- Analistas apontam que o Banco do Brasil deixou de ser uma das ações favoritas do setor bancário
- Carteira de crédito do agronegócio apresentou redução do seu crescimento entre o 2T24 e o 2T23
- Analistas calculam quanto o Banco do Brasil deve pagar em dividendos e se o investidor deve comprar ou vender a ação
Após ganhar a confiança do mercado por ter afastado os receios de interferências políticas ao longo de 2023, com diversas casas de análise recomendando a compra dos papéis, o Banco do Brasil (BBAS3) chega à metade de 2024 com um novo temor dos analistas: a desaceleração de seus resultados nos próximos trimestres. Não é que os números estejam ruins, muito pelo contrário. O Banco do Brasil está no pelotão de frente entre os lucros dos grandes bancos e vem disputando o primeiro lugar com o Itaú Unibanco (ITUB4) trimestre a trimestre. No entanto, analistas do mercado financeiro apontam o imbróglio que pode tirar o sono do investidor.
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O banco estatal reportou um lucro líquido ajustado de R$ 9,5 bilhões no segundo trimestre de 2024, alta de 8,2% na comparação com o mesmo período do ano passado. A companhia também viu sua rentabilidade, medida pelo Retorno sobre o Patrimônio Líquido (ROE), ir a 21% no segundo trimestre. O número é superior ao ROE de 15,5% do Santander (SANB11) e ao ROE de 10,8% do Bradesco (BBDC4).
A empresa, no entanto, fez três movimentos que chamaram a atenção do mercado. A companhia revisou suas projeções de suas Provisões para Devedores Duvidosos (PDD) da faixa de R$ 27 bilhões até R$ 30 bilhões para o intervalo de R$ 31 bilhões a R$ 34 bilhões. No segundo trimestre de 2024 do BB, a PDD ficou em R$ 7,8 bilhões, alta de 8,8% na comparação com o mesmo período do ano passado. No acumulado do primeiro semestre, a PDD ficou em 16,3 bilhões, avanço de 25,5%.
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O Banco do Brasil também revisou o crescimento de sua margem financeira bruta de 7% e 11% para uma alta entre 10% e 13%. No acumulado do primeiro semestre de 2024 do BB, a margem financeira bruta sobe 16,4%. A companhia, no entanto, não anunciou uma alta em seu lucro, que deve ficar na faixa entre R$ 37 bilhões e R$ 40 bilhões.
Além disso, a empresa anunciou uma mudança de estratégia. A diretoria do Banco do Brasil sinalizou no último dia 8 de agosto, que o banco retomará o apetite ao risco para a pessoa física com empréstimos fora do consignado. De acordo com Felipe Prince, diretor de riscos do BB, a empresa aumentará a concessão de crédito para a pessoa física. No entanto, o foco será em créditos elevados e com boas garantias, como em veículos. Já no cartão de crédito, a iniciativa será voltada para aqueles clientes que a companhia conhece bem a renda.
Segundo o executivo, o banco fará o mapeamento com o uso de tecnologia. “Os nossos modelos de crédito com uso de inteligência artificial conseguem identificar clientes que têm uma renda não declarada na movimentação na conta corrente. Assim, conseguimos conceber um público com um bom perfil para a concessão de crédito”, explica Prince.
Mudança de estratégia do Banco do Brasil
Mesmo que com cautela, a troca de estratégia do Banco do Brasil foi vista por muitos analistas do mercado financeiro como inesperada. Isso porque a instituição financeira era vista nos últimos trimestres como uma empresa defensiva pelo fato de a maioria de sua carteira de crédito ser empréstimo consignado.
Na visão de Milton Rabelo, analista da VG Research, a mudança da estratégia tende a gerar esse aumento na margem financeira e nas provisões revistas pela empresa no guidance (projeções da diretoria). No entanto, como a empresa não revisou o lucro para cima, ele comenta que o aumento da companhia pelo apetite ao risco em suas concessões de crédito serve justamente para evitar uma desaceleração do seu resultado, que já era esperada pelo mercado.
“O ajuste na estratégia pode ser entendido como uma maneira de a gestão reverter, ao menos parcialmente, a desaceleração dos lucros esperada. Até o momento, contudo, a estratégia parece exequível. No entanto, vale ressaltar que notamos essa desaceleração há um tempo. O próprio guidance de 2024 evidencia que a gestão já esperava um crescimento menor do banco, até em função do forte ritmo de crescimento que o banco apresentou nos últimos anos”, aponta Rabelo.
