- As corporações que mais lucram na economia, as empresas de tecnologia, pagam menos impostos do que caixas de supermercado
- Depois da reunião do G7 e a proposta do imposto global mínimo de 15% sobre os lucros das multinacionais, esta realidade está prestes a mudar
(Ben Steverman, Laura Davison e William Horobin/WP Bloomberg) – O fundador da Amazon, Jeff Bezos, tem recursos suficientes para viajar ao espaço sideral. Elon Musk, também. De muitas maneiras, os maiores ricaços do mundo deixaram o restante de nós para trás há muito tempo.
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Os 500 indivíduos mais ricos do mundo valem agora US$ 8,4 trilhões, uma elevação de mais de 40% durante o ano e meio que se passou desde que a pandemia começou sua devastação global. Enquanto isso, as corporações que mais lucram na economia, empresas de tecnologia que criaram muitas dessas vastas fortunas, pagam menos impostos do que caixas de supermercado, e seus mega-abastados fundadores são capazes de explorar brechas legais para transmitir enormes quantias a herdeiros sem pagar quase nada de imposto.
Agora, um grupo com poder suficiente para desafiar a supremacia dos titãs da tecnologia está prestes a entrar em ação. Os líderes do Grupo dos Sete, incluindo o presidente americano, Joe Biden, e o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, se encontraram no sudoeste da Inglaterra nesse fim de semana, onde esperava-se que eles endossassem um plano para tapar brechas do esburacado sistema mundial de cobrança de impostos.
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Enquanto as mudanças ainda necessitarão de aprovação de um grupo maior de países, incluindo a China, para se tornar realidade, o acordo do G-7 marca um ponto de inflexão histórico, após décadas de quedas de arrecadações de impostos de corporações multinacionais.
“É muito fácil para multinacionais e indivíduos ricos escapar de impostos. O que estamos vendo no G-7 é que chegou a hora de os políticos reassumirem o poder”, afirmou Philippe Martin, ex-assessor do presidente francês, Emmanuel Macron, que agora dirige o Conseil d’Analyse Economique (Conselho de Análise Econômica). “Há uma janela de oportunidade, um ponto de inflexão no qual eles percebem que precisam do poder dos impostos e precisam gastar mais.”
O pacto impulsionaria os planos de próprio Biden de aumentar impostos de empresas e dos ricos elevando índices de tributação, fazendo herdeiros pagarem mais e equalizando taxas entre investidores e trabalhadores.
As propostas são parte de um reavivamento global de iniciativas de tributação dos ricos, de Buenos Aires a Estocolmo, a Washington, incluindo novos impostos sobre ganhos de capital, heranças e fortunas, impulsionados pelos enormes buracos fiscais nos orçamentos de governos de todo o mundo causados pela pandemia de covid-19.
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A secretária do Tesouro americano, Janet Yellen, definiu o pacto do G-7 como uma maneira de os governos protegerem sua soberania em relação ao estabelecimento de políticas fiscais.
“Faz muito tempo que vemos uma corrida global para eliminar impostos de corporações”, afirmou Yellen após a reunião dos ministros de Economia dos países do G-7, em Londres, na semana retrasada, que antecedeu o encontro.
A Amazon e algumas outras empresas do setor de tecnologia, enquanto isso, endossaram o acordo, acreditando que o regime global de tributação será mais administrável do que alternativas custosas perseguidas individualmente pelos países. Bezos também manifestou seu apoio pelo aumento de impostos das empresas americanas para financiar projetos de infraestrutura.
Defensores dos impostos mais altos afirmam que esses passos são necessários para evitar a ascensão do populismo e até para viabilizar o capitalismo.
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“Os mais visíveis e proeminentes vencedores da globalização são essas grandes multinacionais, cujas taxas efetivas de impostos despencaram”, afirmou o professor de economia Gabriel Zucman, da Universidade da Califórnia, em Berkeley, que estuda riqueza e desigualdade. “Isso só pode levar a uma crescente rejeição das pessoas em relação a essa forma de globalização.”
O Fórum Econômico Mundial, organizador da conferência anual dos ricos e poderosos em Davos, na Suíça, publicou um estudo técnico este mês argumentando que “os sistemas de tributação devem ser redesenhados eficientemente para taxar capital e multinacionais”.
Governos precisam dessa receita e “impostos progressivos são um mecanismo essencial para compensar a desigual recuperação já em andamento”, de acordo com o relatório.
Defensores de impostos baixos
Ainda restam muitos defensores de impostos baixos.
Economistas conservadores como Douglas Holtz-Eakin, presidente do American Action Forum, argumenta que taxar mais os ricos e as corporações prejudicará a economia.
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“Impostos mais altos sobre capital geralmente aumentam a probabilidade de uma diminuição no crescimento da produtividade”, afirmou Holtz-Eakin, que foi assessor do ex-presidente George W. Bush.
Essa visão, porém, está perdendo terreno à medida que cresce o ressentimento em relação às maneiras pelas quais corporações altamente lucrativas reduzem suas cargas fiscais.
Facebook, Apple, Amazon, Netflix, Google e Microsoft evitaram coletivamente pagar cerca de US$ 100 bilhões em impostos nos EUA entre 2010 e 2019, de acordo com uma análise de registros regulatórios do Fair Tax Mark, uma fundação progressista. Muitos desses lucros não taxados foram depositados em paraísos fiscais como Bermudas, Irlanda, Luxemburgo e Países Baixos.
