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Comportamento

Robert Smith: o bilionário e filantropo que fez fortuna com um negócio duvidoso

Investigações indicam que o famoso empresário americano usou contas offshore para sonegar impostos

Robert Smith: o bilionário e filantropo que fez fortuna com um negócio duvidoso
Robert F. Smith, fundador da Vista Equity Partners (Foto: Chester Higgins Jr./The New York Times)
  • Ao longo dos últimos cinco anos, Robert F. Smith se tornou um dos bilionários e filantropos mais conhecidos dos Estados Unidos
  • Nesse período, ele doou US$ 20 milhões para o Museu Nacional Smithsonian de História e Cultura Afro-Americana. Outras dezenas de milhões foram para parques florestais, pesquisa sobre câncer de mama, entre outros
  • Mas, segundo o ministério público dos Estados Unidos, ele está envolvido no maior esquema de sonegação de impostos da história do país

(Peter Whoriskey, Yeganeh Torbati e Keith L. Alexander / Bloomberg) – Ao longo dos últimos cinco anos, Robert F. Smith se tornou um dos bilionários e filantropos mais conhecidos dos Estados Unidos.

Nesse período, ele doou US$ 20 milhões para o Museu Nacional Smithsonian de História e Cultura Afro-Americana. Outras dezenas de milhões foram para parques florestais, pesquisa sobre câncer de mama, para o Carnegie Hall e para pagar dívidas estudantis de uma turma de formandos do Morehouse College.

No primeiro semestre de 2020, ele pressionou o Secretário do Tesouro americano, Steven Mnuchin, e Ivanka Trump, filha do presidente, a usar US$ 10 bilhões do pacote de ajuda governamental do coronavírus para oferecer crédito a famílias de baixa renda.

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Leia também: Conheça Robert Smith, o investidor negro mais rico dos EUA

Mas, no meio de tanta generosidade, Smith escondia um segredo: segundo o ministério público dos Estados Unidos, ele está envolvido no maior esquema de sonegação de impostos da história do país. O caso envolve o parceiro comercial de Smith, o também bilionário Robert Brockman, que teria ocultado US$ 2 bilhões da receita federal americana em contas fora do país – usando um programa de computador chamado Evidence Eliminator (“eliminador de provas”) e codinomes como “Redfish” e “Snapper”.

De acordo com as investigações, Robert Smith atendia por “Steelhead”. Ele já confessou ter escondido lucros em instituições offshore e entregado declarações falsas de imposto de renda durante dez anos. O bilionário está cooperando com as autoridades e não é acusado na investigação. Mesmo assim, seu papel de cúmplice nos crimes fiscais abalou todos os que viam um modelo de filantropia no carismático empreendedor de 57 anos – muitas vezes apontado como a pessoa negra mais rica dos Estados Unidos.

Pode parecer difícil conciliar esses dois aspectos de Smith: de um lado, um altruísmo impressionante; de outro, a confissão de evasão fiscal. As duas faces, porém, estão umbilicalmente ligadas. É o que revelam documentos publicados pelo jornal The Washington Post – incluindo declarações de doações, entregues à Receita Federal americana, e registros oficiais do Departamento de Justiça.

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Ambos os lados da história têm origem num acordo fechado entre Smith e Brockman há 20 anos – acordo que formou uma dupla improvável em torno de uma empreitada ambiciosa. Filho de professores da cidade de Denver, Smith era então um determinado aspirante ao mundo das finanças. Brockman era mais velho e bem mais rico, tendo acumulado fortuna graças a uma empresa que vendia software para a indústria automobilística.

Investigação

Em seu depoimento ao Ministério Público, Smith contou que conseguiu abrir a própria empresa de capital privado – a Vista Equity Partners – graças à oferta de Brockman, e ainda obteve US$ 1 bilhão para investir. Com isso, acabou se tornando, também ele, um bilionário.

Ocorre que, também segundo as informações prestadas pelo empresário à Justiça, a parceria incluía um fundo offshore para “ocultar intencionalmente” do fisco lucros de US$ 200 milhões recebidos por Smith. Embora recentemente essa conta bancária tenha sido a fonte de boa parte das doações feitas pelo filantropo, os registros do tribunal indicam que os recursos ali depositados passaram ao largo das regras que exigem declarar contas bancárias fora do país.

Em outras palavras, foi uma espécie de pacto com o diabo. À época, porém, Smith enxergava principalmente os benefícios da troca. Ele só percebeu o lado negativo do negócio mais de uma década depois.