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A estimativa do analista é feita com base na projeção de lucro do Banco do Brasil, sendo de um resultado entre R$ 37 bilhões e R$ 40 bilhões. As duas cifras equivalem a altas de 3,93% a 12,35% na comparação com o lucro líquido de R$ 35,6 bilhões de 2023. Ou seja, caso a empresa não atinja o topo da projeção, a expectativa de desaceleração se confirma.
Isso porque o lucro da empresa cresceu 11,4% em 2023. Já a parte de baixo do guidance, de R$ 37 bilhões, aponta para uma alta de apenas 3,9%, uma queda de 7,5 pontos porcentuais entre a melhora do desempenho de 2023 contra 2024. “Além disso, é plausível haver uma diminuição marginal na rentabilidade do BB que deve se manter, contudo, ainda num patamar muito elevado em torno de 20%. Para 2024, a instituição cumprirá provavelmente o seu guidance proposto em torno de R$ 38 bilhões, sem sobressaltos”, afirma Milton Rabelo.
Desaceleração do agronegócio impacta o Banco do Brasil
Em meio a essa formulação de sua estratégia para evitar uma grande desaceleração, os analistas do BTG Pactual dizem que as ações do Banco do Brasil deixaram de ser uma das suas principais escolhas para o setor bancário. No começo de 2024, os analistas tinham o papel um dos seus preferidos. Em relatório publicado no dia 9 de fevereiro deste ano, a equipe do BTG disse que, para o Banco do Brasil manter o atual nível de rentabilidade, a companhia precisaria de uma aceleração das receitas de prestação de serviços, um menor custo do risco e manutenção do controle dos custos.
Na época, os analistas preferiram dar o benefício da dúvida pelo fato de a gestão do banco estatal ter afirmado que a companhia não estava no pico de lucros. Entretanto, a equipe liderada por Eduardo Rosman mudou seu posicionamento no dia 15 de março. Em relatório publicado naquele dia, os especialistas deixaram claro que a desaceleração do agronegócio poderia impactar a empresa e causar uma redução nos crescimentos da companhia.
No último balanço, as estimativas do BTG de março se confirmaram, com uma redução no crescimento da carteira de crédito do agronegócio do BB, que avançou 14,9% na base anual do segundo trimestre de 2024, contra uma evolução de 21,2% na base anual do segundo trimestre de 2023. O resultado mostra uma queda de 6,3 pontos porcentuais no crescimento da carteira de crédito do agronegócio da empresa do setor financeiro. Outro ponto que complica a situação da galinha de ovos de ouro do Banco do Brasil é a alta da inadimplência.
O indicador de calotes acima de 90 dias cresceu 0,3 ponto porcentual, indo de 2,7% no segundo trimestre de 2023 para 3,0% no segundo trimestre de 2024. O desempenho foi impactado principalmente pela alta da inadimplência da carteira do agronegócio, que foi de 0,58% no segundo trimestre de 2023 para 1,32% no segundo trimestre de 2024, o que reforçou ainda mais a tese do BTG de março deste ano sobre o agronegócio.
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No relatório mais recente dos analistas do BTG, publicado em 7 de agosto, os especialistas dizem que os números atuais da companhia mostram que a empresa parece estar no pico de sua lucratividade. Segundo os especialistas, o BB deve cair deste posto em breve, mesmo após as mudanças de estratégia em busca de uma maior rentabilidade. “Nosso viés sobre a história tem enfraquecido nos últimos meses e, já faz algum tempo, que não consideramos o BB em nossa lista de principais escolhas”, dizem Eduardo Rosman, Ricardo Buchpiguel e Thiago Paura, que assinam o relatório do BTG.
Os analistas do Itaú BBA também reforçam a tese do BTG. Os especialistas dizem que a instituição financeira deve entregar um lucro sem grandes crescimentos no fim do ano. Essas estimativas são feitas após a mudança no guidance. Para os especialistas, a companhia deixou claro que o crescimento da margem financeira não deve superar as provisões de uma forma que faça o lucro crescer acima do esperado.
