- O Banco Master entrou nos holofotes em meados de outubro, depois que uma longa reportagem da revista piauí se debruçou sobre a estratégia "excessivamente ousada" de expansão que levou o patrimônio líquido do banco de R$ 219 milhões para quase R$ 5 bilhões em 5 anos
- Os CDBs do Master são queridinhos do investidor pessoa física, por oferecerem uma das taxas mais elevadas do mercado; ativos chegam a 140% do CDI
- O E-Investidor conversou com especialistas para entender a situação, quais os riscos dos CDBs do Master e se, nesse contexto, seria necessário fazer algum ajuste na estratégia de renda fixa
Não faltavam motivos para o Banco Master celebrar os resultados operacionais de 2024. Em sua última demonstração financeira, referente ao primeiro semestre deste ano, a empresa revelou um salto no patrimônio líquido de R$ 219 milhões para quase R$ 5 bilhões em 5 anos. Em reflexo, a agência de classificação de risco Fitch revisou o grau da empresa e subiu nota em escala nacional de BBB(bra) para A-(bra).
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Nas últimas semanas, porém, o Master voltou para os holofotes sob uma ótica diferente. Uma reportagem publicada pela revista Piauí se debruçou nos detalhes da estratégia de crescimento e desencadeou dúvidas em relação à atuação do banco, que expandiu sua carteira de crédito de forma relevante nos últimos anos.
Procurado pela reportagem, o Master não se posicionou. Recentemente, em entrevista ao Broadcast, o CEO Daniel Vorcaro disse que o banco vem fazendo mudanças na governança e nos negócios para garantir a continuidade do crescimento do grupo, incluindo a criação de um comitê consultivo e a contratação da consultoria McKinsey.
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No mercado financeiro, a instituição é uma das principais emissoras de Certificado de Depósito Bancário (CDBs), e se tornou popular entre os investidores em função das altas taxas oferecidas. Enquanto títulos bancários emitidos por grandes bancos costumam pagar no máximo 100% do CDI, não é difícil encontrar nas corretoras CDBs do Master pagando bem mais.
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Um levantamento feito pela Quantum Finance no início de outubro, por exemplo, mostrou que a instituição oferecia retornos de 120% do CDI em CDBs pós-fixados com validade de 3 meses e de 24 meses; a maior taxa do mercado para ativos com esses prazos de vencimento. Em termos de comparação, o mesmo levantamento mostra que o maior retorno oferecido nas prateleiras para um CDB de 6 meses é de 109% do CDI, em um ativo emitido pelo Paraná Banco, também considerado “banco médio”.
O embróglio levantou dúvidas entre os investidores sobre eventuais riscos nos CDBs do Master, assim como as proteções oferecidas pelo Fundo Garantidor de Crédito (FGC), uma peça importante na indústria de ativos bancários. É ele que assegura a aplicação do seu dinheiro com a garantia de recuperação do patrimônio investido em caso de falência, intervenção ou liquidação extrajudicial da instituição financeira – até o limite de R$ 250 mil.
O E-Investidor conversou com especialistas para entender a situação a partir de três pontos: quais os riscos estão no radar, a visão do FGC e se, nesse contexto, seria necessário fazer algum ajuste na carteira de renda fixa.
Riscos no radar
As dúvidas e notícias envolvendo o crescimento rápido do Master o banco entrar no que Matheus Nascimento, analista da Levante Inside Corp, chama de “questão quase que moral”. Começa o burburinho no mercado e a credibilidade da instituição é questionada.
Ele diz que, até o final do ano passado, os dados disponíveis no Banco Central (BC) não mostravam nenhum problema na carteira do banco e que o Master tinha indicadores característicos de uma instituição S3, termo usado na segmentação do sistema financeiro nacional para dividir os bancos em 5 categorias – S5 (mais baixa) a S1 (mais alta) – a depender de seu porte e perfil de risco. “Os dados do balanço não refletiam um risco maior do que os pares, mas o Master estava em um movimento de fazer aquisições, comprando bancos menores com o objetivo de absorver a carteira de clientes e crescer. Com isso, os rumores também aumentaram”, destaca Nascimento.
