O ano de 2024 teve seus desafios macroeconômicos, como a escalada dos juros e do dólar, mas isso não foi impeditivo para que algumas empresas fossem mais generosas com os seus acionistas, aumentando o valor dos dividendos distribuídos.
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Olhando para as empresas que integram o Ibovespa, principal índice da B3, o cenário foi morno. Segundo levantamento da Elos Ayta Consultoria para o E-investidor, de 86 ações que integram o índice, 36 aumentaram os dividendos por ação distribuídos aos investidores em 2024, com altas que chegam até R$ 2,83 por ação.
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Na outra ponta, 37 companhias apresentaram queda nos dividendos por ação, com recuo de até R$ 2,60 por papel.
Houve também quem não pagou absolutamente nada nem em 2023 e nem em 2024, totalizando 12 ações. Enquanto apenas uma ação, a Yduqs (YDUQ3), manteve seus dividendos estáveis na comparação anual.
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O levantamento observou os dividendos por ação informados pelas empresas à B3 até o dia 16 de dezembro. O que significa que os proventos já passaram da ‘data ex’, dia seguinte à data limite para garantir o provento – contudo, alguns dividendos podem ainda não ter caído na conta do investidor. Vale lembrar que as companhias ainda podem anunciar novos pagamentos até o dia 30.
Nesta reportagem, apresentaremos as 10 maiores altas nos dividendos por ação do Ibovespa. Para trazer um cenário mais realista, o E-investidor considerou no estudo apenas companhias que tenham efetivamente remunerado os seus investidores no ano de 2023 e em 2024. Veja a seguir:
Fonte: Elos Ayta Consultoria, dados até 16/12
As ações que mais aumentaram dividendos em 2024
JBS (JBSS3)
Entre as ações que surpreenderam positivamente se destaca o frigorífico JBS (JBSS3), que aumentou em R$ 2 o valor por ação distribuído aos acionistas. Em 2023, a companhia pagou R$ 1 em dividendos, enquanto em 2024 o valor destinado aos investidores era de R$ 3 por papel até o dia 16 de dezembro.
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Em relação ao dividend yield (retorno em dividendos), o ano de 2024 também foi positivo, com a JBS entregando um yield de 12,65% no acumulado do ano, bem acima do dividend yield de 2023 de 4,55%.
Quem investiu na JBS em 2024 e reinvestiu os dividendos recebidos ganhou dinheiro. O retorno total considerando valorização e dividendos da companhia foi de 80,76% neste ano.
Para Regis Chinchila, head de research da Terra Investimentos, o que impulsionou o aumento dos dividendos da JBS foi o crescimento de 121% no Ebitda (Lucros Antes de Juros, Impostos, Depreciação e Amortização) da empresa, puxado principalmente pelos segmentos de aves e suínos. Os dados são do 3° trimestre de 2024, em comparação com o mesmo período em 2023.
Além disso, a JBS teve redução da sua dívida líquida em 9% e um aumento impressionante de 570% no seu lucro líquido no 3° trimestre. “Esses fatores fortaleceram a geração de caixa, permitindo a empresa distribuir dividendos mais elevados. O bom desempenho financeiro geral da JBS, aliado a sólida posição de caixa, permitiu a empresa manter uma política de dividendos generosa”, afirma Chinchila.
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A expectativa do analista da Terra é de que os dividendos da JBS se mantenham elevados em 2025, até mesmo com possibilidade de aumento no valor por ação.
Para ele, a redução da dívida líquida e a recuperação dos mercados internacionais indicam que a companhia pode continuar distribuindo dividendos robustos, mesmo com juros altos e inflação persistente. Segundo Chinchila, a JBS se beneficiará da diversificação dos seus negócios, ajudando a mitigar riscos externos.
Com um fluxo de caixa livre estimado em R$ 12,3 bilhões, Chinchila enxerga que o dividend yield da JBS em 2025 deve ficar no intervalo entre 5% e 6%.
