- A Latam Airlines (LTM) voltou à Bolsa de NY depois de quatro anos afastada dos pregões por causa de um processo de recuperação judicial nos EUA, o Chapter 11
- Agora, a companhia se vê em uma posição estratégica para avançar no mercado, especialmente em um momento em que os concorrentes brasileiros enfrentam problemas financeiros
- Desafio é aproveitar essa posição de vantagem para reconquistar o acionista e gerar valor aos investidores na volta à Bolsa
(Nova York) – A Latam Airlines (LTM) realizou nesta terça-feira (22) a cerimônia de “Ring the Bell” na Bolsa de Valores de Nova York (NYSE), uma formalidade que marca o retorno da companhia aérea aos pregões depois de quatro anos afastada em meio a um processo de recuperação financeira. Os American Depositary Receipts (ADRs) voltaram a ser negociados na NYSE em julho deste ano, a US$ 24, pela primeira vez desde que a empresa encerrou a recuperação judicial nos Estados Unidos, o Chapter 11, em 2022.
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O E-Investidor viajou à Nova York a convite da companhia para acompanhar o Investor Day, o primeiro encontro entre executivos, acionistas e analistas de mercado realizado desde 2017. No evento, a Latam defendeu o início de um novo capítulo de sua história: de volta à NYSE, buscando solidez nos balanços financeiros e disposta a aumentar seu market share em um momento de fragilidade dos pares no setor aéreo.
A visão dos executivos é de que, ao solicitar ajuda judicial para renegociar suas dívidas ainda no primeiro ano da pandemia da covid-19, a companhia conseguiu se adiantar e reorganizar as finanças antes de alguns pares; muitos se veem obrigados a seguir o mesmo caminho agora. O desafio da Latam é aproveitar essa posição para expandir seu crescimento sustentável e melhorar os números operacionais, em um setor de margens apertadas que ainda enfrenta resquícios da crise sanitária e novos desafios.
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A companhia atualizou suas projeções para 2024 e espera um crescimento entre 15% e 16% em relação a 2023. A expectativa de EBITDAR anual ajustado em 2024 subiu de US$ 2,75 a US$ 3,05 bilhões para US$ 3 bilhões. O grupo também espera continuar diminuindo sua razão de alavancagem líquida ajustada para 1,6x a 1,7x vezes até o final do ano; o guidance anterior era de 1,6x a 1,8x.
A visão dos analistas
De volta à NYSE, a LTM está sendo acompanhada de perto por analistas de mercado. Durante o Investor Day, os executivos foram questionados sobre formas de destravar valor de um papel que parece descontado frente aos resultados trimestrais que vêm sendo apresentados.
“Depois de quatro anos complexos, não me parece injusto que os investidores estejam pedindo tempo para analisar. O nosso dever é criar um histórico positivo de resultados para que o mercado veja as evidências”, defendeu o CEO Roberto Alvo. “A indústria sofre a influência de muitas coisas externas, o ponto é como nos preparamos para lidar com isso. Claro que a volatilidade do petróleo me preocupa, mas, às vezes, um pouco de crise pode ser oportunidade.”
No início de outubro, o Goldman Sachs retomou a cobertura da companhia com recomendação de compra dos ADRs da Latam e um preço-alvo de US$ 41,70 em 12 meses. O potencial de valorização perto de 60%, na visão do banco, está atrelado a alguns fatores. “Atualmente vemos a LATAM oferecendo uma boa combinação de: EBITDA em crescimento nos próximos anos; balanço sólido após o Chapter 11; e valuation descontado perto de 3,8x EV/EBITDA para 2025, o que nos leva a acreditar que o mercado não está necessariamente precificando o forte nível de margens que atualmente esperamos que a empresa entregue nos próximos anos”, dizem em relatório os analistas Bruno Amorim e João Frizo.
Mas a visão positiva não é unanimidade. O Citi também retomou recentemente a cobertura da Latam, mas mantém visão neutra sobre os ADRs, com preço-alvo de US$ 26,50 – abaixo da cotação de US$ 27,5 a que os ativos são negociados atualmente.
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Em relatório divulgado nesta terça-feira (22), após o Investor Day, os analistas destacaram que a revisão do guidance de EBITDA para 2025 deixa os números mais alinhados com as projeções da análise do banco. Ainda assim, mesmo que as perspectivas pareçam “muito encorajadoras”, o Citi vê com cautela o fim do lock-up marcado no fim de novembro.
O lock-up é um período em que os controladores de uma companhia ficam proibidos de comprar ou vender suas posições. Com o fim do embargo no próximo mês, o receio é de que uma mudança na composição acionária traga volatilidade de curto prazo para os ativos na Bolsa. Hoje, os fundos Sixth Street Partners e Strategic Value Partners, credores da Latam, detêm cerca de 30% da companhia; Delta Air Lines, Qatar Airways e Cueto Group possuem outros 25%.
“Além disso, a baixíssima liquidez de negociação dos ADRs torna difícil entender por que um investidor de uma das três grandes companhias aéreas dos EUA reduziria tais posições para investir na Latam”, destaca o Citi.
