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Os motivos por trás da nova aposta da Alaska na Magalu (MGLU3), ação que popularizou a gestora

Gestora foi quem mais ganhou com o boom da varejista entre 2015 e 2020; mercado diz se há um novo sucesso à vista

Os motivos por trás da nova aposta da Alaska na Magalu (MGLU3), ação que popularizou a gestora
Henrique Bredda, gestor da da Alaska Asset Management. Foto: Denise Andrade/Estadão
  • Velha conhecida do Magazine Luiza, a gestora Alaska Asset Management voltou a investir na companhia depois de praticamente zerar as posições em MGLU3 nos últimos três anos; agora, os fundos detêm cerca de 5,14% do capital da varejista
  • A Alaska foi uma das primeiras a apostar no Magalu, em 2015, e viveu o "boom" dos papéis; uma história que rendeu lucros e fama à gestora e seus sócios
  • O time volta a investir na empresa e enfrentar o mercado ceticismo do mercado, mas em um cenário macro mais adverso para os negócios do Magalu. Analistas divergem se a aposta vai vingar

Existe um ditado bastante conhecido no Brasil que diz que um raio não pode cair duas vezes em um mesmo lugar. A gestora Alaska Asset Management, porém, parece estar disposta a contrariar a sabedoria popular para tentar repetir a grande aposta acertada feita em 2015 nas ações do Magazine Luiza (MGLU3) – um investimento que rendeu frutos e fama à gestora de Henrique Bredda e Luiz Alves Paes de Barros.

Velha conhecida da varejista, a Alaska voltou a investir na companhia depois de praticamente zerar as posições em MGLU3 nos últimos três anos. Procurada, a gestora não comentou o assunto.

No último dia 29, o Magalu informou ao mercado que os fundos de investimento sob a gestão da Alaska passaram a deter 5,14% das ações ordinárias da companhia, o equivalente a 38.004.888 papéis. Em comunicado, a gestora indicou que não pretende alterar a composição do controle ou da estrutura administrativa da companhia e que o aumento da participação acionária tem por objetivo a “mera realização de operações financeiras”.

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Ao E-Investidor, uma fonte diretamente ligada à companhia disse que o aumento da posição da Alaska foi bastante comemorado nos corredores do Magalu. Internamente, a volta da gestora soou como um aval ao trabalho de reestruturação que vem sendo feito pela varejista nos últimos anos. Mais do que isso, o movimento foi avaliado internamente como um novo voto de confiança – e público – de um investidor que é relevante no mercado e poderia influenciar positivamente o olhar de investidores.

Especialistas que acompanham de perto o segmento de varejo concordam. “É um voto de confiança de um fundo que tem uma filosofia de investimento muito transparente e de longo prazo. Isso passa para o mercado a sensação de que se eles acertaram uma vez, podem acertar de novo”, diz Ana Paula Tozzi, CEO da AGR Consultores.

Agora, a dúvida é se a Alaska será capaz de repetir o acerto; não pela gestora em si, mas pelo próprio Magalu e um momento para o varejo que é bastante diferente e bem mais desafiador daquele vivido entre 2015 e 2020.

As posições da gestora do boom à derrocada de MGLU3

A fama da Alaska no mercado se mistura com a história do “boom” do Magalu na Bolsa. A gestora investiu na varejista no final de 2015, época em que as ações valiam apenas centavos. Nesta entrevista ao E-Investidor, publicada em 2020, Henrique Bredda, sócio da gestora, contou que a decisão de investimento nasceu em razão de uma mensagem truncada enviada por Paes de Barros, sócio-fundador da Alaska, que entendeu, por engano, que a Magazine Luiza era uma oportunidade para os fundos da casa.

E foi desse desencontro que nasceu uma das apostas mais acertadas dos anos recentes do mercado brasileiro. A Alaska investiu pesado em MGLU3 e surfou uma das valorizações mais acentuadas vividas por uma ação brasileira na última década. Entre dezembro de 2015 e janeiro de 2021, a MGLU3 subiu impressionantes 4.000% na bolsa.

O salto dos papéis pode ser explicado por dois intervalos, explica Hugo Queiroz, sócio da L4 Capital. A primeira pernada, entre 2015 e 2020, foi fruto de uma somatória de reformas macroeconômicas no País, que melhoraram a dinâmica econômica do mercado e deram gás aos investimentos. “Reforma trabalhista, reforma da previdência, juros em patamares muito baixos, aceleração de crédito. Tudo isso trazia uma perspectiva de melhora de renda e, naturalmente, incentivava o consumo. O Magazine Luiza vinha fazendo o seu dever de casa e conseguiu capturar os benefícios dessa retomada econômica”, afirma Queiroz.

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Depois de 2020, veio um segundo movimento positivo para todas as companhias varejistas do segmento de eletroeletrônicos e e-commerce, que impulsionou não só o Magalu, mas os pares Americanas (AMER3) e Casas Bahia (BHIA3), à época ainda chamada de Via Varejo. Foi o “boom da pandemia da covid-19“, explica Caroline Sanchez, analista da Levante Inside Corp. “Essas empresas eram as queridinhas da Bolsa, mas foi um momento muito específico, em que as pessoas estavam em casa e as varejistas não podiam estar com as lojas abertas. O e-commerce dessas companhias acelerou muito as vendas online e as ações tiveram uma valorização muito expressiva.”

