- A Gol (GOLL4) está desde o dia 25 de janeiro deste ano em um processo de recuperação judicial nos EUA, o “Chapter 11”
- De forma geral, hoje, os analistas de mercado estão reticentes em relação à aérea. Por trás da cautela, existem uma série de dúvidas e riscos inerentes a um processo de recuperação judicial que está apenas no começo
- Um fator que está sendo acompanhado de perto pelos analistas, por exemplo, é o financiamento de US$ 950 milhões, anunciado pela Gol em 29 de janeiro. Segundo cálculos do BB e BTG, o empréstimo pode custar "caro" aos acionistas. Entenda
A Gol (GOLL4) está desde o dia 25 de janeiro deste ano em um processo de recuperação judicial nos Estados Unidos, o “Chapter 11”, como é conhecido. A aérea possui dívidas de mais de R$ 20 bilhões e agora tenta reestruturar sua situação financeira junto aos credores, sem prejudicar a operação.
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O anúncio da recuperação judicial inflou as incertezas do mercado em relação à companhia e provocou o desabamento dos papéis na Bolsa – até a última segunda-feira (26), a GOLL4 acumulava uma desvalorização de 71% no ano, cotada aos R$ 2,60. Em função do acionamento do Chapter 11 no Tribunal de Falências americano, a empresa também foi excluída do Ibovespa, principal índice de ações da B3, e de todos os demais índices da Bolsa.
De forma geral, hoje, os analistas de mercado estão reticentes em relação à aérea. Na pesquisa “Survey Results: Where’s everybody going” (Resultados da pesquisa: para onde todo mundo vai, em tradução livre), feita com investidores do BTG Pactual, 82% dos respondentes apontaram a Gol como a posição vendida preferida no setor aéreo. Na outra ponta, a Azul (AZUL4) foi escolhida como a principal posição comprada do segmento por 64% dos participantes do estudo.
Já no site de Relações com Investidores (RI), na seção de cobertura de analistas, nenhuma das dez instituições financeiras que cobrem o papel e emitiram relatórios após a notícia da recuperação judicial indicam compra. Entre elas, oito possuem recomendação de venda ou equivalente à venda (Banco do Brasil, Bank of America, Bradesco BBI, BTG, Citibank, Deutsche Bank, HSBC e JP Morgan) e duas se posicionaram como neutras (Raymond James e Seaport) para a ação da Gol.
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“Muitas casas de análise já revisaram o preço-alvo da companhia e quem ainda não revisou provavelmente deve fazer isso em algum momento ao longo dos próximos meses”, afirma Paulo Luives especialista da Valor Investimentos. “Até que haja um entendimento sobre como se dará a recuperação judicial, acredito que o papel sofrerá com muita especulação e, por este motivo, estou fora”, diz Nilson Marcelo, analista quantitativo da CM Capital.
Procurada, a Gol preferiu não se manifestar sobre o assunto.
Diluição das ações dos acionistas da Gol
Por trás da cautela, existem uma série de dúvidas e riscos inerentes a um processo de recuperação judicial que está apenas no começo. Um fator que está sendo acompanhado de perto pelos analistas diz respeito ao financiamento de US$ 950 milhões, anunciado pela Gol em 29 de janeiro.
Este empréstimo deve ser realizado à aérea na modalidade “devedor em posse” (DIP), que garante prioridade no recebimento de recursos aos credores que concederem o crédito. No caso da Gol, a DIP foi concedida por debenturistas do Grupo ABRA, acionista controlador da empresa. Apesar do montante ser importante para que a aérea mantenha a operação funcionando, o custo para os acionistas pode ser bastante alto.
Segundo cálculos feitos pela BB Investimentos, caso a ABRA faça a conversão em ações dos US$ 1,2 bilhão que detém em debêntures (como forma de pagamento), o resultado pode ser uma diluição acima de 60% para os investidores que possuem GOLL4 na carteira. “Ser diluído” significa ver a sua participação porcentual na empresa diminuir consideravelmente, devido a uma maior quantidade de ações em circulação.
“Por isso, acreditamos que a relação risco/retorno neste momento é desfavorável para o investidor e, para evitar destruição de valor, sugerimos a saída do papel”, diz o BB, em relatório. A recomendação da casa para GOLL4 é de venda.
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Já o BTG vê uma diluição ainda maior, de 90%. “Estamos rebaixando a recomendação para Gol de “neutra” para “venda” e cortando nosso preço-alvo de R$ 10 para R$ 1”, diz a instituição financeira, em relatório.
Discussões no radar
A Gol foi autorizada pela Justiça dos EUA a acessar antecipadamente uma parcela de US$ 350 milhões da DIP concedida pelos debenturistas da ABRA. Para ter acesso ao valor integral, ainda é necessário a autorização final pela Corte de Nova York. A expectativa é de que essa decisão ocorra na próxima quarta-feira (28).
Contudo, bancos como Bradesco (BBDC3; BBDC4) e Banco do Brasil (BBAS3), além de detentores de debêntures da Gol para 2026, já questionaram as garantias desse financiamento. As instituições financeiras e os debenturistas solicitam que essas garantias não incluam as emissões de títulos de dívida da empresa aérea, segundo informações do Broadcast.
Fora as questões relacionadas ao financiamento, a Gol também vive um embate com a Latam na Justiça americana. Em fevereiro, o tribunal de Justiça dos EUA aceitou parcialmente o pedido da companhia aérea brasileira para proteção e investigação de condutas da Latam Airlines. A concorrente é acusada de aproveitar a recuperação judicial para contratar pilotos da Gol e tentar arrendar as aeronaves da companhia em uma “ação predatória”.
A falta de definição alimenta dúvidas no mercado. “Para interessados no setor, acreditamos que os investidores deveriam esperar até a perspectiva se torne mais clara para a Gol, seja a partir dos desdobramentos do processo de recuperação ou da possibilidade de medidas de apoio do governo”, diz Luís Novaes, analista da Terra investimentos, que não tem recomendação para GOLL4.
Setor aéreo em dificuldades
As dificuldades financeiras enfrentadas pela Gol não são novidades no setor aéreo. As companhias foram bastante atingidas pelas restrições de circulação impostas em 2020 e 2021, no auge da pandemia de covid-19. Naqueles dois anos, somente Gol e Azul acumularam, juntas, um prejuízo de mais de R$ 20 bilhões. Além disso, por terem custos em dólar, as companhias são afetadas pelas variações da moeda no exterior, assim como pela cotação do petróleo, relacionado ao querosene de aviação (QAV).