Entenda a movimentação das ações da Vale (VALE3) (Foto: Adobe Stock)
Em meio à queda generalizada do mercado acionário brasileiro, após o anúncio feito na véspera pelo governo dos Estados Unidos de tarifas de 50% sobre produtos brasileiros, a ação da mineradora Vale (VALE3) se destaca em forte alta nesta quinta-feira (10). No fechamento, os papéis da companhia dispararam 2,22%, negociados a R$ 55,24.
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A disparada contrasta com o movimento de baixa observado na maior parte dos papéis listados no Ibovespa, em um dia marcado por aversão ao risco e retirada de fluxo estrangeiro da Bolsa de Valores. A valorização é explicada por uma combinação de fatores, que vão do câmbio ao perfil geográfico da companhia, segundo analistas ouvidos pelo E-Investidor.
Para o Goldman Sachs, que analisou o impacto das tarifas sobre companhias exportadoras brasileiras, a Vale tem baixa exposição direta ao mercado americano, com apenas 3% de suas vendas líquidas destinadas aos Estados Unidos. A maior parte da produção da empresa vai para a Ásia, principalmente para a China.
Especialistas dizem que é essa distância comercial em relação ao mercado americano que tem feito diferença neste momento, quando empresas mais dependentes dos EUA enfrentam forte pressão, como a Suzano (SUZB3) (com 19% das vendas líquidas para os EUA) e a Companhia Siderúrgica Nacional, a CSN (CSNA3), com 5%.
Ainda que o dólar tenha recuado levemente hoje, a valorização recente da moeda americana, que chegou a bater R$ 5,60, reforçou a atratividade dos papéis da mineradora. “Como seus contratos de exportação são dolarizados, o câmbio mais elevado aumenta a receita da companhia em reais. Ao mesmo tempo, os preços do minério de ferro, principal produto da Vale, vêm apresentando recuperação no mercado internacional. O efeito conjunto de preços mais altos e dólar forte tem gerado uma combinação favorável para a empresa no curto prazo”, explica Marco Noernberg, head de renda variável da Manchester Investimentos.
Vale é vista como porto seguro em momentos de turbulência
Analistas ouvidos pela reportagem apontam também para um movimento de realocação por parte de investidores. Com o aumento da tensão no comércio internacional, alguns gestores vêm buscando ativos que estejam menos sujeitos a riscos regulatórios ou comerciais de curto prazo. Embora o fluxo defensivo seja difícil de medir com precisão, é possível que parte dos recursos esteja migrando para ações como a da Vale, vista como alternativa diante da penalização de empresas expostas ao mercado americano.
“Muita gente vê a Vale como uma espécie de ‘porto seguro’ nesse momento complicado. E isso acontece porque, mesmo quando o cenário no Brasil está instável, com bolsa caindo, dólar subindo e tensão política, a Vale continua gerando receita forte, principalmente em dólar e com vendas para fora do País”, diz Gustavo Moreira, planejador financeiro e especialista em investimentos.
O banco Goldman Sachs observa que, entre as companhias exportadoras cobertas, poucas têm condições imediatas de redirecionar mercadorias para outros destinos caso percam competitividade nos EUA. Produtos como a celulose de fibra curta, por exemplo, têm pouca elasticidade de mercado, e a substituição por fornecedores de países como Uruguai ou Chile não seria suficiente para atender toda a demanda americana. No caso do minério, por outro lado, a China permanece como um comprador estável, o que favorece empresas com foco nessa região.
Mercado global
O avanço de VALE3 também está ligado ao próprio perfil de empresa ligada à exportação de commodities. Em períodos de maior tensão política ou econômica, ativos desse tipo tendem a ganhar espaço por dependerem menos de estímulos domésticos ou de consumo interno. Como explica o relatório do banco, os fundamentos de preços globais e a dinâmica cambial tendem a ser os principais vetores de valorização nesse tipo de papel.
“Em vez de manter o dinheiro em ações que dependem da economia brasileira, alguns investidores preferem colocar na Vale, que está mais conectada com o mercado global e com uma commodity que segue valorizada. Isso contribui para proteger o patrimônio em momentos de incerteza”, completa Moreira.
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A carta enviada ao governo brasileiro, assinada pelo presidente Donald Trump, confirma que as tarifas de 50% sobre importações de bens do Brasil entrarão em vigor a partir de 1º de agosto. A medida se soma a outras já anunciadas, como a de 50% sobre o aço.
Segundo o Goldman Sachs, o texto indica que qualquer retaliação brasileira resultará em mais tarifas, sem menção clara a eventuais exceções por produto ou setor.
O governo, no entanto, já sinaliza medidas de retaliação às tarifas impostas. No meio dessa guerra comercial, entretanto, economistas e líderes empresariais se manifestaram. Eles recomendam que o governo evite agravar o conflito e aposte no caminho da negociação.
Enquanto nada muda, analistas dizem ter certeza de que, com ambiente de comércio internacional mais restritivo, companhias como Suzano (SUZB3) e Klabin (KLBN11), que operam com contratos de longo prazo e produtos de maior exigência técnica, tendem a enfrentar pressões comerciais e logísticas adicionais sem freios.