A declaração assinada por Smith e seus advogados diz o seguinte: Brockman “apresentou essa proposta comercial incomum como uma oferta do tipo ‘pegar ou largar’, ditando termos atípicos e uma estrutura nada ortodoxa para o acordo. Apesar da apreensão, Smith aceitou, por enxergar uma oportunidade de negócios sem precedentes, que ele realmente desejava concretizar”.

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Brockman se declarou inocente das acusações, e seus advogados não responderam ao pedido de entrevista para esta reportagem. A declaração de Smith não cita Brockman nominalmente, mas usa o termo “Indivíduo A” e traz um histórico profissional e detalhes biográficos suficientes para saber que essa pessoa é o texano. Brockman responde em liberdade.

Os advogados de Smith também se recusaram a dar entrevista. Mas, numa carta enviada há alguns dias para os investidores, o executivo escreveu: “lamentavelmente, uma decisão tomada há vinte anos levou a essa turbulência… Eu jamais deveria ter me colocado nesta situação”.

“Só podemos julgar as pessoas com base no que sabemos sobre elas”, afirmou Clive Gillinson, diretor-executivo e artístico do Carnegie Hall de Nova York – instituição que recebeu mais de US$ 30 milhões de Smith. “Eu confio na integridade dele”.

Já a assessora de imprensa de Steven Mnuchin, Monica Crowley, disse que o secretário do tesouro desconhecia a investigação da receita no período em que discutiu com Smith o projeto da lei de auxílio governamental.

Histórico

Em 1997, quando Smith e Brockman se conheceram, o primeiro parecia destinado ao sucesso. Ambicioso e decidido, ele se descrevia como produto de “uma família vitoriosa”.

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Smith cresceu em Denver quando a cidade começava a sair da segregação racial. Todos os dias, ele tomava um ônibus para ir de seu bairro, predominantemente negro, até a escola que cursava, predominantemente branca. Segundo ele, tanto seu pai quanto sua mãe tinham doutorados em Educação.

“Meus irmãos mais velhos iam junto comigo”, lembrou ele numa entrevista concedida em 2019 para Reid Hoffman, co-fundador do LinkedIn. “A gente andava até o final do quarteirão, subia no ônibus e levava 35, 40 minutos para chegar à escola. Parecia que a viagem não acabava nunca. Depois a gente entrava numa comunidade estudantil totalmente diferente dos meninos que eu estava acostumado a ver. Mas, como tudo na vida, sabe o que a gente descobriu? Que havia mais semelhanças do que diferenças… Isso foi muito importante para a minha criação”.

Smith se formou em engenharia química pela Universidade Cornell, ocupou alguns cargos corporativos na Kraft e na Goodyear e fez um MBA em Columbia. Em seguida, foi contratado pelo banco de investimentos Goldman Sachs – emprego que, por si só, já teria sido um indicador de sucesso de elite.

Smith, porém, queria mais. Em 1997, ainda no Goldman Sachs, ele conheceu Borckman e passou a admirar a operação da empresa de software que pertencia ao veterano, à época chamada Universal Computer Systems.

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O encontro foi decisivo por diversos motivos. Smith foi apresentado a seu primeiro grande investidor, etapa que muitas vezes representa um obstáculo importante para qualquer pessoa com aspirações como as dele. Além disso, o jovem tomou contato com o modelo de negócios de Brockman, que mais tarde ele aplicaria às empresas de software compradas e vendidas por seus fundos de capital privado.

Leia também: Como encontrar o caminho certo nos investimentos em um mercado oscilante

Numa entrevista de 2018, conduzida por David Rubinstein, co-fundador do Carlyle Group, Smith recordou: “topei com uma pequena empresa de Houston, no Texas. É a companhia de software mais eficiente que já vi. Eles faziam coisas muito básicas com grande maestria. Pensei: ‘poxa, se eu pegar essas coisas básicas e adotá-las em outras empresas de software… Isso pode criar muito valor’”.

No final da década de 1990, de acordo com a declaração dada à Justiça, Brockman procurou Smith com a ideia de criar um fundo de capital privado. E foi assim que Smith estabeleceu o que viria a ser a Vista Equity Partners – na qual Brockman investiu US$ 1 bilhão.

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Foi um aporte e tanto, mas Smith narrou em seu depoimento que o dinheiro de Brockman veio com algumas condições. Uma delas exigia que o beneficiado guardasse metade dos lucros do fundo numa conta fora do país. Dessa forma, em caso de litígio Brockman evitaria enfrentar processos em tribunais americanos.