A discussão entorno do Master tem a ver com a expansão de sua carteira de crédito: o banco bateu R$ 21 bilhões no primeiro semestre de 2024, com um aumento de 81% em relação ao mesmo período de 2023. Ao fazer isso, cresceu também o segmento mais arriscado de crédito. A carteira D-H do Master subiu de 5,7% para 7,4% nos primeiros seis meses deste ano.
O índice D-H mostra a qualidade da carteira dos empréstimos de um banco. Valores concedidos a bons pagadores são ranqueados como A, enquanto devedores de pior qualidade são nomeados H. Quando maior é o porcentual da carteira D-H em relação ao total, maior é a chance de inadimplência, por exemplo.
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Uma parcela relevante da carteira de crédito atual do Master consiste em títulos e créditos a receber. No geral, tratam-se de precatórios e direitos creditórios, ativos pagos pelo governo federal após processos judiciais, mas considerados arriscados devido a não previsibilidade de pagamentos. Isso torna o perfil a instituição mais arriscado e preocupa alguns agentes do mercado.
A Nord Investimentos publicou um material, ao final de outubro, com uma análise se os CDBs de 140% do CDI emitidos pelo banco eram considerados seguros e se valiam a pena. A avaliação da casa é de que, apesar de ter outros indicadores positivos, a expansão da carteira D-H torna os títulos do Master mais arriscados para o investidor. Mas essa não é a única preocupação, explica Marilia Fontes, sócia-fundadora da Nord Investimentos. “É um banco que opera ativos mais arriscados. Isso significa que, por representar cada vez mais da liquidez do FGC, está aumentando, junto, o risco do sistema.”
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O FGC viu nos últimos anos o crescimento dos bancos pequenos e médios no total de aplicações de sua cobertura. E o Master aparece como um dos protagonistas. Dados do Banco Central de junho mostram que o banco e suas controladas têm cerca de R$ 45,6 bilhões em depósitos bancários a prazo no mercado, a maioria em CDBs. O valor representa 42% da liquidez total do fundo garantidor, que está em R$ 107,8 bilhões segundo o balanço semestral do FGC.
O risco é a liquidez do FGC estar muito concentrada em emissões de um banco que tem uma carteira de crédito arriscada. Uma eventual derrapada no emissor, por exemplo, poderia levar a uma crise no segurador; uma reação em cadeia, segundo Fontes.
A segurança do FGC
Uma das figuras principais quando o assunto diz respeito a investimentos em títulos de renda fixa emitidos por bancos pequenos é o FGC. Na prática, a proteção oferecida pela instituição para aportes até R$ 250 mil passou a ser vista como “muleta” para investidores comprarem ativos sem antes avaliar bem os riscos envolvidos. Muitas vezes, esse comportamento vem das próprias distribuidoras dos produtos.
Esta reportagem do Estadão mostra que até o BC tem se preocupado com o aumento expressivo da captação de bancos menores, via CDBs, apoiado na salvaguarda do FGC. Para a instituição, trata-se de um movimento natural, fruto da agenda do BC voltada à desconcentração do setor financeiro.
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O FGC não comenta casos específicos de associadas, mas, em entrevista ao E-Investidor, explicou que vem se adaptando a esse contexto de expansão das instituições menores com análise de risco de crédito, contato direto com os bancos e redimensionando as contribuições do fundo em relação ao seu “tamanho ótimo”. E que não vê um risco sistêmico no radar. “O FGC tem liquidez suficiente para eventos de crise bastante severos. Na sua história de mais de 40 liquidações de bancos, o FGC nunca deixou de pagar ninguém”, diz Daniel Lima, diretor-executivo da instituição. Ainda assim, investir em um CDB ou em qualquer outro ativo de cobertura do FGC pensando apenas na proteção está longe de ser o ideal também na visão da instituição.
Investidor do CDB do Master precisa ajustar a carteira?
