O que este conteúdo fez por você?
- A ascensão meteórica da China como potência econômica tem sido acompanhada por um desafio significativo e muitas vezes negligenciado
- A China responde por cerca de 18% do PIB global e é um motor-chave de crescimento econômico mundial
- Problema da dívida da gigante asiática tem suas raízes em sua rápida expansão econômica
A ascensão meteórica da China como potência econômica tem sido acompanhada por um desafio significativo e muitas vezes negligenciado: sua crescente dívida nacional. Embora muita atenção seja dada ao poderio manufatureiro e aos avanços tecnológicos do país, a questão da dívida pode ter profundas implicações, não apenas para a China, mas também para a economia global.
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Em 2022, a dívida total da China — incluindo as obrigações dos governos central e locais — foi de aproximadamente 94 trilhões de yuans (cerca de US$ 14 trilhões), equivalente a 77,1% de seu PIB. Quando se consideram as dívidas das empresas estatais e outras obrigações não governamentais, as estimativas sobem ainda mais, colocando a relação dívida/PIB da China acima de 280%. Se não for gerido com cuidado, esse nível de endividamento representa um risco significativo para a estabilidade econômica global.
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Os fatores por trás do acúmulo da dívida chinesa
O problema da dívida da China tem suas raízes em sua rápida expansão econômica. Nas últimas duas décadas, o governo chinês tem dependido fortemente de investimentos financiados por dívida para sustentar o crescimento, particularmente em infraestrutura, setor imobiliário e empresas estatais. Os governos locais também desempenharam um papel fundamental, tomando empréstimos extensivos para financiar projetos de desenvolvimento, muitas vezes utilizando mecanismos fora do balanço, como os Veículos de Financiamento de Governos Locais (LGFVs).
Essa estratégia, embora bem-sucedida em criar empregos e fomentar a urbanização, resultou em retornos decrescentes. Muitos projetos de infraestrutura, como ferrovias de alta velocidade subutilizadas e “cidades fantasmas”, não geraram os benefícios econômicos esperados, deixando governos locais e empresas estatais lutando para honrar suas dívidas.
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Além disso, o mercado imobiliário da China — há muito um pilar do crescimento econômico — entrou em um período de estresse significativo. Desenvolvedoras como a Evergrande deram calote em empréstimos, e a queda nas vendas de imóveis reduziu drasticamente as receitas com vendas de terrenos, uma importante fonte de renda dos governos locais. Como resultado, as autoridades locais enfrentam pressões fiscais crescentes, agravando ainda mais a crise da dívida.
Impactos na economia global
Os desafios relacionados à dívida da China não se limitam às suas fronteiras. Os efeitos colaterais de uma possível crise da dívida no país podem desestabilizar a economia global de diversas maneiras:
1. Crescimento econômico global
A China responde por cerca de 18% do PIB global e é um motor-chave de crescimento econômico mundial. Uma desaceleração na economia chinesa devido a problemas de dívida provavelmente reduziria a demanda global por matérias-primas e commodities, impactando negativamente economias que dependem de exportações para a China. Mercados emergentes na América Latina, África e Sudeste Asiático — regiões altamente dependentes de investimentos chineses — seriam os mais afetados.
2. Volatilidade nos mercados financeiros
Os problemas de dívida da China têm o potencial de desencadear grandes perturbações nos mercados financeiros globais. Dada a interconexão dos sistemas financeiros, preocupações com a capacidade da China de gerenciar sua dívida podem levar à fuga de capitais, ao aumento dos custos de empréstimos e a uma volatilidade elevada nos mercados globais de ações e títulos. Investidores estrangeiros com exposição a ativos chineses podem reavaliar os riscos, provocando desinvestimentos em larga escala.
3. Disrupções no comércio
Como o maior exportador do mundo, a China desempenha um papel central no comércio global. Se sua crise de dívida se aprofundar, o governo chinês pode priorizar a estabilidade econômica doméstica, adotando políticas comerciais protecionistas ou redirecionando recursos de iniciativas internacionais, como a Iniciativa do Cinturão e Rota (BRI). Essas mudanças teriam efeitos em cascata nas cadeias de suprimentos globais, nos balanços comerciais e nas parcerias internacionais.
4. Pressões cambiais e inflacionárias
As estratégias de gestão da dívida da China podem impactar a estabilidade do yuan e os mercados de câmbio globais. Por exemplo, esforços para estimular a economia por meio da desvalorização do yuan poderiam criar pressões competitivas para outros países ajustarem suas taxas de câmbio, potencialmente desencadeando uma onda de desvalorizações cambiais. Além disso, pressões inflacionárias na China devido a estímulos fiscais impulsionados pela dívida poderiam se espalhar para os mercados globais.
Respostas políticas e o caminho a seguir
O governo chinês está tomando medidas para lidar com seus desafios de dívida, mas esses esforços enfrentam obstáculos significativos. As principais iniciativas incluem:
- Reestruturação da dívida: O governo central está incentivando a reestruturação da dívida de governos locais e empresas estatais em dificuldades para evitar calotes generalizados.
- Reformas fiscais: Há um impulso crescente por reformas que proporcionem aos governos locais fontes de receita mais sustentáveis, como aumento na arrecadação de impostos ou mecanismos de compartilhamento de lucros com o governo central.
- Maior regulação: Pequim apertou as regulamentações sobre financiamento paralelo e LGFVs para conter o excesso de empréstimos e melhorar a transparência no sistema financeiro.
Embora essas medidas sejam necessárias, elas não estão isentas de riscos. Um processo rápido de desalavancagem pode desacelerar o crescimento econômico, levando ao desemprego e ao descontentamento social. Por outro lado, a falta de ação decisiva para enfrentar o problema da dívida pode levar a uma crise financeira, com consequências ainda maiores.
O que isso significa para a economia global
O restante do mundo deve prestar muita atenção à forma como a China lida com seus desafios de dívida. Formuladores de políticas e empresas em todo o mundo devem se preparar para possíveis choques, diversificando cadeias de suprimentos, reduzindo a dependência excessiva dos mercados chineses e monitorando de perto os desenvolvimentos na política financeira chinesa.
Para a China, alcançar um equilíbrio delicado entre crescimento econômico e disciplina fiscal será crucial. As apostas são altas, não apenas para os 1,4 bilhão de habitantes do país, mas também para bilhões de pessoas em todo o mundo cujos meios de subsistência estão indiretamente ligados à saúde da economia chinesa. Seja no sucesso ou no tropeço da China em gerenciar sua crise de dívida, a economia global sentirá os efeitos.