Comportamento

Os ricaços de Wall Street fugiram para a Flórida. Agora, já querem voltar

Com a pandemia, grandes nomes do mercado se mudaram. Mas com a vacina o retorno a Wall Street já é realidade

Os ricaços de Wall Street fugiram para a Flórida. Agora, já querem voltar
Flórida (Foto: Envato Elements)
  • Atores principais e coadjuvantes do mundo das altas finanças têm viajado ao estado enquanto esperam o fim da covid-19
  • Moradores locais esperançosos veem evidência de que o antigo e inalcançável sonho de ver a região atrair gigantes das finanças para morar em definitivo pode estar por fim se concretizando
  • Mas, a verdade é que somente uma pequena porcentagem dos nova-iorquinos de Manhattan se mudaram definitivamente para a Flórida no ano passado

(Katherine Burton, Annie Massa, Amanda Gordon e Jonathan Levin/WP Bloomberg) – O coquetel “Upper East Side”, do Sant Ambroeus, é igualzinho ao de Manhattan, e o carpaccio do Cipriani é tão vermelho quanto o de Wall Street.

Eis aqui o bilionário do mercado de ações, Stephen Schwarzman, a caminho do La Goulue, o bistrô francês com ares de clube noturno popular entre socialites da Park Avenue. Aí está David Solomon, diretor do Goldman Sachs, com um grupo de investidores a reboque.

Os nomes e o dinheiro cheiram a Nova York, mas as piscinas em tons verde-azulados e as palmeiras balançando ao vento, sob a brisa morna do Atlântico, dizem outra coisa: Flórida, a pretensa Wall Street do Sul.

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Por meses, agora, atores principais e coadjuvantes do mundo das altas finanças têm viajado ao estado enquanto esperam o fim da covid-19. Moradores locais esperançosos veem evidência de que o antigo e inalcançável sonho de ver a região atrair gigantes das finanças para morar em definitivo pode estar por fim se concretizando. Ao longo da Worth Avenue, em Palm Beach, corretores imobiliários estão contando o dinheiro das comissões que têm ganhado com o boom no setor induzido pela pandemia. Escolas particulares fantasiam com as matrículas dos filhos dos ricaços.

A realidade, porém, é mais matizada — muito mais.

Somente uma pequena porcentagem dos nova-iorquinos de Manhattan se mudaram definitivamente para a Flórida no ano passado. E, enquanto as vacinações dão nova esperança de que o fim da pandemia esteja próximo, o entusiasmo nas falas a respeito de as massas de Wall Street serem atraídas para o Sul da Flórida já começou a se esvair.

Dan Sundheim, fundador do fundo de hedge D1 Capital Partners, com sede em Nova York, deve deixar Palm Beach e voltar para seu lar na Park Avenue, de acordo com uma fonte informada a respeito dos planos dele. David Tepper já voltou para Nova Jersey e está vivendo lá, depois de morar em Miami, no ano passado, apesar de ter acabado de comprar com sua mulher uma mansão de US$ 73 milhões em Palm Beach.

“O grande problema de se mudar para a Flórida é ter de viver na Flórida”, afirmou Jason Mudrick, que controla US$ 3 bilhões da Mudrick Capital Management e vive em Manhattan há mais de duas décadas.

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“Nova York tem as pessoas mais inteligentes e motivadas, as melhores opções de cultura, os melhores restaurantes e os melhores teatros”, afirmou ele. “Qualquer um que se mude para a Flórida para economizar um pouco perde tudo isso.”

Flórida x Nova York

No fim do ano passado, seria até perdoável pensar que Manhattan estaria prestes a se esvaziar de investidores, administradores financeiros e corretores da bolsa. Elliott Management Corp., Citadel e Point72 Asset Management tinham anunciado planos de abrir escritórios na Flórida, e o Goldman avaliava se deveria transferir alguns administradores de ativos para lá.

Doug Cifu, diretor da criadora de mercados Virtu Financial Inc., afirmou que mal pode esperar pelos deslocamentos de 6 minutos em seu Corvette até o trabalho, depois que se transferir de Nova Jersey para os novos escritórios em Palm Beach Gardens. Scott Shleifer, graduado executivo da Tiger Global Management, acaba de comprar uma casa de US$ 132 milhões em Palm Beach e planeja estabelecer residência por lá.

Grande parte da narrativa em torno dessas transferências está centrada em impostos e clima favorável aos negócios. A Flórida não tem imposto de renda estadual, enquanto a cidade de Nova York tem um dos impostos de renda mais altos do país.

