Mais do que um pacto romântico, funciona como instrumento jurídico para quem quer deixar claro que está na fase do afeto, mas não na de partilha de bens
O contrato de namoro não é blindagem absoluta. Se, na prática,
houver indícios claros de convivência pública, contínua e com intenção de constituir
família, o Judiciário pode reconhecer a união estável, mesmo com contrato de namoro
assinado. (Foto: Adobe Stock
O namoro, que já foi feito de bilhetinhos, serenatas e – mais recentemente – mensagens de WhatsApp, agora também pode vir acompanhado de um contrato. O contrato de namoronão é uma declaração de amor frio ou calculista, mas um documento cada vez mais usado por casais que querem deixar registrado, para si e para terceiros, que não há união estável, mas sim um relacionamento afetivo sem intenção imediata de constituir família.
A lógica é simples: “Estamos juntos, mas não tão juntos assim”.
O que é o contrato de namoro?
Do ponto de vista jurídico, trata-se de um instrumento particular no qual as partes afirmam que estão vivendo um relacionamento afetivo, mas não pretendem, naquele momento, constituir família ou formar patrimônio comum, reconhecendo que cada um mantém seu patrimônio individual.
Em outras palavras, não é e não quer correr o risco de ser considerado uma união estável.
Não há forma obrigatória prevista em lei, mas o documento costuma ser feito por escrito e com firma reconhecida — às vezes até com registro em cartório, para dar maior segurança.
A lei não impõe prazo para renovação. Mas, como as coisas mudam, o ideal é atualizar o contrato a cada ano. Isso mantém o documento coerente com a realidade do relacionamento e muito mais eficaz para demonstrar que a intenção continua sendo apenas namorar – e não formar família no sentido jurídico.
Por que o contrato de namoro existe e quando faz sentido?
O objetivo é prevenir discussões futuras sobre eventual reconhecimento de união estável.
Em casos de término do namoro ou de falecimento de um dos parceiros, a outra parte pode alegar, maliciosamente, união estável para ter direito a partilha de bens ou herança. O contrato funciona como prova contrária, especialmente se acompanhado de elementos que reforcem que o casal não vivia como se casado fosse.
Faz sentido, por exemplo, para quem está em relacionamento afetivo, mas mantém vidas financeiras e residências separadas; para quem já possui patrimônio consolidado e quer evitar litígios patrimoniais futuros; e, ainda, para empresários ou herdeiros que precisam dar segurança jurídica a seus bens.
Limites e ilusões
Especialmente após a pandemia, houve um grande aumento de registros de contratos de namoro e de uniões estáveis no Brasil, bem como diminuição do registro de casamentos.
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Importante lembrar: o contrato de namoro não é blindagem absoluta. Se, na prática, houver indícios claros de convivência pública, contínua e com intenção de constituir família, o Judiciário pode reconhecer a união estável, mesmo com contrato de namoro assinado.
O documento é prova relevante, mas não absoluta.
Repita-se: o contrato de namoro não tem poderes para esconder uma união estável quando, na prática, ela existe – a união estável pode ser configurada com ou sem contrato.
Se o casal vive sob o mesmo teto, divide despesas, se indica como dependente em clubes sociais ou planos de saúde, planeja o futuro como família e se apresenta assim para a sociedade — como se casados fossem —, o papel perde força.
A vida real fala mais alto que qualquer cláusula e a diferença entre namoro e união estável é realmente tênue e, em muitos casos, subjetiva.
Alguns veem o contrato de namoro como excesso de juridicização do afeto; outros, como uma demonstração de maturidade e prevenção. De um jeito ou de outro, é reflexo de um tempo em que relações afetivas e patrimônio convivem de forma cada vez mais consciente — ou desconfiada.
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Se já se fala até em “contrato de sexo” — ainda uma excentricidade estrangeira, mas com futura utilização bastante provável —, o contrato de namoro pode fazer sentido para proteção legal e patrimonial.
Conclusão
O contrato de namoro é, antes de tudo, um recado jurídico: estamos no campo do afeto, mas sem avançar para o território da comunhão de bens.
Funciona? Na maioria dos casos, sim. É infalível? Nem de longe.
Mas, como todo bom contrato, pode evitar aborrecimentos — no mínimo, já deixa claro que o amor é grande, mas o cuidado com o patrimônio também.
E, assim como todo relacionamento, o contrato de namoro deve ser revisitado de tempos em tempos — porque, se o relacionamento evoluir para algo mais sério, talvez seja a hora de mudar o contrato… ou rasgá-lo.