- As incertezas sobre o início de corte de juros nos Estados Unidos e o risco fiscal no Brasil azedaram o humor dos inevstidores
- Com a deterioração do ambiente econômico, as corretoras avaliam como preço justo para o IBOV os 145 mil pontos. Atualmente, o índice permanece nos 121 mil pontos
- Apesar da derrocada da bolsa de valores, as ações brasileiras ainda entregam um retorno sobre patrimônio (ROE - sigla em inglês) maior do que os outros mercados emergentes
Quem achou que poderia lucrar com o Ibovespa ao longo de 2024 precisou recalcular a rota nos últimos meses para não ficar no prejuízo. As incertezas sobre o início do corte de juros nos Estados Unidos e o risco fiscal no ambiente doméstico foram suficientes para frustrar qualquer expectativa de uma guinada da Bolsa brasileira no primeiro semestre. A situação obrigou as corretoras a revisarem as projeções para o principal índice da B3 até dezembro.
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Os patamares de 160 mil a 170 mil pontos apontados no início do ano não fazem mais sentido para um cenário marcado por indefinições. Agora, o preço ideal para o IBOV se encontra entre a faixa dos 150 mil a 135 mil pontos. “Reduzimos o valor justo do Ibovespa devido às taxas de juros mais altas, mas continuamos vendo as ações brasileiras como atrativas”, informou a XP ao comunicar a revisão no dia 3 de junho. Além do cenário macroeconômico desafiador, os ruídos relacionados à interferência política na gestão de algumas companhias também motivaram a mudança no patamar alvo do índice.
Em março, o mercado foi surpreendido com a decisão da Petrobras (PETR3; PETR4) em não distribuir os dividendos extraordinários da companhia. Na época, o Conselho de Administração da petroleira informou que o montante de R$ 43,9 bilhões seria integralmente destinado para a reserva de remuneração do capital com a finalidade de assegurar recursos para distribuições futuras. A pressão dos investidores sobre a decisão obrigou o governo a voltar atrás. No fim de abril, a Assembleia Geral Ordinária (AGO) da petroleira aprovou o pagamento de 50% dos dividendos extraordinários retidos pela estatal.
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Mas os ruídos políticos envolvendo o papel não se resumiram a esse episódio. Em maio, uma nova surpresa: o presidente Luiz Inácio Lula da Silva demitiu Jean Paul Prates do comando da Petrobras. A saída já era ventilada desde o fim do ano passado e a causa da troca se deve à cobrança por maior velocidade na execução dos projetos anunciados pela empresa, segundo apurou o Broadcast.
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O governo indicou Magda Chambriard, ex-diretora-geral da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) durante o governo de Dilma Rousseff, para ocupar o cargo. Com a troca do comando, a Petrobras perdeu R$ 34 bilhões em valor de mercado após as ações cederem mais de 6% no dia 15 de maio, quando os investidores repercutiram a demissão de Prates.
O mercado também reagiu de forma negativa a tentativa do Planalto em colocar, por meio da Previ, fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil (BBAS3), o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega para o cargo de CEO da Vale (VALE3) em janeiro deste ano. Quando o assunto veio à tona, as ações da Vale caíram 2,20%.
O interesse do governo com a indicação era ter um nome à frente da mineradora mais alinhado ao pensamento político do Executivo atual, já que Eduardo Bartolomeo, CEO da companhia, era um forte aliado político do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
O prêmio dos investidores que derruba o Ibovespa
Como as duas companhias têm o maior peso na composição do índice, os eventos envolvendo as ações ajudaram o Ibovespa a acumular uma queda superior a 9% em 2024. As incertezas sobre os próximos passos da política monetária nos Estados Unidos também tornaram mais distante uma recuperação do principal índice da B3. Com os juros nos intervalos de 5,25% a 5,50% ao ano, o capital estrangeiro tende a dar prioridade aos títulos soberanos norte-americanos devido à alta rentabilidade e ao menor risco que os ativos da maior economia do mundo oferece aos investidores. Ou seja, para investir em países emergentes e de maior risco, como o Brasil, o mercado exige um prêmio maior.