Marco Saravalle, analista CNPI-P e sócio-fundador da MSX Invest, lembra que a JBS tem receita dolarizada, portanto, se beneficia com a alta da moeda americana. Projeções do Boletim Focus enxergam que o dólar deve fechar 2025 no patamar de R$ 5,85.
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O efeito imediato é mais geração de caixa para a JBS e, em consequência, mais dividendos pelo menos no curto prazo. Mas Saravalle faz a ressalva que o dividend yield – que tem relação com o preço da ação – pode cair, justamente por conta da valorização das ações. No entanto, o investidor não deve se preocupar porque estaria ganhando também com a alta dos papéis JBSS3. Por este motivo, Saravalle espera um dividend yield de 4% para a JBS em 2025.
Petrorecôncavo (RECV3)
A petroleira Petrorecôncavo (RECV3) também teve uma trajetória bem-sucedida e ao longo de 2024 muitos analistas apostavam que seria capaz de destronar a Petrobras no pagamento de dividendos no médio prazo.
A companhia que remunerou os seus acionistas com dividendos de R$ 0,99 por ação em 2023 saltou para R$ 2,75 em 2024. Um crescimento de R$ 1,76 por ação. O dividend yield também se tornou mais expressivo, avançando de 2,99% para 13,57% no retorno em dividendos.
Pedro Carvalho, analista da Trígono, explica que a Petrorecôncavo vinha de um período de integração de aquisição de campos de petróleo e de construção da sua frota de equipamentos e sondas, que demandaram investimentos pesados. Como essa fase chegou ao fim, a petroleira conseguiu finalmente gerar um fluxo de caixa operacional forte e, dado o seu endividamento confortável, teve um espaço maior para pagar dividendos. Inclusive, ele destaca que o caixa atual da empresa é capaz de cobrir todas as obrigações até 2029.
Com isso, o analista da Trígono segue otimista quanto ao pagamento de dividendos em 2025. Ele destaca que a companhia vai aumentar a sua capacidade de produção, que ficou parada em 26 mil barris por dia em 2024. O câmbio também deve fortalecer os ganhos da empresa e amenizar efeitos de uma possível queda no petróleo brent.
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Renato Reis, analista da Blue3 Research, cita também que a Petrorecôncavo tinha um contrato com a Petrobras protegido por hedge, que implicava que a petroleira deveria vender barril de petróleo para Petrobras com travas no preço em torno de US$ 60.
Isso reduzia os ganhos da Petrorecôncavo, porque o barril do petróleo chegou a negociar em patamares de até US$ 90. O impacto destes contratos foi de quase R$ 120 milhões no resultado da Petrorecôncavo. Mas a boa notícia é que os contratos encerram em 2024, permitindo com que a companhia negocie a preços livres em 2025 e aumente a sua lucratividade, fortalecendo o pagamento de dividendos.
Carvalho revela que há, contudo, alguns investimentos que a Petrorecôncavo precisará fazer nos próximos 3 anos, como a Unidade de Processamento de Gás Natural (UPGN) Miranga, que terá um custo de US$ 60 milhões, mas que favorecerá o processamento de gás e implicará em redução de custos.
Fora esse investimento e enquanto não tiver campos maduros de petróleo para comprar, Reis enxerga que a Petrorecôncavo seguirá pagando dividendos elevados. A projeção para 2025 é de um dividendo por ação entre R$ 1,80 e R$ 2, que seria equivalente a um dividend yield próximo a 13%.
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Mas, se houver novas aquisições de campos de petróleo, as distribuições poderiam cair para o patamar de 4,5%, na visão de Reis.
Outro que é otimista com a ação RECV3 é Júlio Borba, analista da Benndorf Research. Ele espera que a Petrorecôncavo distribua dividendos de R$ 2,10 em 2025, o que representa um dividend yield de 13%.
