A regulamentação da Reforma Tributária – cujo primeiro projeto teve o texto-base aprovado na Câmara dos Deputados nesta quarta (10) – prevê uma série de mudanças em questões como a cobrança do Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI), que deixará de ser do momento da atualização da matrícula para a escritura do contrato de compra e venda do imóvel.
A medida foi inserida na Reforma Tributária a pedido dos municípios, que tentam evitar que compradores de imóveis burlem o sistema para não pagar imposto. Atualmente, o ITBI é cobrado apenas quando o comprador atualiza a matrícula do imóvel para transferir a propriedade para o seu nome no registro público.
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Caso o comprador apenas faça a escritura em um tabelionato, o bem ainda não é transferido para seu nome e, por isso, o ITBI não é devido. Com a nova medida, o ITBI será devido no momento da escritura do imóvel, e não na atualização da matrícula.
Para Júlia Vituli, advogada do Candido Martins Advogados, essa mudança pode gerar judicialização no futuro, pois o momento do fato gerador do ITBI sempre foi motivo de dúvidas entre municípios e contribuintes. No entanto, Vituli comenta que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu que o ITBI ocorre apenas com o registro na matrícula. “A alteração da proposta não é clara sobre o momento do fato gerador, podendo ser na celebração do ato ou título translativo oneroso do bem. Isso cria subjetividade, podendo gerar litígios e contestações judiciais”, afirma.
De acordo com Vaz, do VBSO Advogados, essa medida da Reforma Tributária pode complicar o cenário de compra e venda de imóveis. Na visão dele, muitas pessoas optam por realizar a transferência do imóvel posteriormente por questões financeiras, assinando apenas a escritura de compra e venda. Isso ocorre frequentemente devido à falta de recursos. “Geralmente, o comprador não tem o fluxo de caixa necessário e apenas consegue comprar o imóvel sem pagar o ITBI, que equivale à cerca de 3% do valor do imóvel. Pagar esse dinheiro à vista não é simples para muitos brasileiros”, diz Vaz.
Medida desaquece mercado e eleva insegurança jurídica
Com a nova medida, os brasileiros podem desistir da compra do imóvel por terem de pagar o imposto já na escritura. Vaz relata que a medida tem um caráter educativo, mas também punitivo no bolso do comprador. Na visão dele, muitas pessoas fazem apenas a escritura e demoram anos para atualizar a matrícula e, quando tentam fazê-lo, pode ser tarde demais, podendo perder o imóvel.
Um exemplo prático: “A” vende um imóvel para “B” e eles fazem apenas a escritura, sem atualizar a matrícula para transferir o registro de “A” para “B”. Se “A” falecer, o imóvel passa para os herdeiros de “A”, já que a transferência final não foi realizada. Isso significa que a escritura não confere a propriedade final do imóvel, sendo apenas um documento intermediário. Ainda assim, “B” pode judicializar a situação para manter o imóvel. Dependendo das decisões judiciais, ele fica com a casa, pois a escritura cede a posse do imóvel. No entanto, para evitar problemas, é melhor atualizar a matrícula do imóvel assim que a compra for concluída.
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Enquanto isso, Júlia Vituli, do Candido Martins Advogados, aponta que a mudança da Reforma Tributária complica justamente essa questão explicada acima. Isso porque, se o pagamento do ITBI for feito no ato da escritura, o entendimento da transferência do imóvel seria na escritura, indo na contramão do Código Civil, que só reconhece a transferência no ato da atualização da matrícula. “Portanto, a lei pode criar lacunas e distorções com a cobrança do imposto na escritura, o que é prejudicial para a segurança jurídica do país”, argumenta Vituli.