O que este conteúdo fez por você?
- Localização de operações nos EUA pode ser vantajosa em cenários de protecionismo comercial
- Diversificação de mercados é uma estratégia adotada para mitigar riscos tarifários e econômicos
- Investidores devem monitorar mudanças tarifárias, considerando estratégias de diversificação e expansão estratégica
As recentes declarações do presidente reeleito dos Estados Unidos, Donald Trump, sobre a elevação de tarifas para produtos estrangeiros, incluindo os brasileiros, acenderam um alerta no setor empresarial brasileiro. Trump criticou diretamente o Brasil por “cobrar muito” de produtos americanos, levantando a possibilidade de uma resposta tarifária mais agressiva.
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Empresas brasileiras com forte presença nos EUA, como Weg (WEGE3), Gerdau (GGBR4), JBS (JBSS3) e Vale (VALE3), enfrentam agora o desafio de se adaptar a um cenário global mais protecionista. Seus investidores, claro, devem ficar atentos aos desdobramentos das políticas comerciais americanas, que podem impactar desde margens de lucro até a estratégia de expansão internacional.
Segundo especialistas, o mercado norte-americano é indiscutivelmente relevante para diversas indústrias brasileiras. Produtos como aço, alumínio, carne bovina e equipamentos industriais figuram entre os mais exportados para os EUA. Em 2018, o governo Trump implementou tarifas sobre aço e alumínio, exigindo renegociações que resultaram em cotas de importação. Agora, com Trump – ou o Trump 2.0 – mencionando um possível aumento de 60% nas tarifas de importação, o temor de novas restrições volta à tona.
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Setores altamente expostos ao mercado americano, como mineradoras e siderúrgicas, estão entre os mais vulneráveis a possíveis elevações tarifárias. Seriam impostas pela Seção 232 do Ato de Expansão e Comércio – que adicionaram 25% sobre o aço e 10% sobre o alumínio – e poderiam afetar significativamente empresas que exportam para os EUA. Por outro lado, companhias como Gerdau (GGBR4), que possuem operações em solo americano, podem se beneficiar do protecionismo porque, segundo o time de estratégia da XP Investimentos, a redução da concorrência tende a aumentar os preços do aço no mercado interno americano.
Um caso semelhante mencionado pela XP é o da JBS (JBSS3), que também possui unidades produtivas nos EUA, o que a protege de riscos tarifários. Além disso, empresas do agronegócio, como SLC Agrícola (SLCE3) e BrasilAgro (AGRO3), podem ganhar espaço caso tarifas sejam direcionadas à China. Um aumento nas tensões comerciais entre EUA e China pode redirecionar a demanda chinesa por grãos para o Brasil, ampliando as oportunidades de exportação.
Outro fator crítico a ser monitorado é o impacto das tarifas sobre o câmbio. A corretora observa que a redução da demanda por importações pode fortalecer o dólar frente a outras moedas, ao mesmo tempo em que as pressões inflacionárias geradas por preços mais altos poderiam levar o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) a elevar os juros, também fortalecendo a moeda americana. Nesse contexto, setores dolarizados, como o de agronegócio, tendem a se beneficiar.
Para enfrentar esse desafio, as empresas brasileiras têm buscado diversificar seus mercados, reduzindo a dependência dos Estados Unidos, além de negociar acordos comerciais bilaterais que minimizem os impactos das tarifas. Ainda assim, especialistas alertam que o cenário exige cautela e planejamento, considerando também as oportunidades que podem surgir em parcerias com companhias locais americanas para driblar as barreiras tarifárias.
Estratégias contra riscos tarifários
A localização de fábricas e operações nos Estados Unidos têm se mostrado uma estratégia para empresas como Gerdau (GGBR4) e Weg (WEGE3), que buscam reduzir os impactos de uma possível taxação mais agressiva por parte do governo americano. Pedro Moreira, analista financeiro e sócio da One Investimentos, observa que com a maior parte do mercado consumidor nos EUA, essas companhias aproveitam a produção local para fortalecer seus balanços financeiros e mitigar riscos tarifários.
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No entanto, ele avisa que outras variáveis econômicas também podem influenciar essa dinâmica. O cenário macroeconômico atual, incluindo a volatilidade do dólar e as políticas fiscais, pode equilibrar ou até mesmo anular alguns desses benefícios. Acredita-se que o fortalecimento da moeda americana frente ao real, por exemplo, pode ser uma vantagem para empresas brasileiras que exportam para o mercado americano. Isso ocorre porque suas receitas, denominadas em dólar, ajudam a sustentar os resultados financeiros mesmo em períodos de oscilações tarifárias e econômicas.
Durante o primeiro mandato de Donald Trump, a imposição de tarifas sobre produtos chineses e outros mercados trouxe impactos no valuation das empresas, especialmente para aquelas com operações internacionais. As empresas americanas, em resposta, aumentaram sua produção local, fortalecendo a cadeia de suprimentos doméstica e, consequentemente, seus resultados financeiros.