E a Alaska surfou bem esse movimento. Um levantamento feito pela plataforma de dados de mercado Economatica, do grupo TC, mapeou as posições do Alaska Black Master FIA BDR Nível I, o fundo mais antigo da gestora, para entender como a MGLU3 foi ganhando peso na carteira com o passar do tempo.

Os dados mostram que as ações do Magalu entraram na carteira do fundo em maio de 2016, uma posição pequena de 3,64%, quando a MGLU3 valia R$ 1,31 na Bolsa. Mas isso rapidamente escalou. Um ano depois, em maio de 2017, a varejista representava um quarto (25,73%) da carteira do Alaska Black, já cotada a R$ 9,55.

A posição da gestora na varejista oscilaria ao longo dos anos, sempre na casa dos dois dígitos, mas a cotação ainda iria disparar mais. A MGLU3 bateu seu auge em janeiro de 2021, cotada a R$ 250, mas a Alaska já estava a alguns meses realizando lucros; uma decisão que se mostraria acertada logo à frente.

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A mesma pandemia que impulsionou os resultados das varejistas com o “boom do e-commerce” deixou outro legado. A inflação disparou, os juros subiram, a inadimplência aumentou; um pacote que penalizou a Bolsa como um todo, mas que bateu com ainda mais força no varejo. "Passado aquele momento, vimos uma queda muito brusca de receita das varejistas, com margens mais pressionadas e estoques muito altos", pontua Sanchez.

Os papéis, que tinham subido de R$ 0,6 ao final de 2015 para R$ 250 no auge em janeiro de 2021, derreteram. Hoje, a MGLU3 é negociada na casa de R$ 12, depois de passar por um grupamento de ações na proporção de 10 para 1 na última semana, com o objetivo de elevar as cotações. Antes disso, os papéis estavam, de novo, na casa de R$ 1.

Mas a Alaska não participou deste ciclo final. O levantamento da Economatica mostra que a gestora começou a reduzir as participações na varejista em outubro de 2020, última vez que a MGLU3 teve um peso de dois dígitos no principal fundo da casa. Naquele mês, os papéis ainda eram cotados a R$ 244 e representavam 18,17% do Alaska Black. Dali para frente, a gestora começaria a realizar os lucros. Apenas 6 meses depois, em abril de 2021, a MGLU3 representava apenas 2% da carteira do Alaska Black.

 

Os fundamentos começam a melhorar

Em termos operacionais, o pior parece já ter passado para o Magalu. No primeiro trimestre de 2024, a varejista conseguiu apresentar um lucro líquido de R$ 27,9 milhões, revertendo o prejuízo líquido de R$ 391 milhões registrado no mesmo período do ano anterior. Já o Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) ficou em R$ 684,9 milhões, o que representa uma alta anual de 111,3%.

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Após a divulgação dos resultados, o CEO da companhia, Frederico Trajano, destacou que os números positivos vieram mesmo em um período de sazonalidade tipicamente ruim para a empresa. “Ainda reportamos 40% de queda de despesa financeira. Nunca tivemos um trimestre com uma evolução tão significativa na rentabilidade“, afirmou ao Broadcast.

Na ocasião, o executivo também disse acreditar que período de maior dificuldade macroeconômica já foi superado pela companhia, apó os últimos dois anos serem marcados por desafios intensos, com cerca de R$ 3 bilhões a mais em despesas (somando o efeito da taxa de juros e o aumento de impostos) com os quais a empresa precisou lidar.

A mesma visão parece ser seguida por Hugo Queiroz, sócio da L4 Capital, que vê os esforços da varejista em realizar uma reorganização operacional. “A companhia trabalhou no aumento de capital e alongou dívida, preservando margens de geração de caixa. A empresa fez todo um trabalho de readequação e, aparentemente, o pior já passou”.

Caroline Sanchez, analista da Levante Inside Corp, acredita que a “principal avenida de crescimento” do Magalu nos últimos meses tem sido o seu braço de marketplace. Só no primeiro trimestre de 2024, as vendas nesse tipo de operação atingiram R$ 4,6 bilhões, um crescimento de 6,4% comparado ao mesmo período do ano anterior.

“É possível ver uma melhora muito clara nos resultados trimestrais da companhia, tanto no quarto trimestre do ano passado como no primeiro trimestre de 2024”, afirma a analista. “A gente entende que o Magalu conseguiu organizar os investimentos no marketplace e em outras frentes tecnológicas que realmente vêm surtindo efeito”.

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Além da evolução nas vendas, a empresa também observou a ampliação da base de sellers (vendedores) do seu marketplace. A plataforma atingiu um total de 353 mil parceiros no primeiro trimestre de 2024, um aumento de 72 mil sellers em relação ao mesmo período de 2023. Nos últimos quatro anos, 327 mil novos vendedores entraram no modelo de negócio, já que o marketplace da empresa contava com apenas 26 parceiros no começo de 2020.

