresas estarem baratas num cenário em que muitos investidores também saíram de bolsa e migraram para a renda fixa como vimos nos últimos meses”, opina Piovesan. “Também ocorrem por motivos específicos relacionados. A companhia pode ter uma queda nas negociações e ficar com uma liquidez menor e, com isso, decide recomprar as ações com o objetivo de fechar o capital dela.”
O sócio da L4 Capital avalia que, para se confirmar um movimento de abandono da Bolsa, é preciso que esse aumento se sustente ao longo do tempo. Para ele, os pedidos podem estar relacionados ao volume de dinheiro que as empresas despendem para serem negociadas na Bolsa de Valores.
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“As condições econômicas têm sido desafiadoras nos últimos anos e os custos elevados associados à manutenção da listagem contribuíram para o aumento das OPAs. Além disso, a busca por maior controle ou estratégias de negócios que requerem menos escrutínio público pode motivar as empresas a se deslistarem”, aponta Pontes.
O sócio da L4 Capital lembra que a média anual dos gastos que as empresas têm para se manter como companhia aberta varia de acordo com a receita. Estudo da Deloitte com a B3 mostra que, entre as empresas com faturamento menor do que R$ 300 milhões por ano, a média anual com os custos recorrentes chega a R$ 800 mil, ou 0,3% da receita anual. Já entre as empresas com receita líquida maior do que R$ 2 bilhões, esses custos são, em média, de R$ 3,85 milhões.
Além disso, há custos obrigatórios para pagamento de taxas, como Programa de Integração Social (PIS), Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins), Imposto Sobre Serviços (ISS), escrituração, conselhos de administração, auditoria, publicação de balanços trimestrais e práticas de governança corporativa, entre outros.
“Só com o Conselho de Administração, a BR Properties, por exemplo, gasta cerca de R$ 2 milhões por ano”, diz Pontes.
Afinal, o que é uma OPA?
Da mesma forma que uma companhia pode ir ao mercado vender suas ações, numa oferta inicial (IPO) ou subsequente (follow-on), é possível também que as empresas que já têm capital aberto façam ofertas públicas para comprar as ações que estão sendo negociadas no mercado.
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A OPA pode ser feita por diferentes motivos. Por exemplo, quando o acionista controlador quer aumentar sua participação na companhia e decide ir ao mercado para comprar os papéis – podendo manter ou não a companhia com seu capital aberto após a aquisição. Para isso, é necessário que a empresa apresente um laudo sobre as suas condições e um edital com todas as informações acerca da oferta. Todas as regras referentes à realização de uma OPA constam na Resolução CVM 85, de 31 de março de 2022.
Maiara Madureira, advogada de mercados financeiro e de capitais do escritório Lobo de Rizzo, explica que para uma empresa ser listada na Bolsa é preciso ter um registro de companhia aberta junto à CVM, para depois solicitar o pedido de listagem e admissão para negociação na B3. Portanto, para que o cancelamento do registro, as duas instituições acompanham de perto todo o processo.
“Uma vez que se tem o porcentual de mais de dois terços de aceitação da OPA de cancelamento de registro, aí a companhia realmente fecha o seu capital. Tem todo um prazo de análise da CVM, mas o processo costuma sair em uns 60 dias”, afirma Madureira.
Cancelamento de registro vai continuar?
Em linhas gerais, a permanência ou o aumento de empresas deixando a Bolsa estão associados à manutenção de condições desfavoráveis no mercado, avaliam os especialistas, a ponto de a deslistagem oferecer mais atrativos para as companhias do que seguir com o capital aberto.
Empresas que fizeram IPO recentemente e estão com papéis descontados podem optar por esse caminho, avalia o sócio da L4 Capital. Para ele, nomes como Westwing podem aproveitar o momento conturbado para fechar capital e se livrar de diversos custos de manutenção da listagem.
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“A Westwing fez IPO em 2021, com o preço da ação a R$ 13. Hoje, o papel negocia (próximo) a R$ 1,23. O valor de mercado da companhia é de cerca de R$ 15 milhões e o caixa, de cerca de R$ 147 milhões, o que pode fazer brilhar os olhos dos maiores investidores para chamar uma OPA de cancelamento de registro, caso tenham disponibilidade de caixa e interesse para recomprar as ações”, avalia o sócio da L4 Capital.
Piovesan, da Quantzed, por sua vez, se mantém cauteloso e não arrisca futuras candidatas. “Não é só o caso de as ações estarem baratas para haver deslistagens. Depende de vários fatores. Por exemplo, se a empresa tem free float (termo que se refere a ações destinadas à livre negociação no mercado) de porcentual alto ou baixo, qual o custo que o acionista vai ter pra fechar capital”, justifica Piovesan.
O que o investidor deve fazer?
Os analistas recomendam o investidor vender as posições em casos de OPAs para cancelamento de registro. Isso porque se a empresa cancelar a listagem, o acionista terá ações de uma companhia de capital fechado, ou seja, sem liquidez. Com isso, ele não terá mais a possibilidade de negociar os papéis como tem na Bolsa.
“É preciso avaliar caso a caso, porque a governança corporativa de uma empresa fechada pode ser pior do que a empresa listada, fazendo com que o investidor fique sem nenhuma proteção. A proteção do investidor de bolsa no Brasil já não é das melhores, imagina com a empresa sendo deslistada?”, avalia Pontes.