A equipe de estrategistas da XP Investimentos também concorda que a localização das fábricas nos EUA pode, de fato, reduzir os impactos diretos de tarifas impostas pelo governo americano, proporcionando às empresas uma vantagem em termos de eliminação de custos relacionados à importação.
No entanto, eles alertam que flutuações cambiais, condições econômicas como inflação e recessão, e custos operacionais elevados — como aluguel, salários e despesas com energia — são fatores que podem influenciar o custo unitário dos produtos. Para a XP, se esses custos fixos forem mais altos em um cenário de produção local nos EUA do que o custo variável economizado pela eliminação da tarifa de importação, a produção local pode se tornar menos viável economicamente.
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Nesse caso, importar produtos para os EUA, mesmo com tarifas, segundo os especialistas, poderia ser mais vantajoso em termos de custo final, especialmente se os custos operacionais superarem os benefícios financeiros proporcionados pela produção local. Portanto, o cálculo econômico entre produzir ou importar precisa levar em consideração as tarifas e também todas essas outras variáveis que afetam a competitividade e a viabilidade financeira das operações nos EUA.
Dependência comercial
Nos últimos anos, o Brasil reduziu sua dependência comercial dos Estados Unidos, especialmente com a China assumindo o posto de principal parceiro comercial do país, avalia o analista e sócio da One Investimentos, Pedro Moreira. Mas ele afirma que o mercado americano continua sendo uma peça importante para muitas empresas brasileiras exportadoras, o que levanta questionamentos sobre como essas companhias podem se proteger frente à possibilidade de novas tarifas comerciais.
“Hoje, muitas empresas exportadoras têm um portfólio mais diversificado, com a Ásia, Europa e outros mercados complementando a balança comercial. Assim, o foco deve se voltar para avaliar a presença estratégica no mercado americano, que pode oferecer oportunidades mesmo em meio a riscos”, pontua.
Empresas brasileiras que dependem do mercado americano e não possuem operação local devem considerar a possibilidade de estabelecer ou expandir suas instalações nos EUA. Essa estratégia pode ser um meio de evitar tarifas, uma vez que a produção realizada no próprio território americano não seria sujeita a essas medidas. “Companhias que têm sinergia com o mercado americano, mas ainda não possuem estruturas locais, devem começar a planejar investimentos em operações no país. Já aquelas que já possuem uma base instalada nos Estados Unidos podem considerar ampliar essa presença para aproveitar melhor as condições do mercado”, completa.
Impacto para empresas e investidores
Apesar das incertezas do cenário global, empresas como Vale (VALE3), JBS (JBSS3), Embraer (EMBR3) e Ambev (ABEV3) seguem com fundamentos sólidos e operações consolidadas. De acordo com o economista e consultor financeiro Eduardo Rosenberg, a mineradora Vale, altamente exposta ao mercado chinês, mantém sua tese de investimento atrelada ao desempenho do setor imobiliário no gigante asiático. O impacto das tarifas nos Estados Unidos é mínimo para a empresa, dado seu baixo volume de exportações para o mercado americano. “O que realmente influencia os resultados da companhia são as flutuações na demanda por minério de ferro e outros metais na China, que continua sendo o principal destino de suas vendas”, diz.
A JBS, por meio de sua controlada americana Pilgrim’s Pride, já possui uma operação consolidada nos Estados Unidos. A empresa segue entregando resultados fortes, como demonstrado na última temporada de balanços. O modelo de negócios diversificado da companhia e sua presença local no mercado americano a tornam menos vulnerável a potenciais mudanças tarifárias, segundo o economista.
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No setor aeroespacial, a Embraer mantém sua competitividade, especialmente em um momento em que a Boeing enfrenta problemas de produção e qualidade há mais de um ano. A demanda global por aeronaves regionais e comerciais, conforme Rosenberg, continua elevada, fortalecendo a posição da Embraer no mercado. A tese de investimento em EMBR3 permanece intacta, sustentada por sua capacidade de atender à crescente demanda por aviões.
Já a Ambev, com suas marcas amplamente reconhecidas e consolidadas nos Estados Unidos, também não deve ser expressivamente impactada por mudanças tarifárias. “A estrutura local de produção e distribuição garante certo fortalecimento em um ambiente mais protecionista, permitindo que a companhia continue operando de forma eficiente”, analisa o especialista.
Rosenberg ainda alerta os investidores dessas companhias internacionais a diversificarem seus ativos, especialmente em um contexto econômico volátil, em que mudanças tarifárias do governo Trump podem impactar negativamente segmentos mais dependentes de mercados. A diversificação estratégica ajuda a mitigar riscos e promove maior equilíbrio nas carteiras de investimento.