

Temidas por alguns investidores e desejadas por outros, as empresas de commodities não são uma escolha óbvia quando o assunto é montar uma carteira de dividendos. O motivo é que para receber renda passiva, a prioridade é previsibilidade, e, nesse aspecto, o setor costuma ser muito volátil.
Apesar disso é inegável que os dividendos são atrativos, com muitas companhias do segmento na lista de maiores pagadoras do Brasil e do mundo. Em 2024, por exemplo, entre as 10 principais vacas leiteiras da bolsa brasileira figuraram nomes como Marfrig (MRFG3) – embora fruto de distribuições não recorrentes – Petrobras (PETR4), PetroRecôncavo (RECV3) e JBS (JBSS3).
Para 2025, mesmo com o cenário macroeconômico comprometido, a guerra comercial e o risco de recessão global, a perspectiva ainda é animadora. Entre as ações de commodities preferidas dos analistas consultados pelo E-investidor, é possível obter dividend yield (retorno em dividendos) de até 20%.
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Mas como escolher uma empresa de commodities sem entrar em uma cilada? Quais são as mais indicadas para dividendos e as mais voláteis? Explicamos tudo aqui nesta reportagem!
Veja também: Como escolher uma ação de commodities para dividendos e fazer da volatilidade sua amiga
Commodities é um bom negócio para 2025?
Apesar da desaceleração do dólar nos últimos meses – a moeda americana acumula queda de 5,43% em 2025 até o dia 17 de abril – analistas ainda enxergam a moeda estrangeira forte no decorrer deste ano, o que deve impulsionar a geração de caixa das empresas de commodities e o pagamento de dividendos. Prova disso é que o efeito tarifaço, apesar da forte volatilidade, fez o dólar valorizar 2,87% desde 2 de abril (quando Trump anunciou as taxas para os países) até o dia 17.
No último Boletim Focus do Banco Central, que reúne projeções de mais de 100 instituições financeiras, as estimativas para o câmbio estão em R$ 5,90 para o final de 2025 e R$ 5,97 em 2026.
“O patamar do dólar ainda é alto para 2025, o que vai puxar o crescimento da receita do setor, mesmo com o preço de algumas commodities um pouco baixo. Mineração, siderurgia, celulose, proteínas e petróleo tendem a se destacar com fundamentos positivos”, avalia Hugo Queiroz, analista e sócio da L4 Capital.
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Não é o único fator que favorece, em alguns segmentos, como mineração, o impulso deve vir da China, com o minério de ferro operando a partir de US$ 97 na Bolsa de Dalian (China), mas podendo superar os US$ 100 a tonelada. Diante disso, mineradoras como Vale (VALE3) e CSN Mineração (CMIN3) seriam beneficiadas.
João Ascoli, especialista em mercado internacional e sócio da Sphera Wealth, afirma que a China busca um crescimento econômico de 5% neste ano e adota uma postura protecionista. Desta forma, é esperado que o país asiático implemente estímulos fiscais que impulsionem os preços do minério de ferro. “Em um mercado mais aberto, o minério teria maior força, mas diante de um cenário protecionista, os estímulos ajudam a determinar um piso para o preço da commodity, que deve variar entre US$ 90 e US$ 100”, destaca.
É claro que também existem incertezas. Bruno Oliveira, analista do Vida de Acionista, lembra que é o primeiro ano do governo Donald Trump e, no Brasil, um aquecimento para a corrida eleitoral de 2026. Fatores que vão agregar muita volatilidade no mercado e influenciar também as companhias de commodities. Mas como explicaremos nesta reportagem, volatilidade pode ser oportunidade.
As melhores de commodities para dividendos em 2025
Nas commodities, é possível encontrar uns seis segmentos: mineração, siderurgia, petróleo e gás, papel e celulose, carnes e alimentos e agronegócio. Analistas consultados pela reportagem apontam quais ações lideram em cada um para dividendos em 2025. As que receberam mais recomendações foram Vale (VALE3) e PetroReconcavo (RECV3).
