O Bradesco (BBDC4) anunciou um plano de reestruturação na última semana após o banco reportar uma queda de 21,2% no lucro de 2023, que encerrou o ano passado em R$ 16,3 bilhões. A rentabilidade, medida pelo Retorno sobre o Patrimônio Líquido (ROE), caiu 4,4 pontos porcentuais na base trimestral, saindo de 11,3% para 6,9%.
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A redução na rentabilidade reflete a disparada da inadimplência no ano passado, com o pico no terceiro trimestre, quando o indicador chegou em 6,1%. Em dezembro, o índice recuou 0,9 ponto porcentual, chegando a 5,2%. Sem considerar o calote da Americanas, que entrou em recuperação judicial com mais de R$ 43 bilhões em dívidas, a inadimplência iria de 5,6% para 5,1%.
Essa ainda é a maior inadimplência em comparação com os pares que divulgaram o balanço até o momento. No Itaú o indicador ficou em 2,8%, enquanto no Santander o índice foi de 3,1%.
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A disparada na inadimplência no Bradesco causou uma alta das Provisões para Devedores Duvidosos (PDD), que foi de R$ 32,3 bilhões em 2022 para R$ 39,5 bilhões em 2023, um crescimento de 22,4%. Esse dinheiro é utilizado para cobrir o não pagamento de dívidas e empréstimos feitos pelos clientes do banco.
Em meio a esses problemas, o Bradesco ainda passou por uma uma troca de CEO em novembro do ano passado com a saída de Octávio Lazari para a entrada de Marcelo Noronha.
O novo presidente anunciou um plano de reestruturação nesta quarta-feira (7), que deve ser concluído em cinco anos e “não será de forma estática”. “Nosso plano não tem um bala de prata e não estamos inventando a roda”, afirmou Noronha em sua primeira entrevista coletiva.
As mudanças começaram no andar de cima. Noronha revelou que houve redução em cargos de diretoria para cortar custos e elevar a eficiência do banco. “Acabou o glamour do 4º andar do Bradesco. Nós reduzimos a quantidade de diretores, pois além da redução de custos, a comunicação é muito mais fluida do que antes”, explica o executivo. Com a mudança, algumas unidades de negócio, como atacado, wealth, varejo, negócios digitais e crédito vão responder diretamente ao CEO a partir de agora.
O banco também estipula uma meta de colocar 75% das transações na nuvem até 2025. Atualmente, a empresa está com 45% das transações na nuvem. Analistas do mercado financeiro mostravam preocupações com o banco sobre as questões de tecnologia, visto que ele poderia ter ficado para atrás entre os pares.
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Questionado pelo E-Investidor, o CEO negou essa possibilidade. Ele disse acreditar que o Bradesco é o único banco no Brasil que trabalha com uma inteligência artificial como a Bia e que a instituição financeira já estava no caminho para essa mudança.
“Nós vamos acelerar e começamos isso desde já. A gente entende também que não estamos atrás dos concorrentes, mas vale lembrar que os frutos dessa inciativas não serão colhidos imediatamente. Vamos colher ao longo dos 5 anos, trimestre a trimestre”, afirma Noronha.
Outro ponto da reestruturação é o foco em alta renda. Noronha detalhou que o banco não vai deixar de conceder crédito para as pessoas com menor poder aquisitivo, mas que vai ampliar os empréstimos para as classes mais abastadas. O banco espera diversificar suas fontes de receitas e ter carteiras mais sólidas com essa maior abrangência.
Vale a pena investir no Bradesco após a reestruturação?
Enquanto o CEO do Bradesco apresentava o plano de reestruturação, o mercado penalizava o banco. No dia do anúncio, na última quarta-feira (7), as ações da companhia fecharam em queda de 15,9%, cotadas a R$ 13,96.
Para Ramon Coser especialista da Valor Investimentos, a queda foi uma resposta ao balanço, que não agradou o mercado. “No entanto, o plano de reestruturação é positivo”, comenta Coser.
Phil Soares, chefe de análise de ações da Órama, destaca que o plano apresentado pela companhia é promissor. “A parte de RH e tecnologia está bem contemplada. Todavia, essa redução da hierarquia não deve diminuir totalmente os custos do banco. O que precisa melhorar é a lucratividade e a rentabilidade”, afirma Soares.
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Já Angelo Belitardo, gestor da Hike Capital, diz que o plano tem sido visto com bons olhos, mas não parece suficiente. Ele comenta que a empresa precisa reequilibrar rapidamente os níveis de riscos dos clientes em sua carteira de crédito para que haja reflexo em indicadores de inadimplência, assim como de cobertura de provisões e indicador de eficiência operacional.
“Ao se comparar com os grandes bancos como Itaú, Santander e Banco do Brasil, o Bradesco vem apresentando a pior performance em termos de indicadores de retorno e risco. A redução de custos operacionais é essencial, mas a prioridade deve ser analisar a estrutura de risco em sua carteira de crédito, assim como no relacionamento com investidores e clientes para recuperar os níveis de captação”, afirma Belitardo.
Sobre investir na ação do Bradesco, os analistas sugerem dois caminhos. O primeiro é para aquele investidor que não tem receio de se arriscar na volatilidade do mercado. Coser, da Valor, diz que o papel é atrativo para o investidor que acredita na tese do Bradesco e que “busca o lucro com a ação no longo prazo”.
Já Belitardo, gestor da Hike Capital, acredita que o papel do Bradesco pode ser interessante se ele cair para o patamar dos R$ 11,30. “O ativo negociado nesse nível implica em um múltiplo aproximado de 7 vezes o lucro apurado nos últimos 12 meses, respeitando nossos patamares de dividendos mínimos exigidos para iniciarmos posição em ações”, explica Belitardo.
Ainda assim, o gestor comenta que existem outros bancos muito mais interessantes para o investidor aportar o seu dinheiro, como o Banco do Brasil e o Banco ABC, que segundo ele estão a preços atrativos e com melhor relação de risco e geração de lucro consistentes.
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“Acreditamos que o Bradesco esteja passando por dificuldades tanto em termos de risco atrelado à carteira de credito, como na concorrência, o que ocasiona em maiores incertezas referente ao volume de resgates que o banco poderá estar exposto, com reflexo negativo em seu custo de capital e indicador de basileia”, afirma Belitardo.
Por fim, o analista da Órama comenta que gosta do Bradesco, mas não acredita que o plano de reestruturação deve gerar gatilhos de alta para o papel nos próximos 12 meses. Por isso, ele tem recomendação neutra com preço-alvo de R$ 18, uma alta de 8,43% na comparação com o fechamento de terça-feira (6).
“Esse plano de reestruturação é positivo, mas só devemos mudar a nossa recomendação do Bradesco para compra a partir do terceiro trimestre desse ano. Por enquanto, estamos neutros”, conclui Phil Soares.