Itaú (ITUB4)
O Itaú (ITUB4) estava pagando poucos dividendos na pandemia, em função de regras para os bancos e investimentos em tecnologia, mas para a felicidade dos investidores retomou o ritmo de bons pagamentos em 2024, desafiando até mesmo o Banco do Brasil (BBAS3) que até então era líder absoluto nas distribuições.
De R$ 1,26 distribuídos em 2023, o Itaú saltou para R$ 2,41 por ação em 2024. O aumento por papel foi de R$ 1,16. O dividend yield também avançou de 5,03% para 7,37%, na comparação anual.
Bruno Oliveira, analista CNPI do Projeto Vida de Acionista, destaca que o aumento dos proventos no Itaú foi principalmente pelo resultado sólido da empresa e a capacidade de ser resiliente à economia brasileira. “Essa resiliência se traduz em adaptação a variações do ciclo econômico e a condições de mercado, mostrando excelente controle da sua inadimplência e uma capacidade relevante de rentabilizar o dinheiro”, diz. A prova disso, segundo Oliveira, é que até o 3° trimestre, o Retorno sobre Patrimônio Líquido (ROE) do Itaú era de 22,7%.
Para 2025, Oliveira enxerga um cenário desafiador, com a alta da Selic, o que pode acabar diminuindo a procura das pessoas por financiamentos e empréstimos. Embora a crença seja que os bancos ganhem mais com taxas diante dos juros elevados, Oliveira adverte que nem sempre o spread (diferença entre o dinheiro emprestado e captado) pode ser vantajoso.
Apesar disso, se existir alguma diminuição nos dividendos, Oliveira acredita que seja mínima. O analista espera que, em 2025, o Itaú distribua R$ 1,95 por ação, equivalente a um dividend yield de 7,19%.
Já Milton Rabelo, analista da VG Research, tem uma visão mais otimista. Ele afirma que o Itaú possui um sólido índice de capital principal de 13,7%, acima dos seus concorrentes, e que isso gera um excesso de recursos que a gestão do banco já deixou claro pretende carregar no seu balanço.
“Diante desse capital, o próprio CEO, Milton Maluhy, já confirmou o pagamento de dividendos extraordinários para 2025, ainda que o volume dessa distribuição não esteja definido. Dessa forma, foram os pagamentos extraordinários que estão ocorrendo desde o ano passado que têm impulsionado os dividendos do Itaú”, avalia Rabelo.
Com a expectativa de distribuições extraordinárias em 2025, que podem ocorrer no começo do ano, Rabelo enxerga que o Itaú distribua R$ 3 de dividendos por ação no próximo ano, com um dividend yield de 9,5%.
Allos (ALOS3)
Não é de hoje que a empresa de shoppings Allos (ALOS3) vem pregando que quer remunerar melhor os acionistas e com mais recorrência. Desde outubro, a companhia começou a pagar dividendos mensais e tem pagamentos programados nesse formato até março de 2025. Mas muitos analistas, já vislumbram a possibilidade de que os dividendos mensais se estendam até dezembro do próximo ano.
Na Allos, o dividendo por ação saiu de R$ 0,52 em 2023 para R$ 1,41 em 2024, até o fechamento de 16 de dezembro. Neste cálculo não estão inclusos os novos anúncios de proventos na ordem de R$ 153 milhões, com data-ex a partir de 23 de dezembro.
Regis Chinchila, da Terra Investimentos, aponta que o aumento dos dividendos da Allos em 2024 foi impulsionado pela sólida geração de caixa operacional, com destaque para crescimento de 10,9% na receita líquida e 27,7% no Fluxo de caixa vindo das operações.
Favoreceram também os desinvestimentos estratégicos, que totalizaram R$ 579,2 milhões, permitindo uma redução da alavancagem financeira e direcionar mais recursos para a distribuição de dividendos aos acionistas. “Esses fatores, aliados à estrutura financeira otimizada, facilitaram a política de proventos elevados, mesmo com o cenário econômico desafiador”, comenta.