Na visão dos analistas, a margem do BB enfrenta desafios para o crescimento da carteira de crédito devido ao agronegócio e pequenas e médias empresas, impactos adversos do maior portfólio renegociado e comparações difíceis do forte primeiro semestre do Banco Patagonia. A equipe do Itaú BBA também retirou as ações do BB do posto de favorita do setor e deu espaço para os papéis de Santander (SANB11) e Bradesco (BBDC4).
Investidor deve vender as ações do Banco do Brasil?
Embora a situação pareça perturbadora para o investidor e o banco tenha perdido a preferência, somente uma casa não recomenda compra para a ação. Os analistas do Itaú BBA classificam o ativo como market perform, desempenho dentro da média do mercado. A classificação equivale à recomendação neutra.
Os analistas até aceitam que o Banco do Brasil está sendo negociado a um preço descontado, com a métrica Preço sobre Lucro (P/L) estimado para 2025 em 4 vezes. A equipe do Itaú BBA estima que o banco deve pagar cerca de 10% do seu valor de mercado em dividendos nos próximos 12 meses. Ainda assim, a recomendação não é de compra.
“Vemos um fraco momento de lucros impedindo que as ações sejam reclassificadas. Nossa classificação de market perform se mantém. Reiteramos a preferência relativa pelo Bradesco e Santander Brasil em grandes bancos — também descontados em relação ao seu histórico, mas com uma direção positiva do ROE”, dizem os especialistas.
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O Itaú BBA calcula um preço-alvo de R$ 31 para as ações do Banco do Brasil (BBAS3), uma alta de 9,27% na comparação com o fechamento de sexta-feira (16), dia em que o papel terminou o pregão a R$ 28,37.
Milton Rabelo, analista da VG, também comenta que o Banco do Brasil não é sua ação favorita do setor bancário. Segundo ele, o Bradesco está com esse posto. Na visão do especialista, o BB vem reportando uma forte dinâmica de resultados, está muito descontado e paga proventos em um patamar elevado.
Entretanto, o Bradesco tem um potencial maior de crescimento de lucro numa perspectiva de médio e longo prazo. “No nosso cenário-base, a reestruturação posta em prática no Bradesco tem potencial de continuar dando certo e deve fazer com que o banco retome a sua rentabilidade histórica, ainda que esse trabalho demande alguns anos”, diz Rabelo.
Ainda assim, o analista se diz otimista com as ações do Banco do Brasil. Ele comenta que, mesmo com a desaceleração, o papel está atrativo para o investidor pelo fato de ele estar descontado. O especialista não faz a mesma estimativa do Itaú BBA e prefere olhar o copo meio cheio ao invés do copo meio vazio. Ele diz que a ação é negociada a 4 vezes o Preço sobre Lucro (P/L). Por causa disso, recomenda a compra de Banco do Brasil com uma estimativa de dividend yield (rendimento de dividendos) de 9,76% para as ações da empresa. Para abocanhar esses dividendos, o investidor deve comprar a ação até a faixa dos R$ 30,60, sendo esse o preço-teto do analista.
O BTG, embora crítico pela desaceleração, também recomenda compra para as ações da empresa do setor bancário. Os especialistas dizem que o papel está descontado e deve continuar com a rentabilidade, medida pelo ROE, acima dos 20%. E com isso, os analistas estimam que a empresa deve pagar 11,5% do seu valor de mercado em 2024 e mais 11,8% do seu valor de mercado em dividendos ao longo de 2025 (dividend yield).
Em meio às ressalvas e as ações descontadas com bons dividendos, o BTG tem recomendação de compra para o Banco do Brasil com preço-alvo de R$ 36 para os próximos 12 meses. O número equivale a uma potencial alta de 26,9% na comparação com o fechamento de sexta-feira (16), dia em que o papel terminou o pregão a R$ 28,37.
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De modo geral, os analistas recomendam compra para as ações do BB, mas o investidor deve estar atento à questão de que essa não é mais uma das ações preferidas do setor. Essa perda ocorre justamente devido aos riscos da desaceleração dos resultados da empresa. Ou seja, o Banco do Brasil pode ser uma ação rentável e atrativa, desde que o investidor tenha estômago para encarar os riscos do ativo e não perder noites de sono por temor do imbróglio da empresa.