Ainda assim, o Serviço Postal dos EUA pinta um quadro diferente. No ano passado, 2.246 pessoas solicitaram mudança permanente de endereço de Manhattan para o Condado Miami-Dade, e 1.741 para o Condado de Palm Beach. Juntas, essas pessoas representam 9% dos moradores de Manhattan que se mudaram para outros Estados, contra 6% em 2019.

Ainda assim, um número baixo de ricaços deixando a cidade pode ter um impacto desproporcional. Os nova-iorquinos mais abastados — 1% da população — pagaram US$ 4,9 bilhões em impostos de renda locais em 2018, o equivalente a 42,5% do total recolhido, de acordo com o Escritório Independente de Orçamento da cidade.

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Mais moradores de Manhattan se mudaram para Jersey City, Los Angeles, Filadélfia, Chicago e Hoboken, Nova Jersey, do que para Miami ou Palm Beach. Exceto pela Filadélfia, essas pessoas foram para alguns dos Estados com impostos mais altos do país.

Enquanto a Elliott Management está transferindo a sede para a Flórida, seu fundador, Paul Singer, vai permanecer no Nordeste americano. O escritório de Nova York continuará sendo o maior da empresa, e o novo braço em Greenwich, Connecticut, também será maior do que a matriz na Flórida, de acordo com uma fonte familiarizada com os planos.

A queridinha Nova York

As principais razões para a preferência por Nova York são o acesso a escolas particulares de alto nível e a maior quantidade de profissionais jovens para assumir cargos, de acordo com entrevistas com vários executivos de fundos de hedge.

Esse movimento é similar ao que aconteceu na AllianceBernstein Holding, quando a empresa decidiu transferir sua sede de Manhattan para Nashville, em 2018. Enquanto mais de mil postos de trabalho da administradora financeira de US$ 688 bilhões foram transferidos para fora da cidade, os cargos de alto nível, como de administração de fortunas particulares e portfólios de investimentos, ficaram — um reflexo da localização dos clientes da firma.

Muitos executivos resistiram à mudança, de acordo com um diretor sênior. Funcionários mais velhos que trocaram Manhattan por Music City reclamaram por ter de afastar as famílias de suas raízes, e encontrar profissionais talentosos de alta qualidade em Nashville provou ser muito mais difícil do que o esperado, afirmou a fonte.

Um representante da firma disse que a AllianceBernstein está “satisfeita com nossa diretoria localizada em Nashville” e enalteceu “os grandes talentos locais que recrutamos”.

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Um fundador de um fundo de hedge que passou os seis meses mais recentes em Miami ainda está decidindo se fica por lá. As forças que o atraem de volta são o dinamismo de Nova York e a escola de seus filhos, que prefere em relação à escola atual. De qualquer maneira, ele manterá o escritório em Nova York — assim como sua casa em Hamptons, porque ninguém quer passar o verão no sul da Flórida.

Pais que estão decidindo ficar na Flórida estão descobrindo que muitas das escolas particulares do Estado estão com as vagas esgotadas, ou quase. Fanning Hearon, diretor da Palm Beach Day Academy, afirmou que o número de matrículas aumentou 22%, para 480, nos 18 meses mais recentes, e turmas de algumas matérias já têm listas de espera. Outras escolas na região relatam que também têm pouco espaço para mais alunos. Enquanto isso, as escolas particulares de elite em Nova York afirmam que as matrículas aumentaram e poucos estudantes estão se mudando para a Flórida.

Cristobal Young, professor de sociologia da Universidade Cornell e autor do livro The Myth of Millionaire Tax Flight: How Place Still Matters for the Rich, prevê que a relocalização continuará mínima, porque pessoas ricas raramente mudam de casa.

“Eles vivem onde obtiveram sucesso, onde têm conexões industriais, funcionários e clientes, e onde ocupam assentos em diretorias de organizações sem fins lucrativos”, afirmou ele. Young, que estudou os efeitos do aumento de impostos na Califórnia e em Nova Jersey, afirmou que isso elevou muito pouco as migrações interestaduais, que permanecem a uma taxa de 2,4% ao ano entre os milionários que vivem nos EUA.

E há também o poder de sedução de Nova York, em um momento em que toda a cidade começar a reabrir. “Será como nos selvagens anos 1920 — veremos um ressurgimento aqui como nunca antes”, afirmou Mudrick, que prevê o retorno de muitos de seus amigos que se mudaram para Miami. “É hora de comprar em Nova York e vender na Flórida — sei que estou contrariando a tendência.”

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(Tradução de Augusto Calil)

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