Mercado começa a projetar cortes na Selic, movimento se reflete no fechamento das taxas futuras. Foto: AdobeStock
Enquanto o Comitê de Política Monetária (Copom) define nesta quarta-feira (8) a nova taxa Selic, o mercado de títulos públicos já vem sinalizando uma possível mudança no ciclo de juros. A curva de juros do Tesouro IPCA+ consolidou no mês de abril um movimento de fechamento, sinalizando o esgotamento de um fenômeno que o mercado chama de “curva invertida”, quando papéis de prazo curto pagam juros maiores em relação aos mais longos.
Essa inversão foi observada nos títulos com vencimento em 2029, que ainda pagam mais juros do que os de 2040. De 26 de março a 29 de abril, a distância entre os juros dos títulos do Tesouro IPCA+ 2029 e 2040 encolheu de 0,48 ponto percentual para apenas 0,03 ponto, a menor do ano. No pico, em 26 de março, o papel de 2029 pagava 7,92%, enquanto o de 2040 oferecia 7,44%. Um mês depois, as taxas convergiram para 7,37% e 7,34%, respectivamente.
“Isso é coerente com a expectativa de que o Banco Central está perto do fim do ciclo de alta e que, mais adiante, os juros mais longos voltem a subir para refletir o prêmio de risco de longo prazo”, diz Rafael Haddad, planejador financeiro do C6 Bank.
Juros ao longo do tempo
A curva de juros é uma ferramenta importante para o Banco Central entender o que o mercado está precificando. Em condições normais, quanto maior o prazo do título, maior a taxa exigida. Essa é a compensação natural dos juros pelo tempo. “Quando essa lógica se inverte, com prazos mais curtos pagando mais que os longos, o mercado está sinalizando que espera uma desaceleração da economia”, explica Haddad, do C6 Bank.
Ele lembra que a curva começou a inverter a partir do segundo semestre do ano passado, quando o mercado passou a olhar com maior preocupação a questão fiscal do governo Lula. O ápice aconteceu em dezembro, após o anúncio do pacote de Fernando Haddad que trouxe isenção de IR e cortes insuficientes de gastos por parte do governo.
Em 2025, os juros passaram a descer, num sinal de que os agentes do mercado passaram a acreditar que a política monetária do Banco Central seria suficiente para frear a economia e inflação. “Sabemos que não é plausível manter durante muito tempo um cenário de juros no patamar que está”, comenta Vitor Oliveira, sócio da One Investimentos. No início do ano, os juros prefixados do IPCA+ beiraram os 8% de taxa.
BC mais próximo dos cortes
A política tarifária anunciada pelo presidente norte-americano, Donald Trump, foi vista como negativa para o crescimento global, derrubando o dólar frente a outras moedas, mas no Brasil um câmbio mais favorável (se distanciando cada vez mais dos R$ 6, hoje na casa dos R$ 5,70) pressiona menos a inflação e abre espaço para cortes de juros.
O consenso é de que o BC está se aproximando do fim do ciclo de aperto monetário, mas antes disso ainda haverá a estabilização. É esperado que na reunião dos dias 6 e 7 de maio o Comitê de Política Monetária do BC (Copom) traga uma nova alta. A opinião do mercado se divide entre 0,25 e 0,50 ponto percentual, para que na reunião de junho, haja uma estabilização da Selic nos 15%. O debate sobre o início do ciclo de queda é que movimenta a curva de juros futuros, e as taxas do títulos do Tesouro.
Esse atual patamar da Selic é comparável à época do governo Dilma Rousseff, em que a inflação brasileira passava dos dois dígitos, sendo que o IPCA atual está na faixa dos 5,48%. Desta vez, o avanço dos gastos públicos dificultou a tarefa da política monetária do BC, ao estimular a atividade econômica e impedir que a demanda desacelerasse, pré-requisito para conter a inflação.
Juros reais puxaram IPCA+
Os títulos do Tesouro IPCA+ com vencimento mais curtos são fortemente influenciadas pela condução da política monetária. “Quando olhamos para os títulos Tesouro IPCA+, estamos basicamente precificando o juro real que o mercado espera que será realizado de hoje até o vencimento do papel. Essa taxa é a diferença entre o CDI médio projetado e a inflação esperada para o mesmo período”, explica Ian Lima, gestor de renda fixa da Inter Asset.
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Como o Banco Central subiu a Selic para a faixa de 14,25%, com uma inflação em torno de 5%, isso gerou um juro real muito elevado, próximo de 10%. “O mercado, portanto, só vai comprar uma NTN-B curta (Tesouro IPCA +) se ela entregar um retorno compatível. Por isso vimos essas taxas subirem tanto e a curva se inverter. É o papel se ajustando para atrair o investidor”, afirma Lima, do Banco Inter.
Quando o mercado começa a projetar cortes na Selic, como agora, isso se reflete no fechamento das taxas futuras. A expectativa agora é de que o ciclo de alta está no fim e que cortes começarão em breve, talvez já em novembro. “Isso reduz as projeções de CDI médio e, portanto, derruba as taxas das NTN-Bs, especialmente as intermediárias. A curva tende a voltar a um formato mais normal, com os curtos fechando e os longos se estabilizando”, comenta Lima.