Contrariando as expectativas mais pessimistas que ditaram a virada do ano, o Ibovespa encerrou o primeiro semestre de 2025 nas máximas. Poucos dias depois de cravar uma valorização acima de 15% nos primeiros seis meses do ano, o índice renovou o recorde ao encerrar o dia 3 de julho aos 140,9 mil pontos – naquele pregão, chegou a ser negociado a 141 mil pontos pela primeira vez na história.
De lá para cá, passou por certa correção, mas se mantém em patamares elevados. E há um otimismo rondando o mercado local. Especialistas continuam defendendo que, apesar da alta, as ações seguem com valuation descontado. Com exceção do fluxo de capital estrangeiro, os investidores locais, tanto a pessoa física, quanto o institucional, continuam fora da Bolsa.
Predomina um entendimento de que, quando os juros começarem a cair e esses públicos voltarem, o patamar de 140 mil pontos vai parecer pouco para o IBOV. Um movimento que pode ser acelerado ainda mais graças ao ‘trade de eleição’ no próximo ano, mas que depende de outras tantas variáveis, como juros e cenário global.
Essa é a análise predominante que faz bancos e corretoras projetarem que o Ibovespa chegará ao fim de 2025 entre 145 mil e 160 mil pontos, apesar dos desafios fiscais, da Selic de dois dígitos e das guerras tarifárias e geopolíticas mundo afora. Mostramos isso nesta outra reportagem.
Mas este 2º semestre de novos recordes parece menos óbvio sob o ponto de vista das gestoras de ações. A cautela maior não é para menos. Com a alta das ações brasileiras, a indústria voltou a performar bem em conjunto.
Um levantamento feito pela Quantum Finance mostra que as sete categorias de FIAs na classificação da Anbima superaram o Ibovespa no semestre, com destaque para os fundos de ações valor/crescimento e os fundos de ações livre. Em uma janela um pouco maior, algumas vão ficando para trás: em 36 meses, apenas três das sete subclasses conseguem superar o índice de ações da B3.
A janela mais positiva, no entanto, ainda não se converteu em captação; ou melhor, em menos resgates. Dados da Anbima mostram que os fundos de ações perderam R$ 43,6 bilhões no primeiro semestre do ano. Desde julho de 2024, não há um mês positivo em termos de captação.
Para entender como gestores estão conseguindo navegar nesse cenário e transformar o recorde do Ibovespa em retorno para os cotistas, o E-Investidor conversou com as maiores assets do País para mapear 0 que vem dando certo nas carteiras e qual a leitura de Bolsa daqueles que estão conseguindo vencê-la – um desempenho que já não é a regra há algum tempo na indústria.
Para isso, fizemos um levantamento com a ajuda da Economatica, que mapeou os FIAs com melhor retorno nos últimos 36 meses. Selecionamos aqueles incluídos na categoria “Ações Livre” da Anbima, deixando de lado fundos restritos, temáticos ou que invistam apenas no exterior. Com as gestoras que toparam dar uma entrevista, construímos uma reportagem especial para cada, que serão publicadas nos próximos dias, contando as histórias por trás dos bons resultados da Arbor Capital, Organon Capital, e Rubik Capital.
Os fundos Arbor FIC, Organon FIC e Rubik Bequest renderam 153,21%, 135,51% e 106,97% entre junho de 2022 e junho de 2025, respectivamente. Os retornos superam com folga o Ibovespa, que subiu 40,91% em 36 meses, atrás até do CDI, que entregou 42,20% no período.
Em cada reportagem, os gestores vão explicar no detalhe o racional da estratégia que os fez entregar retornos acima de 100% aos cotistas nos últimos três anos.
O fato é que os caminhos por trás de cada resultado são bem diferentes. Tem estratégia focada em small caps, preferência por big techs, mais análise macro. Assim como as leituras de cenário atribuem o desempenho do semestre a motivos diversos, passando pela volta do capital estrangeiro ao mercado local, mas esbarrando também no trade de eleição e até em um otimismo exagerado de investidores.
