Investimento não é cassino

Fabrizio Gueratto tem quase 20 anos de experiência no mercado financeiro. É especialista em investimentos, professor de MBA em Finanças, autor do livro “De Endividado a Bilionário”, fundador da Gueratto Press e criador do Canal 1Bilhão, com quase 21 milhões de visualizações no YouTube

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Fabrizio Gueratto

Como o fanatismo político cega o investidor

Investidores estrangeiros e empresários cautelosos retirariam o capital do País, o que faria a Bolsa desabar 

Lula e Bolsonaro disputam corrida presidencial. Foto: AP Photos
  • Em um possível golpe, diversos países seriam obrigados a aplicarem um boicote, como acontece com Cuba, Venezuela e Coreia do Norte
  • Poderíamos ter uma escassez de matérias-primas importadas, o que causaria subida do preço dos produtos e, consequentemente, inflação
  • O Banco Central seria obrigado a subir os juros rapidamente para conter a economia

Antes de começar a ler este artigo, deixe o seu fanatismo de lado. Não estou aqui para defender Lula ou Bolsonaro. As eleições já acabaram e, gostem ou não, todos vamos conviver com este governo pelos próximos três anos. Tenho amigos que ficaram na frente do Exército exigindo uma intervenção militar e, antes de julgar, sempre gosto de entender o que se passa na cabeça de qualquer pessoa. É assim que conseguimos debater ideias.

Entendi que, do ponto de vista deles, se um governo de esquerda saísse do poder e um governo de direita assumisse com foco no crescimento econômico, teríamos um País muito melhor. Mas será que seria simples assim?

Pois bem. Mais uma vez vou pedir: esqueça o fanatismo. Estamos aqui para analisar friamente o que aconteceria do ponto de vista econômico. Imagine que, dia 1 de janeiro de 2023, o exército assume o controle do Brasil. Obviamente, com o País dividido entre esquerda e direita, haveria o caos.

Como todo mundo sabe, os sindicatos estão nas mãos da esquerda. É comum ver um presidente de sindicato que faz 30 anos que está naquele cargo. Obviamente, greves começariam a ocorrer, principalmente no funcionalismo público, que temeria os cortes. Imagine os transportes de grandes cidades parando, por exemplo. Nas ruas, com os ânimos exaltados, provavelmente haveriam confrontos mais violentos. Mas este seria o menor dos problemas.

Não podemos esquecer que o brasileiro acima de 50 anos viu de perto o seu dinheiro ser confiscado na época do presidente Collor. Provavelmente, em meio a enorme instabilidade, haveria uma corrida para retirar o dinheiro dos bancos, o que poderia ocorrer uma crise sistêmica.

De forma inversa, vi este movimento quando o Lula ganhou as eleições. Diversas pessoas me perguntaram se ainda era seguro ter investimentos, pois um governo de esquerda poderia confiscar tudo. Claro que não fazia o menor sentido, mas o efeito manada funciona assim. Alguém joga uma informação em um grupo de Whatsapp, ou confirma, pois diz que o tio do amigo do primo tem uma informação privilegiada de que aquilo irá acontecer. Antes do Lula assumir cheguei a ouvir o absurdo de que ele estava morto e quem assumiria seria um sósia.

Em um possível golpe, diversos países seriam obrigados a aplicarem um boicote. Assim como acontece com Cuba, Venezuela e Coreia do Norte, países administrados por ditaduras de esquerda, se os militares intervissem nas eleições brasileiras, os Estados Unidos, nosso segundo maior parceiro comercial, imediatamente suspenderiam a compra de diversos produtos. Até mesmo a China, nossa grande compradora de minério de ferro, poderia ser obrigada a se enquadrar no boicote.

A consequência natural do caos é o desemprego. Empresários com receio de investir e investidores estrangeiros retirando o capital do País, o que faria a Bolsa de valores desabar do dia para a noite. Além disso, poderíamos ter uma escassez de matérias-primas importadas, o que causaria a alta do preço dos produtos e, consequentemente, inflação. Neste caso, o Banco Central seria obrigado a aumentar os juros rapidamente para conter o desastre e a gente sabe que quando a Selic está alta, a economia não anda.

Vamos pensar friamente. Sabemos que a maioria dos empresários são de direita. Você acha que em um País que está o caos, com inflação, Selic subindo, demissões, Produto Interno Bruto (PIB) comprometido, alguém arriscaria investir ou contratar mais gente?

Ainda teríamos um outro problema. Diversos países, para proteger suas economias, adotariam medidas protecionistas. Por exemplo, a carne brasileira já teve dificuldades de entrar na Europa e no menor sinal de problemas, imediatamente acontece um boicote. O mesmo aconteceu com o aço brasileiro nos EUA. Tudo o que estes países sonham é encontrar uma desculpa que justifique a criação de barreiras para os produtos de outros países.

No caso do Brasil, um dos grandes produtores mundiais de alimentos, isso com certeza ocorreria. Não por uma questão ideológica de não concordarem com o golpe, mas por se aproveitarem de uma situação para implementarem regras injustas. Enquanto isso, nas ruas, o Brasil estaria pegando fogo entre a esquerda e a direita.

Acho que agora consegui dar um choque de realidade. Pouco importa se você é Lula ou Bolsonaro, um golpe destruiria a nossa economia. Ponto. Gosto muito desta frase: “Para todo problema complexo, existe uma solução simples e burra.”

Aviso da redação: Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial do E-Investidor/ Estadão.