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Ibovespa ainda pode bater 130 mil pontos? Especialistas respondem

Sete especialistas de mercado fizeram análises sobre o que pode influenciar o patamar do índice

(Foto: Envato Elements)
  • Portfólios globais estão sendo rebalanceados, dado que a renda fixa americana fica atrativa por mais tempo
  • Pelos múltiplos, a Bolsa brasileira está desvalorizada e deveria já estar operando no patamar dos 130 mil pontos
  • A razão para Bolsa não estar em patamar histórico está relacionada à política monetária restritiva dos EUA

O Ibovespa a 130 mil pontos ficou mais distante depois que o banco central americano (Fed) decidiu manter as taxas acima dos 5% ao ano, na semana passada. Apesar de a notícia já ser esperada pelo mercado, os dirigentes sinalizaram à imprensa que os juros ficarão mais altos por mais tempo, num movimento até 2024.

A reação foi praticamente imediata e fez a Bolsa de Valores brasileira perder força, caindo 2,33% na semana passada. Nesta semana, houve uma nova retração, com a bolsa furando a barreira dos 116 mil pontos. Na segunda-feira (25), o índice fechou em queda de 1,27% , aos 114.456,81 pontos.

“Os juros mexem com os investimentos no mundo todo, portanto, os portfólios globais vão ser rebalanceados, dado que a renda fixa americana fica atrativa por mais tempo”, diz o estrategista de ações da Nomos, Max Bohm. Em outras palavras, este era um dinheiro que viria para juros e câmbio no Brasil e países emergentes, mas que agora segue para o grande porto seguro do mundo que é a renda fixa americana.

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O cenário dificulta ainda o trabalho do Banco Central brasileiro que, diferente do americano, já opera na linha da queda de juros. Com a política americana restritiva, o piso da Selic aumenta, comprometendo a perspectiva de se chegar a 9% ao ano, em 2024. Esse cenário termina rebatendo no apetite a risco do investidor.

“A tendência é que a Bolsa continue andando de lado”, diz o CEO da Multipike, Volnei Eyng. “Com os juros americanos nas alturas, e fundos entregando mais de 140% do CDI, o investidor pensa duas vezes antes de tomar risco”, afirma.

Desde o final de 2021, o Ibovespa iniciou um movimento de lateralização, entre 95 mil e 123 mil pontos aproximadamente. “Esse é um indicativo de indecisão, não há tendência definida”, diz o professor da FIA Business School, Marcos Piellusch.

Pela análise técnica, o índice chegou a uma faixa importante de preço, aos 116 mil pontos, região que se observa grande volume negociado, se tornando um patamar de suporte de preço de extrema importância, segundo os analistas.

“Caso o IBOV venha a perder o referido patamar dos 116.000 pontos, abriria espaço para uma queda maior, podendo encontrar como target o patamar do 111.000 pontos”, diz Zé Rico, analista da Rico. Por outro lado, em 2022, o índice atingiu um topo de 121 mil, quando passou a cair. Este seria o ponto de resistência para os grafistas e que precisaria ser rompido para abrir a perspectiva dos 130 mil pontos.

Otimistas versus pessimistas

Do ponto de vista fundamentalista, é possível afirmar que a bolsa brasileira está desvalorizada e deveria operar no patamar dos 130 mil pontos, dada as condições atuais de queda de juros e de menor ruídos em relação à política fiscal.

O cálculo é obtido pelo índice preço-valor patrimonial (P/VPA) do Ibovespa, que mede a relação entre o valor de mercado e o valor contábil das empresas. “Historicamente, o índice P/VPA das empresas brasileiras é de 1,7 vezes nos últimos 10 anos”, conta o professor Piellusch. Atualmente, esse indicador está em 1,48. Assim, segundo o especialista, o Ibovespa deveria estar em aproximadamente 131 pontos para que o indicador esteja na média.

A razão para que o P/PVA do IBOV não esteja no patamar histórico está relacionada à política monetária restritiva dos EUA e de outros países. Por isso, a previsão para que o índice brasileiro atinja os 130 mil pontos ficou para depois, quando o Fed iniciar o processo de redução de taxas. “É possível que isso ocorra apenas no próximo ano”, diz o professor.