O consenso é com o futuro: as três assets entrevistadas na reportagem acreditam que o longo prazo para ações brasileiras é, sim, positivo. O desafio mora no caminho até lá. Uma história que não necessariamente acontecerá no segundo semestre, como indicam as projeções que veem o Ibovespa a 160 mil pontos até dezembro.
De “o Brasil acabou” para “Bolsa barata demais”
Na visão da Organon, as ações não estão mais baratas e boa parte da alta observada no semestre tem a ver com a melhora do lado macro no exterior. Com um dólar mais fraco, o fluxo de investidores estrangeiros voltou a olhar para mercados além dos EUA, permitindo que a Bolsa local aparasse os excessos vistos no fim de 2024, quando o pânico do mercado com o fiscal penalizou os ativos brasileiros. Mas o custo de capital global continua alto – e é ele que precisa cair para destravar valor de forma estrutural.
Isso não implica numa mudança de estratégia. A gestora continua comprando os ativos que sempre comprou; teses de “bottom up”, ou seja, de empresas fora do radar do mercado, com alto potencial de retorno e cuja análise microeconômica a gestora conheça na lupa.
“Se o custo de capital cair, vamos ganhar muito dinheiro. Se não cair, ainda vamos ganhar dinheiro em empresas que geram lucros, distribuem dividendos e estão com múltiplos baixos. Não me parece um cenário ruim”, diz Raphael Maia, CIO da Organon.
Já a Arbor atribuiu a disparada do IBOV em 2025, e a continuidade desse movimento, a outro fator: o trade de eleição. O termo vem sendo utilizado na Faria Lima para se referir ao posicionamento mais favorável a ativos domésticos gerado pela possibilidade de alternância de poder em 2026, em meio à queda de popularidade do atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em queda e a pressão por uma condução mais firme de política fiscal. Um tema que vem sendo gradualmente precificado nos ativos locais.
“A Bolsa andou em cima do macro, mas a valorização também aconteceu porque a aprovação do governo caiu e, com isso, a probabilidade do cenário político mudar aumentou muito”, afirma Leonardo Otero, sócio fundador da casa.
Os bons retornos do Arbor FIC vieram sobretudo de ações no exterior, uma estratégia de alocação que a gestora foi uma das primeiras a defender no mercado nacional e que segue desde a fundação. Isso não significa que não haja espaço na carteira para ações brasileiras: o maior resultado dos últimos três anos veio de uma fintech nacional, o Banco Inter, que deu “mais dinheiro até que a Microsoft” ao fundo, conta Otero. “Estamos muito de olho no Brasil”, diz.
A visão mais cautelosa é da Rubik Capital, que vem aumentando o caixa do fundo desde maio, revertendo posições mais arriscadas que montou ao final de 2024 quando o mercado parecia precificar que o Brasil ia acabar. Seis meses depois, parece que esse investidor virou a chave e vê o País hoje como o melhor lugar possível para se investir.
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Nem lá, nem cá, a casa, que nasceu como um multi familly office para atender clientes ultra high em Curitiba, prefere manter os pés no chão. O que muitas vezes significa agir no contrassenso. Não porque não veja oportunidades, mas porque acredita que, por ora, o caminho da Bolsa pode ter mais correções do que novas altas.
“O mercado trouxe muito otimismo para a mesa muito rápido, querendo transformar uma história que era do exterior em uma história local”, destaca Breno Falseti, gestor de investimentos e sócio da Rubik. Apesar da visão construtiva com o estrutural de Brasil, a cautela de curto prazo prevalece. Justamente porque os motivos que podem ter impulsionado as altas recentes, seja a pauta eleitoral, seja a volta do fluxo estrangeiro, podem não ser estruturais.
“Muitos investidores locais têm trazido essa tese de renovação política, mas é uma discussão prematura. Os indicadores econômicos estão piores do que estavam ano passado, no Brasil e fora”, diz Falseti. “A assimetria parece maior para uma piora no humor dos investidores locais do que para novas rodadas de otimismo.”