A Medida Provisória 1303/2025 nasceu como um texto abrangente, tratando de diversos temas fiscais e cambiais. Entre tantos assuntos, um em especial chamou a atenção de quem acompanha o mercado de ativos digitais: a tentativa de mudar as regras do imposto de renda sobre criptoativos.
A MP propunha encerrar a isenção de até R$ 35 mil por mês nas vendas de criptomoedas e criar uma alíquota única de 18% sobre o ganho de capital. Essa isenção, vale explicar, é a mesma que existe há anos para bens de pequeno valor. Ou seja, quem vende até R$ 35 mil por mês em cripto – seja Bitcoin, stablecoins ou renda fixa digital – não paga imposto sobre o lucro; acima desse limite, o ganho é tributado de forma progressiva, de 15% a 22,5%.
A boa notícia é que, com a queda da MP do governo, derrubada na Câmara nesta quarta (8), essa regra continua valendo, e o investidor de varejo que opera em plataformas brasileiras mantém o mesmo tratamento tributário que já tinha antes. É um desfecho positivo para o pequeno investidor, que é a maioria do mercado. Dados do Mercado Bitcoin indicam que mais de 90% dos clientes se beneficiam da isenção por operarem abaixo do teto mensal. E esse universo pode ser ainda maior: quem pretende vender, por exemplo, R$ 60 mil, pode fracionar – R$ 30 mil em um mês e R$ 30 mil no seguinte – e permanecer dentro da regra.
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O caminho, agora, é mais inteligente: regulação clara, não punição fiscal apressada. E vale lembrar o que exatamente estava em jogo.
O ponto central: cripto é para todos
Criptoativos são para todos: professora, engenheiro, médico, estudante. Mudar a tributação às pressas, sem calibrar efeitos colaterais, empurra gente para fora do sistema, e quem perde é o país. A isenção de R$ 35 mil não é um “privilégio” – é regra de pequeno valor aplicada também a outras classes de ativos. Ela evita transformar a vida do iniciante num caos de DARFs, extratos e planilhas.
O que eles não querem que você saiba
Hoje convivem duas realidades tributárias no mundo cripto:
Plataformas brasileiras / operações nacionais: vigora a regra do ganho de capital com isenção até R$ 35 mil/mês.
Operações no exterior (exchanges estrangeiras ou carteiras fora do país): desde a Lei 14.754/2023, cripto no exterior foi enquadrada como aplicação financeira; o ganho é tributado a 15% pelo regime anual, sem a isenção de R$ 35 mil. A Instrução Normativa da Receita Federal de número 2.180/2024 detalhou esse tratamento.
Tradução direta: quem negocia “lá fora”, ou seja, em plataformas sediadas nos Estados Unidos, na China ou em Nárnia, não usufrui da isenção que protege o pequeno investidor aqui dentro. Pouca gente sabe disso, e essas plataformas globais raramente se preocupam em explicar as especificidades da regra brasileira, evidentemente. Já as exchanges locais, como o MB, operam dentro do marco regulatório nacional, com reporte automático à Receita (uma obrigação, não uma opção). Por aqui, relatórios padronizados e suporte para declaração e recolhimento de impostos, como outras plataformas de investimentos tradicionais, oferecem transparência, segurança e tranquilidade ao investidor.
Há ainda um ponto operacional: operações em exchanges (troca ou câmbio) estrangeiras acima de R$ 30 mil/mês exigem complexos reportes mensais do próprio contribuinte à Receita (IN 1888/2019), com multas pesadas em caso de erro ou omissão. Mais uma vez, uma obrigação, e não uma opção. Nas plataformas brasileiras, o reporte é automatizado pela própria exchange. Menos atrito, menos erro.
Por que manter o investidor “no trilho” faz diferença
A tentação de punir quem opera em casa pode parecer inteligente no curto prazo, mas é tiro no pé. Você erode a base tributável, incentiva a migração para a informalidade ou ilegalidade e desidrata a indústria local, sem alcançar a arrecadação prometida. Ao longo da tramitação da MP, percebeu-se que o fim da isenção desloca o ônus para o varejo e privilegia apenas tickets maiores, exatamente o oposto do que se dizia buscar.
O Brasil tem 25 milhões de CPFs expostos a cripto de alguma forma. É hora de trazer essa base para perto, com regras claras e execução simples, não de afastá‑la.
Regulação: o que vem agora
Estamos às vésperas de a regulação de PSAVs (Prestadores de Serviços de Ativos Virtuais, corretoras cripto e assemelhadas) do Banco Central ganhar corpo. O objetivo é de elevar segurança, integridade e maturidade: requisitos de capital, governança, tecnologia, prevenção a ilícitos e supervisão contínua. A boa notícia é que o BC conhece quem é quem no mercado e tem um cardápio de melhores práticas, locais e internacionais, para se inspirar. Isso protege o investidor, protege as empresas sérias – tanto as que já estão aqui quanto as que desejam entrar – e, por tabela, protege a sociedade.
O recado final, com senso de urgência
Não é hora de empurrar o investidor para fora do país. É hora de acolher quem quer começar dentro da regra, com educação e operacional simples. Nas plataformas brasileiras, a isenção até R$ 35 mil/mês vale, o reporte é automático e o investidor entende o que está acontecendo. Lá fora, além de não ter a isenção, ele carrega sozinho o ônus de reportes e interpretações, e se expõe a riscos desnecessários.
Não é só o Brasil que está organizando a casa. Vários hubs vêm criando incentivos, inclusive tributários, para atrair empresas e capital de cripto. A Alemanha confirmou que ganhos de capital para pessoa física em cripto são isentos após 1 ano de holding; é regra estável há tempos e foi reafirmada em 2025. Portugal passou a tributar 28% ganhos de curto prazo (menor que 365 dias), mas isenta quem segurou os ativos por mais de 1 ano, preservando o incentivo ao investimento de longo prazo. Hong Kong, Emirados Árabes (Dubai/Abu Dhabi), Japão e Suíça têm seus incentivos, seja para investidores, seja para empresas cripto se estabelecerem em seus países.