Participantes regulados do mercado de capitais, ao contratar um influenciador, devem garantir que se exponha a relação contratual, ou seja, que a atuação do influencer é patrocinada. O alerta poderia vir com uma declaração verbalizada feita pelo influenciador, numa hashtag, numa tarja ou num vídeo, exemplifica Bruno Luna, chefe da Assessoria de Análise Econômica e Gestão de Riscos (ASA) da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
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A recomendação está em estudo sobre influenciadores digitais e o mercado de capitais, elaborado pela ASA e lançado nesta quarta-feira. Realizado com metodologia de Análise de Impacto Regulatório (AIR), o trabalho apoiará a elaboração da minuta da audiência pública sobre o tema, que deve acontecer no segundo semestre deste ano, como previsto na Agenda Regulatória para 2023, levando a edição de regras para 2024, disse Luna.
O chefe da ASA ressalta que muitos investidores não estão a par da relação comercial do influencer com o patrocinador, principalmente se o ambiente da manifestação ou opinião é descontraído e está inserido em contextos informais. O uso de fato relevante para fazer o alerta, porém, foi descartado. A expectativa é que o alerta seja feito pelo próprio influenciador.
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“É preciso ficar claro que o influenciador está sendo remunerado para dar aquela opinião. O foco não é entrar em questões operacionais, que poderão ser melhor descritas por meio da autorregulação. O objetivo é informar o público investidor de que aquela orientação, informação ou opinião está sendo emitida por conta de um contrato entre o influenciador e um regulado da CVM”, sublinhou.
O estudo da autarquia chama a atenção para dados, levantados pela Anbima, que apontam o rápido avanço das redes sociais na seara financeira: hoje são 515 influencers, com cerca de 160 milhões de espectadores. “Eventualmente, pode ter havido dupla contagem, mas ainda assim é uma ordem de grandeza brutal”, comentou Bruno Luna.
Neste contexto, o estudo frisa que a autorregulação é igualmente importante no esforço de construção de um ambiente de mercado mais transparente. “Deverá haver auto regulação antes mesmo da normatização da CVM”, prevê Luna. A Anbima tem convênio com a CVM desde 27 de outubro de 2021 para monitorar influenciadores de mercado. E o estudo lançado hoje destaca as discussões que estão sendo feitas com a Anbima e a BSM para alinhar as iniciativas em autorregulação.
Para o chefe da ASA, no pleno funcionamento do mercado, o ideal seria que a instituição regulada informasse sobre a contratação do influencer e a atividade que presta em seu nome. O executivo descartou, porém, a divulgação por meio de fato relevante, instrumento que já possui regramento.
Medidas como o alerta de que há uma relação contratual que apoia a manifestação do influencer estão alinhadas com o que é feito nos EUA, afirma Luna. “O Reino Unido já tem uma regra para lidar com a questão dos influencers: quem passa da fronteira regulatória pode ser punido. Já a Austrália é mais orientativa, como tem sido o Brasil. O regulador holandês divulgou um estudo no ano passado e tem convidado os influencers para dialogar.”
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“A União Européia, por sua vez, tem regulamento contra a manipulação e o abuso de mercado. As relações precisam ser transparentes: se a opinião é enviesada, e o influencer está sendo pago, o público tem de ser alertado.”
Sem novos regulados
A urgência da necessidade de abraçar a temática fica mais evidente pelo fato de que, no Brasil, em 2022 dobrou o número de influenciadores que falam sobre investimentos, conforme o acompanhamento da Anbima. Saiu de 255 no primeiro semestre para 515 no segundo. Outra pesquisa, realizada pela B3, apontou que cerca de 75% das pessoas iniciaram seus investimentos com base em informações de canais do YouTube e de influenciadores.
Por outro lado, é preciso atenção e bom senso para manter o perímetro regulatório. “Temos de tomar cuidado para não regular o influenciador”, diz José Antônio de Souza, analista da ASA. “O objetivo não é regular a atuação dos influencers, mas estender a eles as obrigações exigidas aos regulados da CVM. Ele só é participante quando contratado para falar em nome de uma empresa ou serviço. Quando sua opinião é patrocinada. Não vamos criar uma nova classe de regulados.”
Quanto àqueles que vão além das atividades de promoção e passam a oferecer análises, recomendações e gestão, por exemplo, devem ser enquadrados no exercício irregular da atividade como seriam em qualquer outro meio ou canal, dizem os técnicos.