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O que explica o entusiasmo dos investidores por ativos de risco em meio a uma economia frágil?

A resposta pode estar na formação de bolhas ou nas rápidas mudanças em fatores fundamentais do mercado

O que explica o entusiasmo dos investidores por ativos de risco em meio a uma economia frágil?
(Foto: Envato Elements)
  • O mercado financeiro reflete as expectativas dos investidores em relação ao futuro. Por isso, não surpreende que ele tenha sido um terreno de caos em 2020
  • No entanto, a recuperação de ativos de risco em meio a condições econômicas frágeis levanta a pergunta: será que algumas bolhas se formaram em determinados ativos? Ou será que os altos e baixos podem ser explicados por fatores fundamentais que mudam rapidamente?

(The Economist) – Mesmo em tempos de normalidade os mercados sempre têm um lado dramático. O preço do petróleo dispara ou despenca diante de turbulências globais; o retorno dos títulos se assanha quando a taxa de emprego é boa; acionistas inflam papéis de empresas que anunciam lucros polpudos. O ano de 2020, porém, levou esse lado teatral do mundo dos investimentos a um novo extremo.

A corrida para vender ações, observada em março, não tem paralelo em termos de velocidade: os papéis perderam 30% de valor num intervalo de apenas um mês. O retorno dos títulos do tesouro americano com prazo de dez anos – ativo mais importante do mundo – caiu pela metade entre janeiro e meados de março, e depois novamente pela metade em questão de dias (em seguida voltou a subir e se comportou como um ioiô). O contrato para barris de petróleo americano com entrega imediata chegou a ficar negativo por alguns momentos. Ao longo deste ano, o preço da madeira diminuiu pela metade, depois dobrou, depois dobrou novamente, caiu pela metade outra vez e dobrou de novo (no final dessa gangorra toda, o saldo são preços que dobraram em 2020).

À medida que diferentes países entravam em quarentena, a queda vertiginosa nos preços de ativos deixou os gestores apavorados. Posteriormente, diante da recuperação impulsionada por uma corrida furiosa das empresas de tecnologia, em meados do ano, eles ficaram inquietos. Vale lembrar que 2018 foi o primeiro ano em que uma empresa negociada em bolsa, a Apple, teve avaliação acima de US$ 1 trilhão.

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Em termos líquidos, a Apple ganhou cerca de US$ 750 bilhões este ano. Também em 2020 a Tesla aumentou seu valor em seis vezes, com uma capitalização de mercado de mais de US$ 600 bilhões (aproximadamente o valor somado das outras sete montadoras mais valorizadas). Até ações pouco queridas no início do ano, como as de bancos e empresas do setor energético, tiveram uma retomada recente – pegando carona nas boas notícias sobre uma vacina eficaz e a inegável vitória de Joe Biden nas eleições americanas. No dia 10 de dezembro, quando a plataforma de aluguel de casas particulares Airbnb estreou na bolsa de valores – depois de um ano em que ninguém viajou para lugar nenhum –, o preço da ação da companhia subiu 115%. Pouco antes, em 5 de dezembro, o valor somado das ações de todo o planeta ultrapassou, pela primeira vez na história, a marca de US$ 100 trilhões.

O mercado financeiro reflete as expectativas dos investidores em relação ao futuro. Por isso, não surpreende que ele tenha sido um terreno de caos em 2020. No entanto, a recuperação de ativos de risco em meio a condições econômicas frágeis levanta a pergunta: será que algumas bolhas se formaram em determinados ativos? Ou será que os altos e baixos podem ser explicados por fatores fundamentais que mudam rapidamente?

Comecemos pelas evidências de bolha. Mesmo com os lucros em queda-livre, os investidores do índice S&P 500 lucraram 14,3% (excluindo dividendos) em 2020 – mais ou menos o dobro dos retornos observados nos últimos vinte anos. Esses lucros empurraram para cima a avaliação das empresas no mercado acionário. Um termômetro usado nessas avaliações é o índice preço/lucro, ajustado de acordo com os ciclos – criação do economista ganhador do Nobel Robert Shiller. Essa “régua” considera os preços de ações ajustados pela inflação, em relação à média de dez anos dos lucros reais por ação.

Quando o índice está alto, as ações estão caras em relação ao lucro; historicamente, esse tipo de período tende a ser seguido por retornos baixos no longo prazo, durante a década seguinte. Nos Estados Unidos, em novembro de 2020 esse índice era de 33 – acima do registrado no início do ano. Só em duas ocasiões anteriores o índice superou 30 naquele país: no final da década de 1920 e no início dos anos 2000.

Além disso, a movimentação das taxas de juros parece ser uma explicação suficiente para o comportamento no preço dos papéis. Isoladamente, o índice preço/lucro ignora o impacto das taxas de desconto na avaliação do valor das ações. Para os acionistas, o valor de uma empresa equivale ao valor presente dos lucros futuros da companhia – ou seja: o preço das ações tende a ser sensível às variações na expectativa em relação a lucros futuros, mas também à taxa de desconto usada para calcular quanto elas valem hoje. Houve grandes mudanças na taxa de desconto das ações. No início de 2020, o retorno dos títulos do tesouro americano com prazo de dez anos era de 1,8%; em meados de março havia caído para apenas 0,6%. Desde que a eficácia da vacina foi anunciada, o retorno cresceu novamente e chegou a 0,9%.

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(Tradução de Beatriz Velloso)

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