Para 2025, contudo, Chinchila não enxerga um crescimento dos dividendos da Allos, mas sim uma manutenção, tanto no dividendo por ação quanto no dividend yield. “A solidez financeira e os resultados operacionais sugerem que os dividendos por ação provavelmente continuarão robustos, a menos que um choque econômico significativo ou mudanças no mercado imobiliário afetem a geração de caixa”, pontua.
Chinchila também vislumbra que o pagamento mensal de dividendos deve continuar, embora a empresa fale disso mais como uma projeção e não tenha alterado formalmente a sua política de dividendos.
Max Bohm, estrategista de ações da Nomos, acredita que ainda há espaço para dividendos da Allos em 2025, porque a companhia deve continuar desinvestindo em shoppings, deixando mais folga no seu caixa para remunerar acionistas.
O dividend yield projetado por Bohm para ação é de 4,5%. Apesar de ser interessante para o histórico da empresa, o analista acredita que existem melhores opções para quem busca dividendos na bolsa.
Eztec (EZTC3)
Parece um passado distante, mas até 2017 a Eztec (EZTC3) até era reconhecida como uma boa pagadora de proventos. Depois, a companhia enfrentou alguns desafios na sua operação e diminuiu a remuneração dos acionistas. Mas em 2024 houve uma recuperação.
Dos pífios R$ 0,20 centavos que a empresa estava distribuindo em 2023, passou para R$ 1,08 por ação em 2024, surpreendendo os investidores.
Segundo Rafael Passos, sócio da Ajax Asset, alguns fatores contribuíram para essa melhora operacional. Um deles foi uma estratégia comercial mais agressiva por parte da Eztec, que atua no segmento de alta renda, o que ajudou a reduzir os estoques de imóveis e incrementar os ganhos.
Mas a empresa também foi muito eficaz na venda de novos lançamentos. Passos cita como exemplo o Lindenberg Ibirapuera e o Lindenberg Alto das Nações que deram um bom impulso para a receita da companhia.
Além da melhora dos lucros, houve uma redução nos custos fixos da Eztec, o que abriu espaço para dividendos mais gordos.
Passos destaca que a companhia deve continuar fazendo lançamentos em 2025 e, como possui endividamento controlado, a expectativa é de que os dividendos fiquem entre 10% e 13% em 2025. Mas a preferência do analista é por construtoras de baixa renda ou focadas no programa Minha Casa Minha Vida como a Direcional (DIRR3), que devem entregar dividendos robustos e resultados mais resilientes ao cenário macro desafiador.
Guilherme La Vega, analista independente da Arkad Invest, espera um dividend yield de 8% para Eztec em 2025, um dividendo por ação estimado de R$ 0,89. Mesmo com a leve redução, ele acredita que os dividendos devem ser destaque no segmento imobiliário, ficando bem acima dos valores distribuídos em 2022 e 2023.
“Espero uma leve redução, mas nada significativo que comprometa a atratividade. Uma queda drástica só ocorreria diante de uma mudança muito abrupta no cenário de mercado”, afirma La Vega.
Já Fábio Sobreira, sócio e analista da Rocha Opções de Investimentos, destaca que a Eztec teve um aumento de 50% no seu lucro por ação em 2024 e um salto no seu payout (parcela do lucro destinada a proventos) de 18,91% para 66,19%, o que favoreceu o pagamento de dividendos.
“Como o lucro por ação aumentou em 2024, a empresa tende a distribuir ainda mais dividendos em 2025”, diz Sobreira, que enxerga a companhia pagando R$ 1,63 por ação em 2025, com um dividend yield de 14%.
Apesar da gordura dos proventos, acha a alternativa arriscada, porque diante das taxa de juros, a venda de imóveis pode cair em 2025 e comprometer a distribuição de dividendos aos acionistas.