- Compra de imóvel permite fazer hedge cambial, protegendo a carteira do investidor contra a desvalorização do real
- Na Flórida, investidores estão comprando casas em empreendimentos próximos aos parques temáticos de Orlando. Em linhas gerais, a renda gerada absorve o custo do financiamento
- Outra possibilidade é a locação tradicional, de longo prazo, especialmente em Miami. O retorno é menor, mas a estabilidade é maior
Investir no mercado imobiliário dos Estados Unidos é uma ideia que tem passado pela cabeça de mais brasileiros neste ano. De acordo com a Fraga Company, uma empresa especializada em assessorar investidores na exploração de propriedades na Flórida, a procura por esse tipo de aplicação cresceu 30% desde o início da pandemia.
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O movimento pode parecer inusitado para alguns, mas faz mais sentido a partir de um olhar atento do cenário macroeconômico. De um lado, os juros baixos restringiram demais o horizonte de ganhos de investimentos tradicionais, como a renda fixa, levando à necessidade de diversificação, o que abre espaço para investimentos no Exterior. De outro, o real já acumula perda próxima a 40% perante o dólar.
Diante disso, um imóvel nos EUA traz ao investidor a possibilidade de fazer hedge cambial, protegendo-o de uma maior desvalorização do real, na medida em que parte do patrimônio estará imobilizada em moeda forte. Além disso, é possível fazer a compra sem sair do Brasil, financiar em até 30 anos, obter rendimentos em dólar com a locação e, por que não, até mesmo passar alguns dias em solo americano nas férias.
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O fundador da Fraga Company, Alexandre Fraga, conta que sua clientela é formada principalmente por casais entre 35 e 50 anos de idade, com vida financeira bem estruturada, interessados em se resguardar das intempéries econômicas do Brasil. “Quanto mais a situação do país se deteriora, mais eles se movimentam em busca de proteção”, diz.
Em Orlando, a casa de férias vira negócio
A Flórida é uma escolha óbvia dos brasileiros por questões como o clima quente e a presença de latinos, mas não estamos sozinhos nessa. Dados da National Association of Realtors mostram que esse é o Estado americano preferido de 22% dos investidores estrangeiros. Depois, vêm Califórnia (15%), Texas (9%), Nova York (5%) e Nova Jersey (4%). Até março deste ano, o Brasil aparecia em sexto lugar entre os estrangeiros que mais investiam em imóveis nos EUA, atrás de chineses, canadenses, mexicanos, indianos e colombianos.
“A região é mais próxima da realidade do brasileiro e tem se popularizado ainda mais por força dos influenciadores digitais. O investidor financia uma casa que não é tão cara assim, o custo das parcelas é absorvido pela renda com a locação para outros hóspedes e, quando quiser, ele vem passar uns dias com a família”, diz Fraga.
A casa será oferecida em plataformas de turismo como Booking e Airbnb, de olho nas preferências das famílias norte-americanas que visitam os parques temáticos de Orlando o ano inteiro, sem trégua. De acordo com a empresa, o imóvel ideal como investimento é uma propriedade de seis quartos e cerca de 450 m², capaz de receber entre 12 e 16 hóspedes de 2 a 3 famílias.
O valor de um imóvel desse porte fica entre US$ 430 mil e US$ 490 mil, dependendo da localização. A tarifa cobrada dos hóspedes gira em torno de US$ 350 por dia e a permanência média é de oito diárias. “Se a casa ficar alugada 20 dias no mês, são US$ 7 mil. Você paga os 20% da corretora, paga a sua prestação e ainda sobram US$ 2 mil ou US$ 3 mil livres. É uma renda passiva de R$ 15 mil por mês”, calcula o empresário.
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Para atrair o interesse dos visitantes – e garantir avaliações favoráveis nas plataformas – o empresário diz que é importante pensar em uma decoração clean, neutra e que priorize o gosto do americano. “Não adianta gastar uma fortuna com arquiteto só para fazer aquela casa maravilhosa. É preciso ter um ou dois quartos temáticos para a criança, decorados com motivos Disney ou Star Wars”, diz.
Embora a empresa atue em toda a Flórida, Fraga diz que Orlando é mais vantajosa para o investidor porque o fluxo de visitantes norte-americanos é constante. Já Miami, mais frequentada por estrangeiros, tende a sofrer com queda de turistas em momentos de crise.
“Compra em Miami quem tem uma certa identificação com o lugar. A cidade ficou cara e difícil de rentabilizar. Em Orlando, a casa se paga com as locações e o proprietário ainda embolsa entre US$ 10 mil e US$ 20 mil por ano”, diz Fraga.
O empresário afirma ainda que, entre a renda com as locações e a valorização do bem, é possível ter retorno de até 18% ao ano, se o negócio for bem administrado. “Tem que fazer uma compra assertiva, decorar da forma certa e não usar a casa com frequência. Vá uma vez só por ano, em maio ou setembro, na baixa temporada”, recomenda.