“Chapter 11 foi decisão difícil, mas no momento certo”, avalia Roberto Alvo
O CEO Roberto Alvo conversou com o E-Investidor na sede da NYSE, logo após o Investor Day. Na visão do executivo, ao superar a reestruturação financeira no momento certo, a Latam se coloca em uma posição diferente em relação aos pares, especialmente às companhias aéreas brasileiras que agora enfrentam problemas financeiros como os enfrentados pela gestão há 4 anos. E é essa posição de vantagem que, segundo ele, pode reconquistar o acionista nesta volta à Bolsa.
Confira os principais trechos da entrevista:
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E-Investidor – Um ponto que apareceu bastante no Investor Day foi a questão do timing do processo de reestruturação da companhia. A Latam recorreu à Justiça americana ainda no primeiro ano da pandemia, mas hoje vemos outras companhias aéreas do Brasil seguindo o mesmo caminho. Como acertar esse timing ajudou a Latam?
Roberto Alvo – Ninguém quer fazer um Chapter 11. Para os acionistas, significa perder tudo. Para nós, foi uma decisão terrivelmente difícil, mas, depois que vimos que a pandemia ia durar muito tempo e não tivemos ajuda dos governos de nenhum dos países onde nós participamos, não tivemos dúvida de que a melhor decisão para o grupo era fazer isso. Fizemos em maio de 2020 e foi o momento certo, quando o mundo parou e ninguém queria os aviões de volta. Isso permitiu ao grupo não somente negociar melhor com seus fornecedores, como também, no meio da crise, olhar a nossa operação e pensar o que tínhamos que fazer diferente. Todas as boas decisões têm o seu momento e as ruins também. Eu fico feliz, apesar da dificuldade da decisão, de que tenhamos feito essa reestruturação no momento que fizemos.
O setor de aviação vive um momento complexo, com resquícios ainda da pandemia, mas também pressão do lado dos combustíveis. Há um receio de serem mal precificados pelo mercado nesta volta à Bolsa?
Vamos deixar que os acionistas que definam qual é o preço correto para a Latam. A minha responsabilidade é demonstrar que nós, cada dia mais, fazemos melhor nosso trabalho e que os números, ao final do dia, acompanhem. Investir é um ato de confiança importante e nós encaramos isso de maneira muito séria. É a nossa responsabilidade demonstrar que as expectativas dos nossos parceiros, dos nossos acionistas, sejam justificadas. Não tenho dúvidas de que até agora temos feito um bom trabalho e fico muito otimista em relação a isso no futuro.
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Para além de retomar a confiança do investidor com o setor, como a Latam pretende gerar valor para esses acionistas?
Fazendo o que nós fazemos todos os dias, mas melhor. O resultado financeiro da Latam é reflexo disso, ser cada dia mais precisos, pontuais, dando aos nossos clientes a possibilidade de olhar que nós sempre estamos tentando fazer o melhor que nós podemos fazer para eles; até agora, os números estão acompanhando. Eu fico muito tranquilo com a estratégia e penso que nós temos ainda a possibilidade de agregar ao Brasil. Em 2024, somos a companhia que mais pôs cadeiras, uma maneira de democratizar a indústria e a nossa maneira de ajudar os brasileiros a ter a capacidade de voar dentro e fora do Brasil. Estamos muito comprometidos com isso no futuro e por isso, há dois meses, anunciamos um investimento de US$ 2 bilhões, perto de R$ 12 bilhões, para os anos 2025 e 2026, para continuar o desenvolvimento do nosso negócio no País.
Como tem sido esse contato com o governo brasileiro? Ao longo do Investor Day, foi mencionado que a companhia não teve nenhum suporte durante a reestruturação.
Foi a decisão correta dos governos, não só do Brasil, como dos outros países em que operamos, porque nós não somos países ricos, como Estados Unidos e Europa, que têm as possibilidades de ajudar a indústria aérea, ajudar muitos outros setores. As necessidades sociais, ao final do dia, foram mais importantes. Nós pedimos ajuda naquele momento e ninguém sabia, mas hoje eu penso que as decisões dos governos, o chileno, o brasileiro, o colombiano, foram as corretas e nos deram a oportunidade de encontrar nosso próprio caminho.
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O turnaround da Latam pode servir de exemplo para as companhias brasileiras que estão enfrentando problemas financeiros nesse momento?
As companhias brasileiras decidiram não fazer a reestruturação no momento que fizemos, que Avianca e Aeroméxico também fizeram, e hoje têm que viver com as consequências dessa decisão. A Gol em Chapter 11, a Azul em uma posição financeira muito complexa. Não tenho dúvida que as duas companhias vão sair disso, o Brasil tem três bons operadores aéreos e não há muitos países que podem falar a mesma coisa.
Alguns analistas têm apontado sobre o fim do lock-up das ações da companhia no final de novembro e uma possível mudança no controle acionário da Latam. Essa é uma preocupação no radar?
Não, pois o lock-up não significa que os acionistas têm que vender, eles simplesmente têm a possibilidade. É preciso perguntar a eles a estratégia, mas a minha responsabilidade é fazer com que a Latam seja uma belíssima ferramenta de inversão para os nossos acionistas atuais e potenciais. Se eles acreditam no que nós estamos fazendo, ninguém vai ter vontade de vender, mas de comprar.
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