- A partir de 2 de janeiro haverá marcação a mercado para títulos corporativos
- A novidade é boa, porém exige um bocado de educação financeira do lado daí para evitar desespero
- Aprenda a conviver com ela e fazer bom proveito, sem sofrer com a volatilidade
Você acorda, vai até a cozinha, pega um café e encontra um luminoso colado na parede. Nele está registrado o preço do seu apartamento caso deseje vendê-lo naquele dia. No dia seguinte, você volta e o placar segue lá. Mas toma um susto: R$ 100 mil se foram. No elevador, você percebe pelo humor do vizinho que o mesmo aconteceu na casa dele.
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Mas, está tudo bem: o apartamento segue exatamente o mesmo e você não pretende vender tão cedo mesmo.
Na minha cozinha não tem placar, imagino que na sua também não. Mas, se um dia alguém lançar essa moda, vamos dizer que há “marcação a mercado” nos imóveis.
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O termo voltou a aparecer no noticiário recentemente graças a uma novidade: a partir de 2 de janeiro haverá marcação a mercado para títulos corporativos. Em bom português: você passará a saber todos os dias quanto vale aquele Certificados de Recebíveis Agrícolas (CRA), Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI) ou debênture em que investiu, queira você vender ou não.
Baita avanço, bom dizer: transparência é boa e a gente gosta.
Hoje você vê na tela da corretora seu título se valorizando ao ritmo prometido na largada, acumulando aos poucos os juros que serão pagos lá na frente no vencimento se tudo der certo – digo se tudo der certo porque, você sabe, crédito é uma dívida e sempre há o risco de calote.
Agora, convenhamos: a chamada marcação na curva, como funciona hoje, tem um quê de ficção. Primeiro porque você não vê o risco de calote crescendo, caso ele exista. E em segundo lugar porque ele só é válido se você carregar o título até o vencimento. E muitas vezes a possibilidade de vender o título no caminho é até argumento de venda de quem te oferece o título.
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A novidade é boa, porém exige um bocado de educação financeira do lado daí para evitar desespero: sim, a renda fixa oscila, assim como a Bolsa oscila. E assim também como seu imóvel oscila de valor, ainda que você não acompanhe todos os dias. Veja bem: o que na vida não oscila?
A dívida de uma empresa muda de valor ao sabor de sua capacidade de pagamento e também dos juros que ela retorna a quem detém o título, especialmente se as condições mudarem e o mercado passar a pagar mais ou menos.
Você pode continuar olhando para o longo prazo e carregando o título até o vencimento. Lembra do placar na sua cozinha: não é por que seu apartamento perdeu R$ 100 mil de valor de ontem para hoje que você precisa vendê-lo e realizar esse prejuízo. Talvez seja a pior hora para fazer isso.
Agora, se todos no seu prédio sabem o valor do apartamento todos os dias, você vai querer saber também, certo? Informação é poder. Isso pode pesar sobre suas decisões financeiras.
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Pois bem, a marcação a mercado que passa a valer em janeiro não é obrigatória para investidores qualificados, aqueles que declaram ter mais de R$ 1 milhão em investimentos financeiros. E algumas corretoras já estão perguntando se clientes querem assinar um termo abrindo mão da marcação a mercado, ou seja, pedindo que o título continue sendo marcado na curva.
Ora, mas por que você faria isso? Por mais que deseje carregar até o vencimento, se algo está acontecendo com seu investimento – com o agravante de que todo mundo sabe – você vai querer saber também.
Então minha recomendação é: não assine o termo abrindo mão da marcação a mercado. Aprenda a conviver com ela e fazer bom proveito, sem sofrer com a volatilidade. Ela já existia, você só não estava vendo. Continuará havendo a opção de carregar o título até o vencimento. Com títulos públicos comprados no Tesouro Direto, inclusive, já funciona assim.
E quanto aos fundos de crédito? Esses já praticavam marcação a mercado há muito tempo. E, bom dizer, os gestores estão esperando um bom fluxo de investidores que achavam que não havia volatilidade – e, de tabela, risco – quando investiam diretamente em ativos de crédito. E que vão passar a perceber o valor de um boa gestão profissional na seleção dos títulos.
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Considero o movimento positivo. Vejo muita gente por aí investindo em títulos corporativos, especialmente em CRAs e debêntures, sem saber o que compram – com um bom empurrão de comissões elevadas na força de venda. São ativos sem proteção do Fundo Garantidor de Crédito (FGC) e que exigem uma análise mais detalhada de riscos e garantias. Uma gestão profissional aqui faz toda a diferença.
Agora, se prefere manter o investimento direto em títulos, tudo bem também: escolha direito e aprenda a olhar para o luminoso na sua cozinha sem pânico. Investir bem é aprender que a volatilidade faz parte da vida.