Educação financeira é chave para transformar planos em realidade. (Foto: Adobe Stock)
Quando criança, Leidian de Souza recebia todos os dias uma moedinha de R$ 0,10 dos pais, fruto da venda de leite na fazenda da família, no interior de Goiás. “Meus pais sempre me incentivavam a guardar esse dinheiro. O importante era juntar, mesmo que fosse de pouquinho”, conta. O hábito de poupar, transmitido de forma simples por sua família – que desconhecia o termo “educação financeira” – entrou na vida de Souza muito antes de se tornar, ela mesma, uma agente da causa nas escolas.
A vivência de Souza, no entanto, contrasta com a realidade da maioria dos brasileiros, que ainda têm pouco contato com educação financeira. Uma pesquisa da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), divulgada em julho deste ano, mostra que 55% admitem entender pouco (40%) ou nada (15%) do tema, embora reconheçam sua importância.
Por outro lado, com conhecimento em educação financeira, é possível transformar hábitos e criar uma relação mais saudável com o dinheiro.
“Ao entender o impacto dos juros, diferenciar desejo de necessidade e planejar antes de gastar o consumidor desenvolve disciplina para manter o controle das finanças. Essa consciência é essencial para escapar de armadilhas como o rotativo do cartão de crédito ou o acúmulo de parcelas e permite usar o crédito de maneira estratégica para realizar objetivos, enfrentar imprevistos e construir um futuro mais estável financeiramente”, diz Marcelo Leitão, gerente de benefícios na Creditas.
Nesse sentido, os pequenos hábitos de poupança da infância ajudaram Souza a trilhar seu caminho: ela se formou em matemática e, no mês passado, foi reconhecida como professora destaque da Região Centro-Oeste no programa Aprender Valor, do Banco Central (BC), que leva educação financeira para dentro das disciplinas obrigatórias nas escolas. No relato a seguir, ela conta como levou a ideia de reserva financeira para a sala de aula:
Falar de dinheiro nem sempre é fácil, mas aprender a lidar com ele pode mudar sua vida. Que tal descobrir o quanto você já entende de educação financeira?
O que funciona nas aulas: exemplos práticos que engajam
Educação financeira trata-se de gastar com consciência, poupar com disciplina e investir com inteligência para se proteger contra riscos. (Foto: Adobe Stock)
Ao pensar em educação financeira, é comum associá-la apenas ao dinheiro em si. No entanto, o tema vai muito além: envolve planejamento, poupança, investimentos e diversos outros aspectos do dia a dia.
De acordo com a pesquisa Panorama de Crédito da Creditas em parceria com a Opinion Box, feita em agosto de 2024, os principais desafios que impedem brasileiros de buscarem educação financeira são falta de interesse (40%), falta de tempo (26%) e dificuldade em entender o tema (17%).
Isso mostra que a questão não envolve apenas de acesso à informação, mas também de engajamento ao ver sua aplicabilidade no dia a dia.
Júnia Alessandra Pereira de Assis foi reconhecida como professora com mais engajamento na Região Sudeste do programa Aprender Valor. Especialista em língua portuguesa, ela enfrentou o desafio de ensinar gestão financeira para além dos números.
Em uma de suas aulas, levou uma conta de luz para a sala, incentivando os alunos a interpretar as informações e pensar em formas de reduzir o valor da fatura.
Do básico ao hábito: anotar gastos, evitar impulsos e criar metas
O levantamento da Febraban também mostra que 39% das famílias estão hoje endividadas. Entre elas, quase um quarto (23%) acredita que fechará 2025 em situação ainda pior do que no fim do ano passado, enquanto 48% esperam reduzir o nível de endividamento.
“Educação financeira e endividamento são temas afins: a dificuldade de controlar gastos leva muitas pessoas a contrair dívidas para cobrir despesas e imprevistos. No entanto, o mesmo contexto de desorganização financeira aumenta o risco de inadimplência”, afirma Antonio Lavareda, presidente do Conselho Científico do Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas (IPESPE), responsável por produzir a pesquisa da Febraban.
Para evitar o endividamento, comece com pequenas medidas simples e práticas, conectadas ao dia a dia. “Educação financeira não deve ser vista como conteúdo técnico ou acadêmico, mas como uma ferramenta de autonomia que pode começar com passos simples, como acompanhar o extrato ou organizar despesas em uma planilha”, recomenda o especialista Leitão.
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Sônia Maria Ires Mota, professora reconhecida como destaque da Região Nordeste no programa Aprender Valor, reforça a importância de anotar cada entrada e saída de dinheiro de sua conta. Segundo ela, esse hábito simples ajuda a evitar os impulsos comuns do Pix e do cartão de crédito. Veja:
Com as finanças organizadas, é hora de avançar para a próxima etapa: definir objetivos, como quitar uma dívida ou guardar um valor fixo por mês. Para a psicóloga financeira Ana Paula Hornos, o essencial é dar o primeiro passo e manter a constância.
“Trate o dinheiro como um aliado, uma ferramenta de liberdade, e não como fonte de medo. E, se perceber que a ansiedade, a culpa ou a compulsão financeira estão afetando sua vida, busque apoio psicológico. Esse cuidado profissional pode acelerar e sustentar a mudança”, orienta.
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Para Hornos, a fórmula da riqueza não tem segredo: gastar menos do que se ganha, gerar excedente e transformar em reservas.
“Isso vale para pessoas, empresas e governos. Quando se cria o hábito de planejar, acompanhar gastos e usar o dinheiro de forma consciente, o patrimônio cresce naturalmente. A verdadeira mudança está nas prioridades e em assumir compromisso com as metas”, ressalta.
O caminho para a segurança financeira
No âmbito individual, a educação financeira contribui para reduzir a ansiedade e problemas de saúde mental relacionados ao endividamento, um desafio recorrente entre os brasileiros. Mas esse impacto vai além do indivíduo: um provedor endividado, por exemplo, compromete também a estabilidade de toda a família.
“O planejamento é o contraponto da impulsividade. Decisões apressadas aliviam por instantes, mas geram resultados frágeis e um ciclo de culpa e ansiedade. Já o planejamento organiza as escolhas, conduz ao autocontrole e cria compromissos com metas de longo prazo. Essa disciplina traz tranquilidade, senso de realização e resultados mais consistentes”, diz Hornos.
Para aqueles que enfrentam comportamentos enraizados em relação ao dinheiro, como compulsão por compras ou medo de investir, a psicóloga recomenda tomar consciência do padrão e buscar substituições por hábitos mais saudáveis ou e instrução financeira.
Comportamentos disfuncionais que trazem impacto negativo para a vida requerem o apoio profissional de um psicólogo para conduzir o processo de mudança de forma segura e efetiva.
Em resumo, educação financeira é sobre gastar com consciência, poupar com disciplina e investir com inteligência para se proteger contra riscos. “Ela pode trazer uma importante contribuição para reduzir o extremo do endividamento, ensinando como adquirir dívidas saudáveis e conscientes. Podendo assim favorecer a construção patrimonial e de uma vida próspera, gerando equilíbrio, saúde e bem-estar financeiro”, afirma Eliane Tanabe, planejadora financeira CFP pela Planejar.