Smith também contou às autoridades que foi orientado por Brockman a não comentar com outros advogados sobre as contas offshore. Enquanto isso, o representante jurídico de Brockman assegurou a Smith que a papelada preparada por seu escritório fora feita de modo a sugerir que a renda e os ativos depositados no fundo não pertenciam a Smith, e por isso ele não seria tributado.

“A oferta parecia extremamente interessante”, recordou Smith na entrevista a Rubinstein. “Lembro que meu advogado me disse: ‘Robert, isso aqui é mau negócio, mas você deve aceitar’”.

Uma proposta como essa teria sido tentadora para qualquer pessoa. Mas quem trabalha no mercado financeiro explica que, para um negro batalhando para entrar nessa área – ou para integrantes de qualquer minoria –, a oferta era ainda mais atraente.

“Convencer alguém a te dar milhões de dólares para executar sua estratégia… Isso já é difícil para qualquer um”, afirma Charles Hudson, diretor-geral da Precursor Ventures, empresa de capital de risco que investe em empreitadas iniciantes. “Para um negro, mais ainda”.

“Nunca ninguém me ofereceu uma quantia como essa – impondo condições ou não”, continua Hudson, que também é negro. “Se alguém oferece um cheque polpudo, é claro que vai ser interessante”.

A Vista Equity Partners evoluiu a partir desse empurrão inicial, e começou a comprar e vender investimentos em empresas de software. Smith usou as estratégias de negócios que havia observado na Universal Computer Systems para impulsionar o crescimento das empresas na qual investia e aumentar seu valor de mercado. Embora ele comandasse as operações de private equity, Brockman seguia dando conselhos sobre investimentos, conforme mostram os documentos da acusação. Às vezes os executivos das empresas beneficiadas pelos aportes eram convidados a visitar a sede do negócio de Brockman.

“Smith era uma presença visionária, cheia de energia”, diz um empresário que faz parte da carteira de investimentos da Vista. Ele preferiu não ser identificado, para preservar seus contatos no setor. “Não foi apenas um golpe de sorte. Brockman ofereceu o capital e a ideia iniciais. Depois disso, Smith e sua equipe tocaram adiante”.

Consequências

Num dado momento, porém, os riscos inerentes ao acordo com Brockman ficaram evidentes: entre novembro de 2013 e janeiro de 2014, Smith foi alertado que a receita americana estava de olho em suas contas.

Naquele período, ainda de acordo com o depoimento, Smith foi avisado por representantes de um banco suíço que a instituição iria participar de um programa do Departamento de Justiça dos Estados Unidos para divulgar informações sobre contas offshore de cidadãos americanos. Os representantes pediram que Smith renunciasse a seu sigilo bancário, e recomendaram que ele se inscrevesse num programa voluntário do IRS (a autoridade fiscal americana) para revelar recursos mantidos no exterior.

Em março de 2014, Smith de fato se inscreveu no programa da receita, mas seu pedido logo foi recusado. Procuradores afirmam que isso costuma ser indício de que o órgão já está examinando a declaração de imposto de renda do solicitante.

Quando alguém tem seu pedido de inscrição recusado dessa forma, “o IRS basicamente está avisando… que já sabe algo a seu respeito ou já está investigando suas movimentações”, explica George Abney, ex-promotor do setor tributário do Departamento de Justiça, hoje dono de um escritório particular. “Pode ser uma questão menor, mas pode ser um problema grande, como parece ser o caso aqui”.

Nesse tipo de situação, explica Abney, os advogados costumam sugerir que a pessoa “resolva o que for necessário. Assim, caso o IRS bata na sua porta, você pode dizer que já tratou de tudo e ficar com uma imagem melhor”.

Filantropia

Mais ou menos nessa mesma época, Smith se transformou num grande filantropo, que com frequência estampava manchetes graças a sua generosidade.

Num release divulgado para a imprensa sobre o acordo fechado com Smith, a Departamento de Justiça afirma que, antes disso, o bilionário já havia usado US$ 13 milhões de recursos não-tributados para reformar uma residência no Colorado (seu estado de origem) e financiar “atividades beneficentes no local”. Tudo indica que a casa reformada é Lincoln Hills, erguida na década de 1920 como refúgio de campo para negros no período em que ainda havia segregação oficial. Smith começou a passar ali suas férias em família, e também usou a estrutura para abrigar crianças à espera de adoção ou vítimas de tráfico. Além disso, o empresário ajudou a fundar uma organização sem fins lucrativos, chamada Lincoln Hills Cares, que oferecia atividades ao ar livre para jovens carentes do Colorado.