Ação | Setor | Dividend yield projetado para 2025 | Preço-teto de compra | Quem indica |
Vale (VALE3) | Mineração | 8% até 9,5% | R$ 71 | Nord Research, Ativa Investimentos, Sphera Wealth |
Petrorecôncavo (RECV3) | Petróleo e gás | 10% até 15% | R$ 19 até R$ 26 | Nord Research, Meraki Capital, VG Research |
Petrobras (PETR4) | Petróleo e gás | 12% até 14% | R$ 38 até R$ 42,84 | Meraki Capital, VG Research |
CSN Mineração (CMIN3) | Mineração | 9,73% até 10,5% | R$ 6,11 | Sphera Wealth, Vida de Acionista |
Kepler Weber (KEPL3) | Agronegócio | 9,50% | R$ 9,50 | Nord Research |
Gerdau (GGBR4) | Siderurgia | 5,3% | — | Ativa Investimentos |
Marfrig (MRFG3) | Carnes e alimentos | 17% até 20% | R$ 30 | L4 Capital |
JBS (JBSS3) | Carnes e alimentos | 12% até 15% | R$ 49 | L4 Capital |
Minerva (BEEF3) | Carnes e alimentos | 5% até 7% | R$ 12 | L4 Capital |
Irani (RANI3) | Papel e celulose | 8,79% | R$ 7,88 | Vida de Acionista |
Fonte: levantamento E-investidor com analistas/ OBS: o dividend yield mínimo recomendado para identificar boas pagadoras é de 6%/ preço-teto: preço máximo recomendado para comprar uma ação e garantir um bom dividend yield
Mineração
Vale (VALE3)
Victor Bueno, sócio e analista da Nord Research, explica que a Vale é resiliente na produção de minério de ferro, apesar das quedas apresentadas no seu relatório de vendas e produção do 1° trimestre de 2025, divulgado na semana passada. A perspectiva de produção da commodity para os próximos trimestres é otimista, o que deve impactar positivamente a receita e geração de caixa, com bons retornos para os investidores.
Na visão dele, uma das vantagens competitivas da empresa é a qualidade do minério de ferro, com 65% de grau de pureza, melhor do que pares internacionais. “Por conta dessa qualidade, consegue praticar preços melhores internacionalmente e isso traz resiliência para a empresa diante de oscilações bruscas do preço do minério”, afirma o analista. Inclusive, mesmo em momentos desafiadores, no 1°tri 25 a Vale se destacou por manter a qualidade do minério nas vendas.
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Além da qualidade, Ascoli, da Sphera Wealth, destaca que as vantagens competitivas da Vale são o frete e o controle de custos. Atualmente, a produção de cada tonelada de minério varia entre US$ 21 e US$ 23. “Nos últimos três trimestres, a Vale apresentou um guidance (projeção) de custo e cumpriu com aquilo, o que favoreceu a margem de lucro”, lembra.
A Vale também possui uma política de remuneração previsível de 30% do Ebitda ajustado (lucro antes dos juros, impostos, depreciação e amortização) menos o investimento corrente. A mineradora paga proventos semestrais, em março e setembro.
A mineradora está com um processo de recompra de ações ativo o que deve elevar o dividend yield da empresa.
E o tarifaço? Embora a guerra comercial traga forte volatilidade para o minério e as ações da Vale, Ascoli lembra que é importante a empresa ter um bom controle de custos para encarar as flutuações de preço da commodity. Mas, segundo o especialista, a companhia “está fazendo bem o dever de casa”.
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Já Bueno acredita que se o minério negociar entre US$ 100 e US$ 110 a tonelada em 2025, não teremos riscos para a geração de caixa e os dividendos, apesar da guerra comercial.
CSN Mineração (CMIN3)
Com dividendos mais modestos do que a Vale, a CSN Mineração vem ganhando espaço. Oliveira, do Vida de Acionista, destaca que companhia tem uma estrutura de capital boa e conservadora, com dívida líquida negativa de R$ 4,64 bilhões, o que se traduz em caixa. Além disso, a empresa tem planos de produzir o minério de ferro com maior pureza do mundo nos próximos anos.
