O executivo pontua, em entrevista exclusiva ao E-Investidor, que a estratégia adotada pelo governo americano ficou clara com a aprovação da Lei Genius (GENIUs Act), referendada pelo Congresso dos EUA em julho de 2025. A medida estabelece uma estrutura para a regulamentação das stablecoins no país, forçando o mercado americano a lastrear esse tipo de criptomoeda em ativos líquidos, como o dólar ou títulos do Tesouro, na proporção 1 para 1.
Ou seja, cada stablecoin – um ativo digital atrelado a alguma moeda fiduciária, como o dólar – deve ter cotação equivalente a US$ 1.
Para o CEO da Hashdex, a novidade vai reforçar a demanda por dólar no mercado, sendo uma resposta às tentativas chinesas de derrubar os EUA do posto de detentor da moeda comercial global.
A articulação mais recente ocorreu na cúpula do BRICS – sigla para o bloco formado inicialmente por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul – no Rio de Janeiro, quando os países membros – que hoje conta também com Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia, Irã e Indonésia – defenderam a criação de uma moeda comum para que o dólar não seja utilizado como moeda comercial entre os seus integrantes.
Vale lembrar que o dólar ascendeu como moeda de transação global em 1944, quando o acordo de Bretton Woods foi assinado com a ideia de conversão da moeda em ouro, a uma taxa fixa de US$ 35 por onça troy. Esse padrão-ouro vigorou até 1971, quando os EUA suspenderam a conversibilidade do dólar devido ao aumento de gastos com a guerra do Vietnã. A partir de então, o dólar tornou-se uma moeda fiduciária.
Veja a seguir a entrevista completa com Marcelo Sampaio, CEO da Hashdex.
E-Investidor — O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, tem cumprido suas promessas de campanha para as criptomoedas?
Marcelo Sampaio, CEO da Hashdex — Sim, ele tomou medidas que auxiliaram até na precificação das criptomoedas. Nesse primeiro ano do governo Donald Trump houve uma série de pacotes regulatórios extremamente bem montados e profundos, como as leis Genius e Clarity.
Nesse meio-termo, as stablecoins escalaram pelo mundo todo. A medida, proposta pelo presidente dos Estados Unidos facilita o envio e o uso das stablecoins, o que deve popularizar esses criptoativos.
A popularização das stablecoins diminui a relevância do dólar no longo prazo?
Não, gera um efeito contrário. Hoje vivemos um momento em que a China e os demais países do BRICS estão procurando outra moeda. Se nada fosse feito, nessa velocidade, o dólar deixaria de ser a moeda global daqui a 20 ou 30 anos.
As regulamentações colocadas por Trump atrelam a grande parte dessas criptomoedas ao dólar. Então, a moeda americana ganha sobrevida como reserva de valor e o Trump já entendeu e agora fala abertamente sobre esse ponto.
Desse modo, o uso da stablecoin é a melhor forma dos Estados Unidos superar essas barreira, pois a criptomoeda pode fazer o dólar chegar a lugares onde ele chega muito pouco, como na Venezuela, na Argentina e no Zimbábue.
No início do governo Trump, havia projeções de que a cotação do bitcoin poderia ultrapassar US$ 200 mil. Qual é o potencial de valorização hoje?
Vejo essa possibilidade como muito provável. O bitcoin também vai chegar a US$ 1 milhão. Quanto mais descentralizada a rede, maior seu valor. Em um cenário geopolítico cada vez mais complicado, cresce a demanda por proteção de valor e o bitcoin passa a ser visto com ainda mais relevância.
A rede se expande, torna-se mais valiosa por sua própria arquitetura, que impõe um limite para emissão de bitcoins. Esse fator somado à demanda crescente formam forças seculares, que tornam quase natural esperar esse movimento de alta. O preço é apenas uma consequência. Sabemos que ele chegará, mas não sabemos quando.
Se o bitcoin tem fundamentos para chegar a US$ 1 milhão, como explicar a queda de mais de 20% nos últimos 30 dias?
O bitcoin, historicamente, cai 430 dias depois do halving (evento que corta pela metade a remuneração de quem faz a mineração do criptoativo). O último ocorreu em 19 de abril de 2024.
Vemos o mercado com postura conservadora nas últimas semanas, principalmente em relação aos temores da bolha da inteligência artificial (IA) e a uma redução de juros nos EUA em menor velocidade, com o Fed Funds (como as taxas de juros por lá são chamadas) em patamar elevado por um período maior.
Esses fatores pressionam o bitcoin no curto prazo para o fundo poço, cujo patamar não conseguimos prever, tampouco estimar quando será atingido. No entanto, com a chegada dos ETFs (fundos de índice) de bitcoin, acreditamos que correção em relação às máximas será menor que as vistas anteriormente, que foram de 70% a 50% do topo.
No Brasil, o Banco Central reforçou as regras para combater fraudes com criptoativos. O pacote é suficiente?
A regulação, de modo geral, é positiva para o mercado cripto. É importante estabelecer medidas para prevenir que crimes sejam cometidos. Não achamos o pacote do Banco Central absolutamente ruim, no entanto, algumas regras não são razoáveis.
Um exemplo vem da necessidade de capital regulatório de R$ 10,8 milhões a R$ 37,2 milhões para operar no segmento. Vemos esse ponto como uma medida que pode deixar participantes menores, do segmento cripto, fora da operação. A barra ficou muito alta, mas entendemos que o BC pode reduzi-la conforme o mercado avança.
Todavia, seria muita ingenuidade da indústria pensar que o Banco Central não traria mais regulamentação.
Olhando para a empresa, quais serão as estratégias de negócios da Hashdex para 2026?
Em 2026 vamos acelerar nossa agenda de índices nos Estados Unidos. Essa é uma indústria nova e ainda em formação, algo já consolidado no Brasil com o Hash11. Nosso objetivo é liderar a categoria de índices de cripto nos EUA — algo como criar o ‘S&P 500 das criptos’. Somos o principal parceiro global da Nasdaq e estamos fazendo um grande investimento no país para tornar isso possível.
No Brasil, também teremos muitas novidades. Já anunciamos parcerias com Bradesco e Caixa, e outras virão. A Hashdex hoje é uma das gestoras mais distribuídas do País e vamos expandir ainda mais essa presença, trazendo novos produtos e alcançando um público maior. Temos hoje algumas centenas de milhares de investidores no Brasil e queremos chegar aos milhões.