Brasileiro destaca que o mundo está vivendo uma “transformação global muito rápida”, marcada por um ambiente de incertezas em que o dólar assume um papel central. Ela explica o conceito do dollar smile – fenômeno em que a moeda americana se valoriza tanto em momentos de crise global como quando a economia dos EUA está muito forte. “O câmbio existe para trazer humildade aos economistas”, brinca, destacando a dificuldade de prever o comportamento do real frente ao dólar, dada a complexidade de fatores locais e internacionais que influenciam esse cenário.
Essa volatilidade cambial torna mais evidente a importância de um processo estruturado de investimentos. Para a partner, é fundamental não se deixar levar por manchetes ou ruídos momentâneos, mas ter uma visão de longo prazo: “O comitê de investimentos precisa olhar para a big picture [em português: ‘o todo’]. A gente acha que tem uma mudança global estrutural em curso que tende a continuar”. Nesse contexto, o dólar também deve ser visto como um importante instrumento de proteção dentro de um portfólio diversificado.
A analista também chama atenção para o fluxo de capital estrangeiro, que já superou os R$ 24 bilhões na bolsa brasileira. Apesar de o Brasil não estar entre os mercados mais “queridinhos” dos investidores, a valorização dos ativos locais tem se sustentado mais pelo volume de entrada de capital do que por fundamentos internos. “Mesmo com a situação fiscal e política brasileira ainda indefinida, o Brasil está muito barato. E qualquer movimento de redução da concentração de investimentos nos EUA pode trazer um caminhão de dinheiro para cá”, analisa.
Esse cenário, embora positivo à primeira vista, exige cautela. Como alerta Brasileiro, não se deve confundir fluxo de capital com melhora estrutural: “É preciso tomar cuidado para não se empolgar. O que estamos vendo é preço barato, não necessariamente crescimento sustentável.”
Ana Carolina Shibata complementa esse raciocínio ao criticar o que chama de home bias – a tendência de o investidor brasileiro concentrar seus recursos no próprio país. Ela observa que, em carteiras globais, mercados emergentes como o Brasil ocupam, no máximo, 10% da alocação. “Aqui, é comum ver clientes com 100% do dinheiro investido em reais. Mesmo quando investem lá fora, escolhem papéis de emissores brasileiros”, afirma.
Para ela, essa prática revela uma falha grave de diversificação. E um dos grandes obstáculos para superá-la seria o atrativo Certificado de Depósito Interbancário (CDI) brasileiro. Enquanto a taxa de juros permanecer alta – em 14,75% -, muitos investidores optam por adiar sua exposição internacional. No entanto, Shibata ressalta que o investimento externo é essencial, especialmente quando se pensam em portfólios familiares com grandes concentrações em imóveis ou empresas. “A vida do empresário brasileiro é muito mais difícil do que a média. Estamos concentrados em setores pouco dinâmicos, com alta carga tributária e pouca presença tecnológica. Faz sentido diversificar, sim”, reforça.
Combata o medo do câmbio
Outro ponto central abordado pela superintendente é o medo do risco cambial. Muitos investidores hesitam em enviar dinheiro para fora por receio das variações do dólar. Contudo, ela afirma que é possível realizar operações de hedge para mitigar esse risco. “Na prática, o investidor troca o CDI pelo dólar, com um custo que varia entre 3% e 6%. Mesmo assim, é possível ter retorno positivo. Isso é técnico, difícil explicar. Por isso, falamos, explicamos, voltamos a falar”, diz.
Ambas as especialistas concordam que a educação financeira é peça-chave para mudar essa mentalidade. Francisca Brasileiro, destaca que o trabalho com seus clientes envolve trazer a visão do patrimônio como um todo e mostrar como a diversificação internacional contribui para a segurança e o crescimento dos ativos familiares. Shibata, por sua vez, reforça a necessidade de separar dois debates: o risco cambial e a diversificação do portfólio. “São duas coisas diferentes. O câmbio é um fator importante, mas o mais relevante é onde você está investindo seu dinheiro. Não dá para comparar uma bolsa com 50 ações concentradas com outra que tem milhares de empresas, incluindo as líderes globais em tecnologia.”
Investir bem em 2025 exige olhar além do Brasil, compreender o papel estratégico do dólar, saber lidar com volatilidades e, acima de tudo, construir um portfólio que dialogue com o mundo. Como concluem as especialistas, é um processo contínuo de educação, adaptação e visão ampla, sem se deixar levar por ruídos passageiros.
O que não pode faltar na carteira
Para o segundo semestre de 2025, Francisca Brasileiro, partner na TAG Investimentos, destaca três principais apostas em termos de produtos financeiros, considerando o cenário atual de juros, inflação e reconfiguração dos fluxos globais. Sua visão reflete uma análise histórica, mas também uma leitura estratégica do momento de transição que os mercados vivem.
Em primeiro lugar, ela se mostra entusiasta dos títulos públicos indexados à inflação, como as Notas do Tesouro Nacional série B (NTN-Bs). “Eu sou fã número 1 das NTN-Bs”, afirma. Para ela, o patamar atual das taxas desses papéis — os maiores em quase duas décadas — é historicamente atrativo. “Ontem mesmo eu estava vendo um gráfico e a gente só teve esse patamar em 2006, e depois no período da crise de 2014, 15, 16. Em 2008, as taxas também chegaram a esse nível.” Esse movimento, segundo Brasileiro, por si só já justifica atenção a esses ativos, ainda mais por sua ligação direta com a proteção contra a inflação e a capacidade de preservar o poder de compra do investidor no longo prazo.
O segundo produto recomendado é a renda variável brasileira. Apesar de reconhecer que a bolsa nacional não é uma aposta de curto prazo, Francisca vê um bom ponto de entrada para quem tem paciência e horizonte mais estendido. “A bolsa brasileira se beneficia do cenário atual, especialmente para quem reduziu demais sua exposição ou ainda não tem nada investido em ações”, destaca. Esse otimismo se ancora no desconto dos preços e na possibilidade de recuperação puxada por fluxos internacionais. Ainda que o Brasil enfrente desafios macroeconômicos e políticos, a especialista enxerga espaço para valorização, desde que o investidor esteja disposto a esperar.
Por fim, ela defende a diversificação global como o terceiro pilar essencial do portfólio. “Acho que é uma carteira diversificada global. Mas bem diversificada mesmo. Uma carteira que capture esse momento de transição que a gente está vivendo”, recomenda. A ideia é que, com os mercados internacionais saindo de uma longa concentração nos Estados Unidos, a diversificação geográfica permite não só diluição de riscos, mas também exposição a novas fontes de crescimento. Ela ressalta que, após um período de preços esticados, voltou a haver boas oportunidades no exterior — especialmente para quem estrutura essa alocação com atenção ao perfil de risco.
A combinação entre NTN-Bs, bolsa brasileira e carteira global diversificada compõe, segundo Brasileiro, um portfólio equilibrado e com bom potencial de retorno para o segundo semestre de 2025. “Eu diria que esse trio aí faz um portfólio que vai render muito”, conclui.