“Socorro a empresas”: linha de crédito de R$ 30 bi impacta nos juros futuros? Veja o que dizem os especialistas
Medida Provisória prevê crédito extraordinário e ações emergenciais para mitigar impactos do tarifaço imposto por Donald Trump. Especialistas apontam riscos fiscais e cambiais
Presidente Lula assina MP do plano “Brasil Soberano”, que prevê R$ 30 bilhões em crédito para exportadoras afetadas por tarifas norte-americanas. (Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil)
Nesta quarta-feira (13), o presidente da República, Luís Inácio Lula da Silva, anunciou um plano de contingência e proteção às tarifas impostas pelo governo norte-americano. Chamado de “socorro a empresas”, a proposta que mais ganhou atenção do mercado consiste em uma linha de crédito de R$ 30 bilhões para empresas afetadas. Agora, resta ao Congresso aprovar a Medida Provisória (MP) assinada por Lula.
Oficialmente, a MP recebeu o nome de “Brasil Soberano” e defende outros benefícios ao empresariado brasileiro, como o aumento de compras governamentais, o adiamento de impostos e a reforma do Fundo de Garantia à Exportação (FGE).
Segundo Tcharla Bragantin, coordenadora de Ciências Contábeis no Centro Universitário Módulo, o crédito extraordinário e demais ações emergenciais devem ser analisados à luz do cenário externo e do potencial impacto interno.
“Sim, certamente isso tudo impactará futuramente na confiança do mercado e também nas taxas de juros, considerando que não é um gasto que estava estimado”, explicou.
Além disso, Bragantin defende a criação de um plano para remediar aquilo que já foi prejudicado pela ofensiva tarifária americana.
No entanto, é necessário que haja políticas que não apenas acompanhem o que vem acontecendo em relação às tarifas, mas que também considerem que muitas empresas já estão sendo afetadas, o que pode levar a um desaquecimento do mercado, alta no desemprego e queda na renda da população.
Ela observa que, do ponto de vista imediato, a percepção dos investidores pode ser favorável, especialmente em empresas exportadoras listadas na bolsa. “Como resposta imediata, pode haver uma visão positiva, já que é uma tentativa de apoiar e subsidiar companhias afetadas. No entanto, é preciso acompanhar o impacto no médio e longo prazo, pois o uso desse crédito certamente resultará em dívidas que pesarão nos resultados financeiros futuros”, afirma.
A coordenadora acrescenta que empresas beneficiadas por compras governamentais e incentivos tributários terão ganho mais rápido, mas precisam ampliar mercados e diversificar destinos para reduzir vulnerabilidades.
Na avaliação de Wagner Pagliato, coordenador do curso de Ciências Contábeis da Unicid, o plano pode contribuir para reduzir, no curto prazo, a percepção de risco das exportadoras na Bolsa de Valores do Brasil (B3), desde que transmita confiança e previsibilidade no câmbio: “Por outro lado, se o mercado identificar fragilidade nas medidas, o efeito pode ser o oposto. Empresas beneficiadas podem registrar reação imediata nas ações, mas, na maioria dos casos, o mercado prefere aguardar para avaliar a durabilidade dessas medidas.”
Ele ressalta que, embora o crédito extraordinário esteja fora do teto de gastos, seu impacto na confiança dependerá de não sinalizar um afrouxamento fiscal.
Já para o economista e especialista em investimentos Danilo Coelho, o pacote pode ajudar a “segurar” a produção já planejada para os EUA e evitar perdas abruptas de receita, mas não resolve o problema no longo prazo.
Uma vez que já existe uma perda de efetividade das empresas com o mercado estrangeiro, principalmente setores mais dependentes, como café e suco de laranja, a MP não conseguirá “segurar o rojão”.
Publicidade
Apenas a linha de crédito não será suficiente se novas tarifas surgirem. No primeiro momento, o pacote pode dar um fôlego, mas o passo principal do governo deve ser redirecionar a produção para outras cadeias de exportação.
Coelho também alerta para os riscos fiscais e cambiais da medida. Na sua visão, o pacote, ao mesmo tempo em que pode manter empregos e abrir espaço para cortes de juros no curto prazo, também pode aumentar a percepção de risco do Brasil.
“Estamos falando de uma linha de crédito em um governo com as contas apertadas, o que pode gerar pressão sobre os juros e o câmbio, além de estimular saída de investidores”, explicou o economista.
O impacto no dólar e nos juros futuros dependerá das próximas medidas e da forma como o governo compensará o gasto extra, “seja com aumento de arrecadação ou corte de despesas em outras áreas”, completou.
No balanço geral, o plano de R$ 30 bilhões é visto como um paliativo necessário para amortecer o choque imediato, mas insuficiente para assegurar segurança de longo prazo. A efetividade da estratégia dependerá não apenas da execução das medidas já anunciadas, mas também da capacidade do governo de negociar soluções diplomáticas e abrir novos mercados para reduzir a dependência das exportações brasileiras em relação aos Estados Unidos.