Na prática, a Amazon pagou uma taxa de impostos de 11,8% em 2020, de acordo com análise da Bloomberg Economics, e não se trata de um ponto fora da curva entre as empresas de tecnologia mais bem-sucedidas. O Facebook, fundado pela quinta pessoa mais rica do mundo, Mark Zuckerberg, pagou 12,2% de impostos no ano passado.
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Em resposta a um pedido de comentário para este artigo, um porta-voz da Amazon apontou para alguns comunicados anteriores da empresa relacionados à sua fatura fiscal, incluindo, em parte, que: “Os impostos da Amazon, que são divulgados publicamente, refletem nossos contínuos investimentos, pagamentos de funcionários e as atuais leis tributárias americanas”.
Uma mistura entre empresa de tecnologia e varejista com gigantesca infraestrutura física, a Amazon tem a habilidade de se valer de inúmeras taxas preferenciais, duradouras e discretas, para compensação de ações, edifícios, pesquisa e desenvolvimento. Bezos estimulou o reinvestimento dos lucros na empresa, uma estratégia que mantém baixo o lucro tributável e altas as isenções.
A Amazon evitou totalmente impostos federais sobre o lucro em 2017 e 2018 graças ao uso sagaz da lei tributária. Desde então, a empresa teve de pagar algum imposto ao Internal Revenue Service (IRS, receita federal americana), mas a uma taxa muito menor do que a taxa geral de 21% instituída pelo presidente Donald Trump.
Bilionários pagam menos que suas empresas
Bilionários fundadores de empresas de tecnologia com frequência pagam individualmente até menos do que suas corporações.
Bezos, por exemplo, ficou US$ 77 bilhões mais rico em 2020, de acordo com o Bloomberg Billionaires Index. Mas nos EUA, ganhos com ações somente são tributados quando elas são vendidas – e a uma taxa muito menor do que os trabalhadores mais bem pagos; o que significa que Bezos ficou devendo no máximo alguns bilhões de dólares em impostos ao Tesouro americano no ano passado.
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“As pessoas mais ricas deste país, que tiveram lucros imensos durante a pandemia, não estão pagando uma cota justa”, afirmou o presidente da Comissão de Finanças do Senado, Ron Wyden, após a agência ProPublica noticiar na terça feira que vários bilionários do mundo, incluindo Bezos, não pagaram nenhum imposto de renda em alguns anos.
A empresa de comunicação afirmou que obteve documentos tributários confidenciais a respeito de milhares de americanos, incluindo Warren Buffett e Michael Bloomberg, dono da Bloomberg LP, empresa-mãe da Bloomberg News. A Bloomberg e outras corporações afirmaram à ProPublica que pagaram os impostos devidos.
Para remover vantagens no código tributário americano que beneficiam os ricaços, Biden propôs taxar ativos herdados que atualmente escapam de tributações, assim como elevar a taxa máxima de tributação sobre ganhos de investimentos, para que trabalhadores mais bem remunerados e investidores paguem o mesmo.
Em escala internacional, o governo americano está buscando uma taxa global mínima de ao menos 15% para as empresas mais rentáveis do mundo – a expectativa era a de que o pacto avançasse na reunião do G-7.
O acordo do G-7 mudaria outras regras de tributação de multinacionais, com o objetivo de evitar esforços por parte das empresas de se mudar para países com impostos mais baixos. Biden também está defendendo aumentar a taxa tributária de 28% para as empresas americanas, em parte revertendo a política fiscal de Trump.
Empresas de tecnologia poderiam ver as taxas que pagam saltar se um pacto fiscal global for alcançado, de acordo com pesquisa do Morgan Stanley. O Facebook e a Alphabet, dona do Google, poderiam pagar 28% sobre seu lucro global, de 18% e 17%, respectivamente, sob as regras atuais, constatou o estudo.
Apesar de toda conversa a respeito de taxar os ricos, as propostas de Biden e o acordo tributários internacional encaram sérios obstáculos antes de serem adotados.
Enquanto alguns colegas do Partido Democrata, que controla o Congresso por pequena margem, estão pedindo a Biden mudanças mais radicais na tributação de propriedades e fortunas, outros estão hesitantes.
O próximo passo para as negociações globais a respeito de impostos, que foram inauguradas anos atrás pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico e envolveram cerca de 140 países, é alcançar o acordo do Grupo dos 20. Os ministros das Finanças do G-20, responsáveis coletivamente por aproximadamente 90% do PIB mundial, se encontrarão em julho, em Veneza.
Pedras no caminho de um acordo até o fim deste ano incluem a China, que deverá buscar isenções em relação à taxa mínima.
Ainda assim, há esperança de que os esforços globais “ponham fim à loucura”, afirmou Pascal Saint-Amans, diretor do centro para política fiscal da OCDE. “Havia brechas por toda parte, e ninguém estava preocupado. Isso minava o objetivo crucial do capitalismo e da economia de livre mercado.”
Matt Day e Ian King, da Bloomberg, colaboraram com esta reportagem.
(Tradução de Augusto Calil)