Mesmo para os mais otimistas, o momento é de cautela. “A nossa expectativa é positiva até o final do ano, mas não descartamos uma correção no curto prazo”, diz Thiago Lourenço, operador de renda variável da Manchester Investimentos. “Há empresas negociando a múltiplos de 15 anos atrás e isso é atrativo, os riscos já estão no preço”, afirma.

Segundo Lourenço,  o preço barato dos ativos, aliado à melhora da economia, inflação em níveis aceitáveis e corte de juros expressivos até o momento, estimulam o mercado. “Vamos começar a ver as empresas melhorando suas expectativas nos próximos balanços do 3º e 4º trimestres, com retomada de investimento e nível de gasto menor. Isso movimenta a economia”, diz, não descartando uma correção de curto prazo que leve o mercado para 110 mil pontos para depois ganhar impulso, “rompendo a máxima de 123 mil deste ano”.

Na ponta contrária, a visão é de que não há possibilidade de a bolsa quebrar novos recordes ainda em 2023. “A própria bolsa americana, que é referência, está com certa dificuldade por conta da política restritiva do Fed“, diz o sócio da Multinvest Capital, Osvaldo Morais.

Três aspectos a serem considerados

Para Stefany Oliveira, analista da Toro Investimentos, há três aspectos que devem ser levados em consideração para chegar aos 130 mil pontos.

O primeiro já está acontecendo, que é a política expansionista no Banco Central brasileiro optando pelo corte de juros, movimento que estimula tração compradora. O segundo foco é a resiliência dos dados econômicos domésticos. Enquanto a inflação estiver sob controle, o cenário positivo está dado. E o terceiro, e mais importante, é o cenário internacional.

“Se conseguirmos observar um cenário de melhora de inflação no restante do mundo, poderemos ver um movimento comprador na bolsa e assim chegar aos 130 mil pontos”, diz Oliveira.

Confira um resumo das análises dos agentes de mercado ouvidos pelo E-Investidor:

Zé Rico, analista da Rico

“No tocante à análise gráfica do IBOV, observa-se que o ativo se encontra em um canal lateral, mostrando uma consolidação ampla que abrange dos 96 mil aos 121 mil pontos. Caso o índice venha a perder o referido patamar dos 116 mil pontos, abriria espaço para uma queda maior, podendo encontrar como target o patamar do 111 mil pontos.

Contudo, caso o IBOV consiga negociar acima da faixa de preço dos 116 mil aos 117 mil pontos, podemos observar o preço buscando novos patamares, encontrando a principal barreira nos 121 mil pontos, sendo essa região uma resistência ou preço psicológico significativo do referido ativo.

Em relação ao tempo para que o Ibovespa possa buscar os 130 mil pontos, dependerá de diversos fatores macroeconômicos, porém, segue-se otimista com a previsão de ciclo de baixa de juros, de forma que, caso o IBOV consiga até o final do mês de setembro negociar acima dos 117 mil pontos, acredita-se que até o final do ano possamos vê-lo testar o patamar dos 121 mil. Com o rompimento dessa nova região de preço, espera-se, em tom otimista, o teste dos 130 mil até antes do final de 2024.”

Stefany Oliveira, analista da Toro Investimentos

“O tom utilizado pelos dirigentes do Fed na conferência com a imprensa (na quarta-feira, 20) foi sinalizando que as taxas nos EUA se mantêm um pouco mais altas. O mercado espera o movimento mais alto até 2024.

Isso traz preço de baixa para o Ibovespa. Primeiro porque o movimento de juros mais altos lá fora provoca movimento de evasão de capital de mercado emergentes como o Brasil. A minha expectativa é que, se o Ibovespa continuar assim, abre espaço para perder o suporte de 114.500 pontos e, se perder esse suporte, ele abre espaço para mais de 6 mil pontos de queda. No entanto, se observarmos o movimento mais esticado da curva de juros lá fora, quando o cenário de correção acontecer vai trazer o movimento reverso para o IBOV.

Não acredito em 130 mil numa ótica mais curta, de semanas ou meses. No entanto, na ótica mais longa, talvez até o final do ano, ainda exista espaço de movimento de recuperação do Ibovespa e um retorno do movimento comprador amparado por 3 aspectos: política monetária expansionista doméstica, resiliência dos dados econômicos e melhora na inflação global.”