“Os dados recentes sugerem que a inflação nos EUA pode não estar a desacelerar, o que poderá afetar os planos do Fed (Federal Reserve, o banco central americano) em reduzir as taxas em 2024”, escreveram os analistas do Santander. Na sexta-feira (7), o Departamento do Trabalho dos Estados Unidos informou a criação de 272 mil empregos em maio. O resultado veio acima das expectativas dos analistas consultados pelo Projeções Broadcast, que variavam de 120 mil a 220 mil postos de trabalho, com mediana de 185 mil. Os números do relatório, conhecido como payroll, costumam influenciar na decisão do Fed sobre a condução da política monetária dos Estados Unidos.
A situação obrigou o Santander a revisar o preço-justo para o Ibovespa no fim do ano. Antes, o banco mantinha uma projeção de 160 mil pontos, mas reduziu no fim de maio para o patamar dos 145 mil.
A deterioração do ambiente econômico na conta os riscos domésticos e internacionais também obrigou a Empiricus a revisar o preço justo do Ibovespa ao avaliar que o patamar de 170 mil pontos não fazia mais sentido – a corretora agora estima o preço justo de 145 mil pontos para o principal índice da B3. “Quando olhamos para o novo ambiente, vamos que os indicadores são piores tanto na inflação no exterior quanto no ambiente doméstico. A volatilidade da Bolsa brasileira também aumentou”, afirma João Piccioni, CIO da Empiricus Gestão.
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Nem tudo está perdido: a Bolsa ainda é lucrativa
A revisão do IBOV não significa que as oportunidades de investimento do mercado acionário brasileiro minguaram. Para a Ágora Investimentos, sob as condições de incertezas sobre os juros no exterior e o aumento dos riscos fiscais no Brasil, as empresas conseguiram entregar resultados corporativos saudáveis na temporada de balanço referente ao primeiro trimestre e o índice poderia ter tido quedas ainda mais expressivas se não fosse por isso.
“Na nossa visão, o valuation (valor das ações) convidativo dos ativos locais e a dinâmica favorável dos lucros das empresas atuaram como contraponto”, informou a Ágora Investimentos, em relatório mensal. “Preferimos exposição à renda variável no Brasil por meio de boas pagadoras de dividendos e nomes de maior qualidade. Dentro dos nossos critérios de seletividade, gostamos de histórias que
tenham direcionadores próprios, como M&As (fusões e aquisições) e melhoria de resultados”, acrescentou a corretora no documento.
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Já uma análise do Itaú BBA mostrou que o Brasil ainda mantém os melhores retornos sobre patrimônio (ROE, na sigla em inglês) entre os mercados emergentes. O cálculo considera tanto a média dos últimos cinco anos, quanto o consenso das estimativas. Segundo os analistas da instituição financeira, o ROE atual da Bolsa brasileira está em 18,4%, 0,2 ponto porcentual acima da média dos últimos cinco anos.
O Brasil também se destaca quando se observa as margens líquidas. A média, segundo o Itaú BBA, fica em torno de 13,5% contra a média de 10,6% dos mercados emergentes. No entanto, essa liderança está com os seus dias contados. As estimativas mostram que o México caminha para ocupar a liderança em 2025 com um ROE previsto de 16,2% para o ano, enquanto o Brasil deverá reduzir o seu retorno sobre patrimônio para 16%.
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A realidade exige dos investidores uma seleção mais criteriosa ao escolher as ações para compor a carteira. Para a XP, em um período em que as taxas de juros irão continuar ainda em patamares elevados, empresas bastante alavancadas devem ficar de fora do portfólio. “Nosso fator de baixa alavancagem teve retorno de 13% no acumulado do ano, superando bastante o desempenho do Ibovespa, que foi de -9%”, escreveram os analistas da corretora.