Para quem já está investido e está acompanhando com receio a discussão sobre a instituição, os especialistas recomendam calma. Sair vendendo os ativos de cara não é a melhor opção, já que as corretoras cobram um desconto elevado para revender o título no mercado e o investidor pode acabar no prejuízo.
Para Matheus Nascimento, da Levante, é importante tirar o “risco moral” da jogada para entender por que um banco médio oferece taxas superiores à média do mercado. Ele explica que o extra oferecido por uma instituição em relação ao patamar atual da taxa de juros futura corresponde ao prêmio de risco de se investir naquele ativo. Quanto maior, mais arriscado o negócio é. “É natural que os grandes bancos não tenham um prêmio de risco tão gordo. Se o investidor olhar para essa métrica, já consegue entender se está em um ativo de risco maior”, destaca.
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Segundo os especialistas, antes de movimentar a sua carteira, dois pontos precisam ser analisados. O primeiro deles diz respeito ao prazo de vencimento dos ativos. “Se o título já está próximo do vencimento, o risco é muito menor, porque consigo ter mais de certeza que não vai ter uma crise no sistema financeiro esse ano do que daqui a três anos, por exemplo. Se é um CDB que está para vencer, fico mais tranquila e mantenho a posição”, explica Fontes, da Nord.
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A outra questão importante está relacionada à concentração da carteira em um único ativo – sendo ele o CDB do Master ou não. Ainda que o investimento total esteja dentro dos R$ 250 mil de cobertura do FGC, o entendimento é que, em uma eventual crise, o investidor ficaria com a maior parte de seus valores comprometidos. Neste caso, a recomendação é diluir um pouco a posição. “O erro mais comum é ver uma taxa alta e alocar todo o capital nela, o que, apesar de aumentar o retorno, aumenta o risco na carteira também”, explica Idean Alves. “Se o tamanho da alocação estiver desbalanceado, pode-se avaliar uma redução da posição, até para se sentir mais confortável com o portfólio.”
Como saber se um CDB é seguro
Como mostramos nesta outra reportagem, a rentabilidade não deve ser o único ponto a ser levado em consideração antes de investir em um CDB. O investidor precisa se atentar a alguns detalhes: tipo de indexador, prazo de vencimento e a saúde financeira da instituição emissora. No geral, quanto maior a taxa oferecida, maior o risco daquela instituição emissora.
A recomendação é não ultrapassar o limite de R$ 250 mil que FGC oferece em cada instituição financeira, com cobertura máxima de R$ 1 milhão por CPF. Assim, em caso de insolvência do emissor, o investidor recebe de volta o valor aplicado.
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Mas há riscos que essa proteção não soluciona totalmente. Se for necessário acionar a cobertura do FGC, o processo de recuperação dos investimentos não ocorre imediatamente, podendo levar até meses, um período de estresse em que não haverá rendimento. Por isso, antes de apostar todas as fichas no FGC, o investidor precisa estar atento à saúde financeira da instituição emissora do CDB.
Qual a margem naquela diferença de juros pagos e captados, como está a evolução de suas despesas e sua margem líquida (receita menos seus custos) e qual a evolução de seu lucro líquido ao longo dos anos. Ainda há questões relacionadas ao grau de exposição a risco do capital proprietário do banco, o chamado Índice de Basileia (medida regulatória destinada a garantir a solidez financeira das instituições bancárias).
Não é uma análise simples para o investidor pessoa física destrinchar por conta própria. Por isso, observar as notas de crédito emitidas pelas agências de rating, como Fitch Ratings, Moody’s e Standard & Poor’s (S&P), pode ser um bom indicador. Essas informações ficam disponíveis no site das agências e, em alguns casos, são divulgadas pelos próprios bancos em seus sites de Relações com Investidores (RI). Há ainda outras plataformas, como o site Banco Data, que ajuda investidores de renda fixa a conhecer melhor a saúde financeira das instituições bancárias por trás dos CDBs, seja do banco Master ou de outros bancos médios.