Nesta semana do Dia da Criança, tirei alguns dias com meu filho de 8 anos. Viemos para o Litoral Norte, lugar que eu amo, onde passei grande parte da minha juventude. Nessas praias, o contato com a natureza sempre foi especial.
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Guardo na memória as caminhadas na praia, a natação até as ilhas, os mergulhos, o pôr do sol, o céu estrelado, a lua cheia, aquela sensação de paz, de conexão e de que tudo ia dar certo.
Na estrada ainda é possível ver muitos dos morros que desabaram no fatídico desastre do Carnaval de 2023. Meu filho me perguntou se aquilo poderia acontecer de novo… Respondo tentando mudar de assunto: “Ahhh… pode, mas é raro”. (será? Esse tipo de desastre não é mais tão raro).
Caminhando em direção à praia, vejo a seguinte frase pintada no muro: “Havia mais futuro no passado”. Meu coração ficou pequeno. Olho para meu filho correndo em direção ao mar e tento imaginar como será o futuro dele.
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Quando ligamos a TV à noite, só se falava do Furacão Milton que se aproximava da Flórida, no Estados Unidos. Minha irmã e meu sogro moram em Miami – o furacão não chegaria ali, mas meu filho quis ligar para todos e ter certeza de que estavam bem.
O Furacão Milton chegou na Florida 12 dias depois que o Furacão Helena passou e deixou a região devastada. Foi muito triste assistir ao meteorologista americano chorando ao falar do furacão que se aproximava.
Aqui no Brasil, neste ano assistimos às enchentes no Rio Grande do Sul – onde 2,3 milhões de pessoas foram afetadas. Recentemente o fogo atingiu a Amazônia, Pantanal, Cerrado, interior de São Paulo… Entre os dias 9 e 10 de setembro 60% do país estava coberto de fumaça.
Gastos com mudanças climáticas X custos das guerras
Além das mudanças climáticas, estamos em meio a duas guerras. Os gastos militares no mundo foram de US$ 2,43 trilhões em 2023. Segundo o Climate Policy Iniciative, os gastos climáticos em 2022 foram de US$ 1,3 trilhão mas seriam necessários US$ 10 trilhões por ano para atingirmos as metas do Acordo de Paris e manter a temperatura abaixo de 2C. Tudo indica que o mundo escolheu investir mais em guerra do que na transição climática.
Trabalho com gestão de patrimônio desde 2002. Na Wright Capital, nos últimos 10 anos viemos fazendo o possível para buscar alocações que alimentem um futuro melhor.
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Além de nos envolvermos com os gestores, investirmos em fundos de impacto socioambiental, fundos climáticos, ESG e outros, fazemos parte de inúmeros grupos para ajudar em mudanças regulatórias ou estruturais no mercado de capitais. É um trabalho intenso e cansativo – o que me dá força é a certeza de estar fazendo meu máximo para o futuro das próximas gerações.
Ainda encontro muitos que insistem em dizer que não existe mudança climática e outros que dizem que existe, mas não foi causada pelo homem e então não há nada a se fazer. Mas então os 600 cientistas envolvidos no IPCC (Painel Intergovernamental de Mudança do Clima) estão errados? Todos?
As queimadas que atingiram o interior do estado de São Paulo em agosto já provocaram prejuízo de R$ 1 bilhão de reais na agropecuária, segundo estimativa da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do estado. A seca e as queimadas atingem diversas regiões do Brasil já estão elevando o preço dos alimentos.
É difícil mensurar o efeito do atual cenário climático, mas plantações permanentes, como açúcar, café e laranja, e da região Sudeste e Centro-Oeste, serão as mais afetadas. Ou seja, o impacto climático vai afetar a inflação de alimentos e o bolso daqueles que menos tem.
Em setembro de 2015, o então governador do Banco de Inglaterra, Mark Carney, fez um discurso marcante sobre a “Tragédia do Horizonte”. Explicou que as alterações climáticas criam riscos tremendos para os mercados financeiros. As perdas estimadas são enormes.
Riscos climáticos e decisões de investimento
No entanto, como o prazo era muito longo, a maioria das empresas não priorizou grandes mudanças – já que estas teriam um custo muito alto no curto prazo. Nove anos depois, a “tragédia do horizonte” tornou-se um conceito central de grande parte do discurso sobre os riscos climáticos.
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Os riscos climáticos, como as respostas abruptas às exigências políticas e dos consumidores – ou as inevitáveis ondas de choque dos impactos climáticos físicos –, são muito mais relevantes para a economia e decisões empresariais hoje do que aquilo acontecerá em 2050.
As decisões de investimento tomadas agora criam e mantêm ativos reais que existirão em um mundo muito diferente daqui a uma década. Apesar dos progressos realizados desde 2015 na preparação das empresas para os riscos climáticos, as decisões empresariais são sustentadas por pressupostos econômicos e financeiros que ainda não refletem os riscos físicos previsíveis nem a transição para carbono zero.
Do ponto de vista financeiro, a pergunta é: seu portfolio é à prova de futuro? Você sabe se os títulos ou ações de empresas nas quais você esta colocando sua poupança estão expostas a riscos físico ou regulatórios? Essas empresas estão realizando as mudanças necessárias? Essas empresas vão existir daqui a 20, 30 anos?
Do ponto de vista humano, será que não precisamos ressignificar o que é importante? Nós fazemos parte da natureza, se a destruirmos, estamos destruindo nós mesmos. Será que isso ainda não esta claro?
De acordo com Ailton Krenak [mineiro que é líder indígena, ambientalista, filósofo, poeta e escritor], a separação das pessoas da mãe Terra é um processo de abstração civilizatória, na qual o consumo as leva ao impedimento de viver a verdadeira cidadania. É justamente isso que está criando falta de sentido na vida, retirando o prazer de viver, de dançar e de cantar, o que transformou a humanidade em “humanidade zumbi”. Por isso, ele diz que o que ele está fazendo naquele momento da conversa com as pessoas é “contar mais uma história”, para adiar o fim do mundo.
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