Em relação a dividendos, a CSN Mineração é boa pagadora. Nos últimos anos, o payout (parcela do lucro destinada a proventos) foi superior a 100% sem comprometer a perenidade do negócio. “O controlador, CSN, é ávido por proventos porque possui investimentos em andamento que demandam de fluxo de caixa. Diante disso, não descarto proventos extraordinários da CSN Mineração”, afirma Oliveira. Em valores líquidos por ação, ele espera pelo menos dividendos de R$ 0,55 em 2025.
Os especialistas destacam que a CSN Mineração está mais barata do que a Vale, oferecendo mais espaço para valorização e dividendos em 2025.
E o tarifaço?
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Em relação à guerra comercial, Oliveira ainda não enxerga impactos consistentes. Ele acredita que apesar da CSN Mineração exportar minério para a China, o que poderia dar espaço para ampliar oportunidades diante da guerra comercial, é cedo para concluir que a empresa será beneficiada. Para o analista, não há garantias de que mineradoras brasileiras serão favorecidas. Portanto, ainda não existem mudanças nos dividendos.
Petróleo e gás
Petrobras (PETR4)
É impossível falar de petróleo e não citar a Petrobras (PETR4), que nos últimos cinco anos tem remunerado bem os seus acionistas. Gustavo Poladian, sócio e analista da Meraki Capital, defende que a Petrobras continuará sendo uma boa pagadora de dividendos por conta do crescimento na exploração e produção em campos mais rentáveis, como Búzios. “Para 2025, o dividendo será ajudado pelo câmbio e aumento da produção entre 3% e 4%, com destaque para o pré-sal que tem o menor custo de produção”, diz. Entre os riscos, cita a possibilidade do preço do petróleo brent ser menor do que em 2024. O mercado trabalha com um brent em US$ 70 o barril.
Poladian lembra que a estatal antecipou investimentos em Búzios, para evitar atrasos no projeto, o que reduziu o caixa da empresa, mas que deve minimizar investimentos em 2025. “O investimento (capex) deve ser menor do que o projetado na faixa inferior das estimativas, já que os cálculos utilizaram uma taxa de câmbio de R$ 5, e não há espaço para repetir o movimento de antecipação de 2024”, completa.
Para Poladian, com dividendos regulares a Petrobras entrega 12% de dividend yield este ano. Para ter dividendos extraordinários, e elevar o dividend yield até 15%, o analista reforça que o petróleo brent deveria estar negociando no patamar de US$ 75 até dezembro.
Ilan Arbetman, analista da Ativa Investimentos, tem certo receio com a estatal e alerta que o investidor precisa ficar atento ao plano de investimentos, que pode pressionar os dividendos extraordinários no futuro. “Esperávamos investimentos de US$ 14,5 bilhões e foram US$ 16,5 bilhões em 2024. É importante ficar de olho na execução desse capex para evitar frustrações com proventos”, aconselha.
PetroReconcavo (RECV3)
Outra favorita do segmento é a PetroReconcavo (RECV3), que trabalha com campos de petróleo maduros, revitalizando e alongando a vida útil deles, e é a mais robusta e a que menos investe em crescimento entre as petroleiras menores.
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Lucas Lima, analista-chefe da VG Research, destaca que a PetroReconcavo vem conseguindo uma certa estabilidade operacional, gerando caixa robusto, que em 2024 chegou a R$ 1 bilhão. Mas há riscos, como o fato da companhia não possuir uma política formal de proventos, portanto, pode mudar a forma como remunera os acionistas a qualquer momento, direcionando recursos para fusões e aquisições e reduzindo os dividendos, observa Lima.
Poladian lembra que a PetroReconcavo está avaliando ativos da Brava na Bahia e, a depender do desfecho da negociação, pode vir a reduzir o provento para este ano. Ainda assim, a visão do mercado no geral para PetroReconcavo ainda é positiva, com possibilidade de ganhos em valorização e dividendos para o investidor em 2025.
E o tarifaço? Para Petrorecôncavo, Lima reconhece que uma recessão global pode afetar o caixa e os dividendos. Mas enquanto o petróleo estiver negociando próximo de US$ 60, o dividend yield ainda segue atrativo, próximo a 10%, por conta do baixo endividamento e custo de produção de apenas US$ 14,5 da empresa.