Para Ana Paula Tozzi, CEO da AGR Consultores, a fórmula de gestão do Magalu é capaz de unir eficiência operacional e visão de futuro. “Eu chamo isso de ‘milagre do Magazine Luiza’. Independentemente de todas as crises que passou, a empresa manteve coerência e disciplina de gestão”, destaca. “Ela consegue trazer a eficiência operacional no curto prazo e, ao mesmo tempo, ter sempre um pézinho no longo prazo e na questão digital”.

Mas os números melhores ainda não foram suficientes para fazer o mercado virar a chave em relação à companhia. Por isso, a entrada da Alaska foi celebrada nos bastidores como um “aval” ao trabalho que vem sendo feito. Vai ser suficiente para mudar a visão dos analistas? Parece cedo para dizer.

"A entrada da Alaska em 2015 foi em um market cap perto de R$ 300 milhões. Enxergaram uma grande oportunidade de investimento no varejo e conseguiram ganhar bastante dinheiro com aquela pernada de valorização", diz Hugo Queiroz, da L4 Capital. "No nível de valuation atual, de R$ 9 bi e com o cenário macroeconômico melhorando, eles devem enxergam alguns pontos semelhantes. No lado macroeconômico, o crescimento estrutural está contratado. E a empresa está em um valuation muito parecido com o que estava na época em que entraram", ressalta. Na avaliação de Queiroz, talvez não seja uma oportunidade de fazer o mesmo ganho exponencial, mas de coletar a transformação efetiva, financeira e operacional que o Magalu fez nos últimos anos.

A Alaska vai acertar de novo?

A volta da gestora Alaska à lista de acionistas relevantes do Magalu acontece em um momento em que o mercado como um todo está desconfiado com o varejo. Para além do cenário macroeconômico difícil e da derrocada das ações do setor na Bolsa, a fraude contábil na Americanas (AMER3) em 2023 e a recuperação extrajudicial da Casas Bahia (BHIA3) este ano machucaram ainda mais os investidores. Como mostramos nesta reportagem, a crise na antiga Via Varejo esvaziou o que sobrava de recomendações de compra das ações varejistas.

Entre os nomes brasileiros, o Magalu permanece como o "último titã" – ao menos, a única que até agora não teve que sentar à mesa para negociar dívidas com credores. "Há um monstruoso receio em relação ao varejo como um todo e não é o Magalu que vai resolver isso", diz Ana Paula Tozzi, da AGR. "Mas, no final das contas, quando terminar a crise, ainda vão sobrar uma ou duas cadeiras. E nós apostamos que uma delas será para o Magalu".

Hugo Queiroz, da L4, também é dos que veem a companhia bem posicionada para arrancar uma recuperação, mesmo frente a um cenário mais acirrado de concorrência com pares internacionais. "Acredito que a companhia vai ser umas dominantes que vão pegar o e-commerce mesmo, junto com Amazon, Mercado Livre e mais um outro player asiático", destaca.

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Isso poderia significar mais um acerto da Alaska em relação à valorização das ações do Magalu. A magnitude dessa alta, no entanto, não deve ser a mesma do passado. "É bem factível imaginar que o Magalu saia dos atuais R$ 9 bilhões em valor de mercado para R$ 30 bilhões. Dá pra crescer três, quatro vezes; eles estão enxergando algo parecido com o que viram lá atrás. Só não na mesma exponencialidade de antes."

Mas essas visões mais positivas não são a regra. O consenso de mercado disponível no Broadcast conta com a recomendação de sete analistas; seis têm visão neutra para MGLU3, enquanto apenas um recomenda compra das ações. O desempenho das ações na Bolsa tampouco é positivo: a MGLU3 cai 43% em 2024 e 68% em 12 meses.

No geral, predomina o ceticismo. A companhia está fazendo mudanças importantes, mas o fortalecimento de players como Amazon e Mercado Livre deve tornar a vida do e-commerce brasileiro mais difícil, especialmente enquanto os juros permanecerem altos. "Por mais que o Magalu esteja bem organizado operacionalmente e acreditamos que realmente deve seguir melhorando sequencialmente, o cenário hoje é muito diferente do que tínhamos anos atrás e não depende só da empresa. A competição é muito mais acirrada e estamos bastante céticos em relação ao e-commerce", explica Caroline Sanchez, analista da Levante Inside Corp.

No setor, a preferência da Levante é a MELI34, líder de operações de e-commerce na América Latina. Como uma companhia argentina conquistou o lugar de 'top pick' do varejo no Brasil? Leia mais aqui.

Essa também é a opinião de José Daronco, analista da Suno. "O Magazine Luiza pode, sim, voltar a ser maior do que é hoje. Mas dificilmente vai ser o que já foi um dia. A companhia chegou a ter um valor de mercado muito próximo ao Banco do Brasil (BBAS3), um banco que lucra R$ 30 bilhões por ano, sendo que o varejo é um setor de margens baixas e uma alta dependência da economia doméstica", diz ele. "O fato do Alaska montar uma posição é algo positivo, mas é uma recuperação difícil em um mercado muito mais adverso."

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