Locação de longo prazo é outra possibilidade
O corretor Frederico Hexsel mora em Orlando há mais de 10 anos, mas sua visão sobre o mercado de vacation homes não é tão entusiasmada como a de Fraga. Ele diz que, com o fechamento das fronteiras dos EUA, em razão da pandemia, o segmento entrou em uma fase difícil e muitas casas foram colocadas à venda.
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“O momento é bom para quem compra, porque os preços caíram bastante. Há casos em que os proprietários até aceitam receber parte do valor em reais, no Brasil”, conta.
Em Miami, ele diz que as melhores oportunidades de investimento estão em moradias de US$ 400 mil a US$ 500 mil, para locação long term (de longo prazo). Nessa faixa de preço, dá para comprar um condo (apartamento) de 80 metros quadrados nas imediações da Brickell Avenue, atual centro de negócios da cidade.
Ele frisa que a escolha de um imóvel residencial nos EUA não pode deixar de levar em conta a oferta de escolas no entorno. Isso porque, na rede pública de todo o país, os alunos só podem se matricular no mesmo bairro em que residem. “Essa questão afeta muito a liquidez e a valorização de um imóvel”, afirma o corretor.
Um movimento recente de investidores brasileiros em Miami tem sido a procura de residências na faixa de US$ 500 mil e com uma peculiaridade: ausência de piscina, um item cada vez mais valorizado na cidade. “Eles gastam US$ 30 mil para construir uma piscina e depois revendem a casa por até US$ 700 mil”, conta Hexsel.
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Locações de curto e longo prazo têm seus prós e contras. Hexsel reconhece que a primeira modalidade entrega uma rentabilidade maior que a do aluguel residencial. Por outro lado, a locação long term oferece estabilidade e renda garantida, enquanto a casa de férias depende de hóspedes que nem sempre estão lá.
“Em uma estimativa conservadora, o retorno de uma vacation home em Orlando é de 7% a 8% ao ano. Já o mercado residencial em Orlando e Miami gira entre 5,5% e 7%”, compara o corretor.
O investidor também deve colocar na ponta do lápis o gasto com a empresa que fará a gestão da locação. Entre outras comodidades, ela faz as vezes de concierge dos hóspedes, além de cuidar da manutenção da propriedade e providenciar reparos imediatos na lavadora de roupas ou no ar-condicionado, por exemplo.
Na locação de longo prazo, o custo é de 10% do valor do aluguel. Na de curto prazo, paga-se 20% do valor da locação, ou uma taxa fixa de US$ 100 se a casa estiver vazia.
Processo de compra não é complicado
O processo de compra é menos complicado do que se pode imaginar. A compra exige que o interessado tenha um visto válido – de turista, negócios ou estudo – e pode ser feita à distância. A assinatura da escritura pode ser feita no Consulado dos EUA no Brasil. “Nove entre dez compradores não vão nem ver a casa que compraram”, conta Fraga.
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O financiamento requer uma entrada de 30% a 35% do valor do bem. As taxas variam muito. “Se o interessado tiver renda comprovada, pode conseguir uma taxa competitiva, de 3% a 4%, próxima das que são cobradas dos residentes”, diz Sergio Cesario, fundador do The Cesario Group, que atua no mercado residencial com foco em imóveis de luxo. “Se for autônomo e só tiver o extrato bancário e não declarar renda, as taxas serão maiores, de 5% a 6%.”
Cesario ressalta que é importante conseguir uma pré-aprovação para o financiamento antes mesmo de iniciar a busca pelo imóvel. “As exigências desses financiamentos estão cada vez maiores, pois os bancos estão tentando se proteger da inadimplência”, explica.
Para Frederico Hexsel, a segurança jurídica é muito maior que a do mercado imobiliário brasileiro. Caso o inquilino se torne inadimplente, por exemplo, a lei dá um prazo de 2 a 3 semanas para que as partes se resolvam de forma amigável. “Depois disso, ele pode ser removido da casa de forma muito rápida”, diz.
Um pedaço de hotel para chamar de seu
Uma modalidade ainda incipiente, mas que tem atraído investidores brasileiros com tíquetes maiores, é o private equity de empreendimentos hoteleiros. Nesse caso, para potencializar a operação de um hotel, a rede vende cotas para o investidor e, em troca, lhe paga juros trimestrais.
“Geralmente são bandeiras bem consolidadas, como Hyatt. E o investidor não está comprando o risco da rede, mas apenas o daquele estabelecimento físico do qual ele é cotista”, diz Hexsel.
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O valor de cada cota costuma partir de US$ 50 mil. A ideia é que o investidor pulverize seu capital entre várias redes e também entre produtos de segmentos diferentes da mesma bandeira.
“Ao invés de comprar dez propriedades para alugar, ele compra 10 ou 20 cotas de cada empreendimento e diversifica os investimentos”, explica Hexsel. “O retorno esperado é de pelo menos 9% ao ano.”
Uma vantagem interessante do equity é que alguns empreendimentos qualificam o investidor para pleitear um visto EB5, destinado aos estrangeiros que investem US$ 900 mil ou mais nos EUA. Depois de alguns anos de operação, se o projeto de investimentos cumprir uma série de exigências, o postulante recebe um green card definitivo para entrar no país.