Mas sua grande investida no universo da filantropia se deu em 2014. Naquele ano, ele estabeleceu a Fund II Foundation e encheu os cofres da entidade com US$ 182 milhões em ativos vindos das contas offshore onde ele ocultava sua renda, conforme afirmam o Departamento de Justiça e as declarações de imposto de renda da própria fundação.

Não se sabe ao certo por que Smith começou a fazer tantas doações nessa época. Porém, nesse mesmo período, tanto sua vida pessoal quanto empresarial sofreram grandes reviravoltas.

Em 2014 ele havia se separado da primeira mulher, e no ano seguinte casou-se com a modelo Hope Dworaczyk, eleita Playboy Playmate em 2010. A luxuosa cerimônia que celebrou a união foi realizada na Itália, e teve entre os convidados os cantores John Legend e Seal.

No mesmo mês, Smith e seus sócios venderam para outra empresa de capital privado uma participação minoritária na Vista Equity Partners – o que provavelmente deixou o fundador ainda mais rico e aumentou sua capacidade de fazer doações.

Especialistas tributários acreditam que as iniciativas filantrópicas podem ter tido também uma intenção estratégica: se o dinheiro das contas offshore estava sendo usado para causas nobres, então os procuradores e juízes poderiam acreditar que a sonegação fiscal era menos pior do que parecia.

A maior fatia depositada na fundação veio de um fundo com sede em Belize, o Excelsior, controlado pelo próprio Smith. O veículo consistia de ações de uma segunda instituição offshore, uma empresa de fachada chamada Flash, localizada na ilha caribenha de Nevis. As informações constam da declaração de imposto de renda da fundação, e também de depoimentos prestados ao Departamento de Justiça. O próprio Smith relatou em seu depoimento que as duas entidades eram as mesmas que ele havia estabelecido no ano 2000, no escopo do negócio fechado com Brockman. Como parte do acordo selado com as autoridades, Smith admite que usou os fundos para ocultar mais de US$ 200 milhões em receitas.

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O site da fundação informa que o dinheiro depositado nas entidades sempre foi dedicado a iniciativas de caridade. A Fund II foi criada na esteira de um acordo entre a Vista Equity Partners e a empresa de Brockman, com sede em Bermuda, criada especificamente para investir no fundo de capital privado de Smith. A fundação afirma ainda que as partes concordaram em também dedicar a causas beneficentes qualquer recurso que sobrasse nos fundos offshore quando eles fossem encerrados.

Mas a declaração de Smith aos promotores diz que ele “argumentou, de forma falsa e intencional, que as contribuições filantrópicas seriam uma parte necessária do acordo” fechado com Brockman.

Mesmo diante das doações feitas com os recursos das contas no exterior, alguns advogados afirmam que Smith teve sorte por não enfrentar acusações no âmbito da justiça criminal, sobretudo considerando a magnitude da evasão.

“Tem muita gente achando estranho que um bilionário possa se safar de ter enganado o fisco só porque decidiu cooperar na investigação contra outro bilionário que enganou o fisco”, afirma Justin Weddle, ex-procurador que trabalhou em vários casos tributários importantes e hoje também tem escritório próprio. “O fato de que Smith conseguiu fechar acordo com as autoridades para não ser processado é extremamente raro”.

No acordo com o ministério público, Smith retira um pedido que havia feito para receber uma restituição de impostos no valor de US$ 182 milhões – relacionada, em parte, a deduções associadas às doações de 2018 e 2019, conforme informou o Departamento de Justiça.

Weddle também observa que o esquema de sonegação sugere uma estratégia particularmente equivocada, tanto para Brockman quanto para Smith: embora este último possa ter protegido dezenas de milhares de dólares, as quantias são pequenas quando comparadas à fortuna dos dois homens.

“Me parece um pouco burro”, afirma o ex-procurador. “Smith se arriscou a enfrentar um processo criminal em troca de uma fração muito pequena de sua carteira”.

Interessado em uma análise de sua situação fiscal, Smith já havia contratado advogados tributaristas – entre eles Charles Rettig, indicado por Donald Trump como diretor do IRS em 2018. Essa informação foi dada por duas fontes próximas ao processo de contratação, que preferiram não se identificar. Além disso, não se sabe que tipo de consultoria Rettig e outros tributaristas ofereceram a Smith.

“O diretor não desempenhou qualquer papel na investigação do Departamento de Justiça contra Robert Smith”, declarou o IRS em comunicado oficial. “Sem revelar se o diretor representava algum cliente específico, em algum assunto específico, enquanto trabalhava para um escritório particular, o diretor se afastou de tais assuntos no momento em que assumiu o cargo”.