Na Petrobras, o cenário é diverso. Poladian explica que com o petróleo Brent em US$ 65, apenas dividendos ordinários serão mantidos. A partir de US$ 75 é possível vislumbrar distribuições extraordinárias.
Siderurgia
Em siderurgia, a preferência de Arbetman é pela Gerdau (GGBR4), que tem forte exposição ao mercado norte-americano. Apesar do dividend yield ser moderado, ele considera que a empresa é a melhor opção do segmento.
Ele destaca que concorrentes como CSN (CSNA3) e Usiminas (USIM5) têm sido prejudicadas pela dinâmica de ações planos, que vem sendo afetada pela importação de aço chinês.
Carnes e alimentos
Já em carnes e alimentos, as companhias são ainda mais voláteis e é preciso ter muito cuidado de colocar uma na carteira de dividendos. Mas, diante da ressalva, Queiroz, da L4 Capital, destaca oportunidade em três companhias. Para o curto e médio prazo, a favorita é a Marfrig (MRFG3), empresa de frigoríficos que tem 50,49% de participação na BRF (BRFS3). Queiroz enxerga a companhia com capacidade de entregar até 20% de dividendos, por melhorias nas suas margens de lucro, caixa elevado e impulsionada pela BRF.
Ele também aponta a ação Marfrig como barata, negociando a 4,69 EV/Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização). Em 2024, a companhia foi a maior pagadora de dividendos da bolsa, com um dividend yield de 29,21% e R$ 2,83 por ação pagos. Mas muitos analistas alertaram sobre o fato de não ser uma distribuição recorrente, dado que a companhia não remunerou seus investidores em 2020 e 2023.
Como segunda alternativa, Queiroz indica a JBS (JBSS3), que pode entregar dividend yield de até 15% neste ano, favorecida também pela listagem na bolsa de Nova York, previsto para acontecer até final do ano. “Isso vai trazer capital novo, melhorias no braço Swift nos Estados Unidos, fortalecendo geração de caixa. Há possibilidades de dividendos adicionais”, comenta.
Menos atrativa atualmente, mas uma opção para o longo prazo, Queiroz cita também a Minerva (BEEF3), que precisa reduzir sua dívida inicialmente para pagar dividendos mais atrativos.
E o tarifaço?
Queiroz aponta que as três empresas estão bem posicionadas para seguir gerando receita e caixa, mesmo que isso implique exportar menos para os Estados Unidos e começar a vender mais para outros países como a China. Entre as que mais se beneficiam de o Brasil estreitar laços com o país asiático são Minerva e JBS, que já vendem carne bovina para a China. Mas, segundo o analista, o impacto seria mais na valorização das ações e não necessariamente nos dividendos.
Qual é a volatilidade destas ações recomendadas?
Levantamento de Filipe Ferreira, diretor de negócios da Comdinheiro/Nelogica, apresenta como estas ações recomendadas remuneraram os seus investidores no último ano e na mediana dos últimos cinco anos ou desde a aberta de capital para as novatas. Também foi apresentada a volatilidade nos últimos 12 meses – quanto maior o número, mais oscila a ação. Confira abaixo:
Ação | Dividend yield últimos 12 meses | Mediana de dividend yield 5 anos | Volatilidade em 12 meses |
Vale (VALE3) | 8,17% | 8,32% | 24,47% |
Petrorecôncavo (RECV3) | 14,24% | 2,66% | 34,36% |
Petrobras (PETR4) | 22,31% | 24,31% | 24,20% |
CSN Mineração (CMIN3) | 11,93% | 11,93% | 42,49% |
Kepler Weber (KEPL3) | 9,41% | 7,58% | 32,82% |
Gerdau (GGBR4) | 4,20% | 6,14% | 30,28% |
Marfrig (MRFG3) | 14,30% | 14,30% | 46,33% |
JBS (JBSS3) | 8,05% | 6,65% | 36,76% |
Minerva (BEEF3) | 0% | 4,07% | 44,65% |
Irani (RANI3) | 8,24% | 8,23% | 26,37% |
Fonte: Comdinheiro/Nelogica, dados até 17 de abril
OBS: o dividend yield mínimo recomendado para identificar boas pagadoras é de 6%