Banco Central dos EUA e Banco Central do Brasil ilustram ritmos distintos da política monetária: enquanto o Fed se aproxima de cortes, a Selic deve cair apenas em 2026, segundo a XP. (Foto: Adobe Stock)
Com a economia americana dando sinais claros de cansaço e os primeiros cortes de juros já em curso em algumas grandes economias, o debate sobre quando o dinheiro vai ficar mais barato, e quem se beneficia desse movimento, ganha força. Segundo a XP Investimentos, o ciclo global de flexibilização monetária está mais próximo, mas não será sincronizado: enquanto Estados Unidos e Inglaterra caminham para aliviar o freio, o Brasil segue em modo de cautela, com juros elevados por mais tempo. Entender esse descompasso é chave para o investidor identificar as oportunidades e se ainda predominam os riscos.
Dados recentes mostram que o mercado de trabalho americano perdeu tração de forma mais intensa do que o esperado. Em outubro, houve destruição líquida de 105 mil vagas, número bem pior que o consenso do mercado. Em novembro, a taxa de desemprego subiu para 4,6%, enquanto os salários avançaram apenas 0,1% no mês, abaixo das projeções. Para a XP, esse conjunto indica que o motor do consumo começa a falhar.
A atividade também perdeu fôlego. Os índices de gerentes de compras (PMIs) apontam desaceleração tanto na indústria quanto nos serviços.
O PMI industrial recuou para 51,8 em dezembro, o menor nível em cinco meses, enquanto o PMI de serviços caiu para 52,9, mínima em seis meses. Embora ainda estejam acima da linha que separa expansão de contração, os números reforçam a percepção de perda de dinamismo.
Como explica a XP, a economia americana “está saindo de uma corrida em alta velocidade para um ritmo mais cauteloso”.
A inflação nos EUA, Inglaterra, Japão e Europa
A inflação nos EUA, por sua vez, também trouxe alívio, mas com ressalvas importantes. O índice de preços ao consumidor desacelerou para 2,7% em novembro, abaixo dos 3,1% esperados, e o núcleo caiu para 2,6%. Ainda assim, os analistas chamam atenção para o impacto do shutdown do governo americano, que durou 43 dias. A paralisação atrasou a coleta de dados e pode ter introduzido um viés de baixa artificial nos indicadores.
“Esses números devem ser vistos com extrema cautela”, avalia a XP, já que a desaceleração pode refletir mais uma distorção estatística do que uma queda estrutural dos preços.
Mesmo assim, a combinação de mercado de trabalho mais fraco, atividade em desaceleração e inflação abaixo das projeções sustenta a expectativa de novos cortes de juros pelo Federal Reserve (Fed, o Banco Central dos EUA).
A XP compara o momento a um atleta no fim da maratona: após um longo período de esforço, surgem sinais claros de cansaço, e o Fed se prepara para aliviar o ritmo antes que haja um colapso mais forte da economia.
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Fora dos EUA, o quadro é mais fragmentado. Na Inglaterra, o Banco da Inglaterra já iniciou o ciclo de flexibilização, reduzindo a taxa básica de 4,00% para 3,75%, com sinalização de novos cortes ao longo de 2026.
Na zona do euro, o Banco Central Europeu optou por manter os juros inalterados, enquanto a presidente da autarquia, Christine Lagarde, alertou para uma “incerteza acima do usual”, indicando uma postura mais cautelosa.
O Japão, por outro lado, seguiu na contramão: o Banco do Japão elevou os juros para 0,75%, o maior nível em 30 anos, reagindo a pressões inflacionárias persistentes, desvalorização do iene e inflação acima da meta há quase quatro anos consecutivos.
Para a XP, foi como religar um termostato que ficou desligado por décadas.
Quando os juros vão cair no Brasil?
No Brasil, o debate sobre quando os juros caem é ainda mais delicado. A XP mantém a projeção de que o primeiro corte da Selic ocorra apenas em março de 2026. O cenário-base prevê seis reduções consecutivas de 0,50 ponto percentual, levando a taxa para 12,00% ao final do próximo ano.
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Embora declarações recentes do presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, tenham levado parte do mercado a cogitar um corte já em janeiro, a casa avalia que o Comitê de Políticas Monetárias (Copom) seguirá uma postura vigilante.
A cautela se explica por vários fatores. As expectativas de inflação seguem desancoradas, o câmbio voltou a pressionar (com o dólar acima de R$ 5,50) e o ambiente fiscal ainda gera incertezas.
A XP compara o movimento da Selic a uma descida de montanha sob neblina: o Banco Central quer reduzir os juros, mas a visibilidade limitada o obriga a avançar lentamente, freando sempre que necessário.
O pano de fundo fiscal também pesa nessa equação. A aprovação do Projeto de Lei Complementar nº 128/2025, com impacto estimado de R$ 20,3 bilhões em arrecadação, combina corte de despesas tributárias e aumento de impostos sobre apostas, instituições financeiras e Juros sobre Capital Próprio (JCP).
Para a XP, essas medidas são essenciais para cumprir a meta de resultado primário, mas afetam diretamente setores relevantes da Bolsa e a atratividade de estratégias focadas em dividendos.
Como isso afeta o investidor?
Para o investidor brasileiro, o resultado é um ambiente de “otimismo cauteloso”. Juros elevados por mais tempo mantêm a renda fixaatrativa, enquanto a renda variável enfrenta uma economia doméstica mais fraca, refletida na queda de 0,2% do IBC-Br.
A volatilidade cambial adiciona pressão inflacionária e aumenta a oscilação de ativos dolarizados. Ao mesmo tempo, o espaço limitado para cortes pelo Fed continua pressionando moedas de mercados emergentes, como o real.