Especialistas tributários dizem que bilionários como Smith podem colher benefícios financeiros consideráveis se fizerem filantropia, além de melhorar sua imagem pública.

“Este caso sem dúvida é preocupante, pois revela a extensão do uso de veículos offshore pelos ricos americanos para evitar impostos”, diz Ray Madoff, professor do Boston College e especialista em filantropia e tributação. “Do ponto de vista da benemerência, esse episódio levanta questões sobre a capacidade das pessoas de compensar grandes quantias tributáveis usando o recurso de fazer doações”.

Quaisquer que sejam os motivos por trás das doações de Smith, muita gente se beneficiou delas – e quase todas essas pessoas continuam elogiando o trabalho.

Pouco depois de receber o aporte, a fundação entrou numa espécie de surto filantrópico: fez doações gigantescas à Universidade Cornell, ao United Negro College Fund, à Fundação de Parques Nacionais, à Fundação Susan G. Komen (que trabalha com câncer de mama) e a outras causas. Em Cornell, instituição onde Smith estudou, um edifício foi batizado em homenagem ao filantropo.

Segundo Paula Schneider, presidente e CEO da Susan G. Komen, em 2016 Smith deu à entidade mais de US$ 10 milhões em ações da Fund II Foundation. Paula relata que os recursos foram usados para iniciar um projeto de pesquisa realizado em dez cidades, cujo objetivo era investigar por que mulheres negras têm taxas consideravelmente mais altas de câncer de mama.

“Robert nos ajudou imensamente, isso eu posso dizer. Ele foi extremamente generoso”, declarou a CEO.

Já Clive Gillinson, do Carnegie Hall, lembrou que foi apresentado a Smith há sete anos, antes que o filantropo se tornasse uma figura conhecida. Os dois conversaram sobre a paixão comum por música e artes, e sobre a missão do Carnegie Hall de criar um programa educativo para crianças.

Em 2015, Smith doou US$ 15 milhões para a instituição, voltados para um programa nacional que pretendia atender cinco milhões de crianças ao longo de um período de dez anos, em parceria com a rede escolar do país. Dois anos depois, Smith doou outros US$ 10 milhões para a expansão de um projeto de artes e educação. Posteriormente, desembolsou mais US$ 5 milhões para expandir uma iniciativa de educação musical e US$ 2 milhões para financiar a Orquestra Jovem Nacional do Carnegie Hall, que viaja o mundo se apresentando como uma espécie de embaixadora dos Estados Unidos.

Gillinson acabou convidando Smith para participar do conselho do Carnegie Hall, e em 2016 o filantropo foi eleito presidente da mesa.

“Acreditamos profundamente em Robert”, diz Gillinson. “Ele tem integridade e compromisso com o que realmente importa para nossa sociedade”.

Mas foi só em 2019 que Smith realmente chamou atenção. Durante a cerimônia de formatura do Morehouse College, ele anunciou de surpresa o compromisso de saldar as dívidas estudantis contraídas pela turma de formandos daquele ano. O auxílio, que acabou incluindo também os empréstimos assumidos pelos pais dos alunos, atingiu US$ 34 milhões.

Essa doação veio um ano após outra feita anteriormente, de US$ 1,5 milhão. David Thomas, presidente do Morehouse, descreveu os US$ 34 milhões como um “catalisador” que incentivou outros filantropos a doar para universidades e faculdades historicamente negras do país. Em 2020, as doações anuais feitas a essas instituições de ensino vão superar os valores recebidos ao longo de 170 anos de história.

“E todas elas são resultado do movimento iniciado por Robert”, afirma Thomas.

Mesmo assim, a notícia de que Smith estava envolvido com Brockman deixou muita gente confusa, tentando compreender o que aconteceu.

Smith é um “bilionário afro-americano que, até agora, parecia em grande medida representar a concretização do sonho americano”, prossegue o presidente do Morehouse College. “Ele vem de uma família humilde, e graças à educação chegou a Cornell e Columbia, respeitando as regras, inovando com a criação do Vista e impulsionando o setor tecnológico”.

Thomas acredita que Smith concordou com a proposta de Brockman porque assim poderia realizar seus planos – mesmo que isso significasse dar a Brockman mais controle do que Smith gostaria sobre os recursos mantidos nas contas offshore.

“Isso aconteceu há 20 anos. Era um cara pardo, de 36 anos, circulando por Wall Street e tentando convencer os investidores a colocar dinheiro numa ideia grandiosa. Pouca gente estava disposta a fazer isso. Aí ele recebeu um aporte bilionário e construiu um império que o deixou rico”.

(Tradução: Beatriz Velloso)

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