Osvaldo Morais, sócio da Multinvest Capital

“A Bolsa dificilmente chegará em 130 mil pontos no curto prazo. A bolsa bateu 130 mil em junho de 2021 e, de lá pra cá, cedeu bastante e chegou a bater 115 mil e fez várias tentativas de bater 120 mil e, quando batia, ela voltava. A bolsa tem uma resistência em 120 mil e os motivos são vários. É a própria bolsa americana, são as bolsas europeias, é a conjuntura da Ásia…

Quem puxa a nossa Bolsa são as commodities, Vale, Petrobras e bancos. Vale está com dificuldade do minério, que tem caído no preço por conta da desaceleração daChina. As dificuldades da Petrobras são velhas conhecidas, manipulação do preço dos combustíveis.

A própria bolsa americana, que é referência, está com certa dificuldade de andar pra frente porque já bateu num patamar elevado e só vem andando em dificuldades por conta da política restritiva do Fed de aumentar as taxas.

Enquanto o Brasil não equacionar as contas públicas e enquanto a China não mostrar a força de crescimento para puxar Vale e consumo, eu vejo com bastante pessimismo essa marca de 130 mil.”

Marcos Piellusch, professor da FIA Business School

“Analisando sob o ponto de vista fundamentalista, podemos dizer que, atualmente, a |Bolsa brasileira já está desvalorizada e deveria estar no patamar de 131 mil pontos aproximadamente.

Esse cálculo foi obtido usando o índice preço-valor patrimonial do Ibovespa, que mede a relação entre o valor de mercado e o valor contábil das empresas. Historicamente, o índice preço-valor patrimonial das empresas brasileiras é de 1,7 vezes nos últimos 10 anos, mas atualmente esse indicador está em 1,48.

Assim, o Ibovespa deveria estar em aproximadamente 131 mil pontos para que o indicador esteja na média.

A razão para que o indicador não esteja no patamar histórico está relacionada com a política monetária restritiva adotada, sobretudo pelos bancos centrais dos Estados Unidos e de outros países, que atraem os capitais para a renda fixa estrangeira, retirando investimentos da bolsa dos países emergentes e desvalorizando as ações.”

Thiago Lourenço, operador de renda variável da Manchester Investimentos

“A nossa expectativa é positiva até o final do ano, mas a gente não descarta correção no curto prazo. Não descartamos que o mercado volte a testar a região de 110 mil pontos até o final do mês, ou início de outubro, mas o movimento de corte de juros (Selic) é construtivo para a questão econômica e já temos um corte expressivo de 1%.

Para o mercado, isso resulta em melhora na condição das empresas e a gente deve ver, nos balanços de terceiro e quarto trimestre, resultados com melhoras na expectativas. Talvez o resultado não venha, mas o mercado trabalha com expectativa. Então, a perspectiva é de romper a máxima desse ano de 123 mil pontos e a nossa expectativa para final do ano é que a região dos 130 mil pontos pode ser testada.

Para 2024 continuamos otimistas, mas não dá para descartar que o mercado americano fique mais pesado e isso dificulta o fluxo aqui. No mercado interno, com a redução dos juros, veremos o fluxo crescente da renda fixa para ações.”

Max Bohm, estrategista de ações da Nomos

“O balanço de risco e expectativa dos investidores mudou um pouco depois da decisão da quarta-feira (20), que deu força para os juros americanos permanecerem altos por um tempo maior. Em paralelo, eu entendo que a missão do Banco Central de cair a taxa Selic, ganha agora um impeditivo, mesmo que a inflação esteja controlada e tenha uma situação fiscal mais estável.

Não se consegue cair os juros para 8%, 9% porque o diferencial de juros em relação à taxa de juros americana vai ficar pequena e isso não faz sentido. Então, o BC aqui tem um novo piso e acho que trabalha agora com 10%.

Com isso, aquela expectativa que poderia contribuir com a redução das despesas financeiras, com o crédito mais acessível, custo de dívida mais baixo fica prejudicada, atingindo setores cíclicos domésticos que são mais sensíveis a juros, como consumo, varejo, construção civil e tecnologia.

Quando o dinheiro vier, e mesmo através de investidores institucionais, se dará em setores menos sensíveis a juros. Bancos podem performar, commodities, setor elétrico, Telecom. Os setores mais defensivos podem ter melhor desempenho.”

Volnei Eyng, economista e CEO da Multiplike

“Os estrangeiros são responsáveis por mais de 50% de todo o nosso movimento. Em agosto, por exemplo, quando o Ibovespa caiu por 13 pregões seguidos, eles venderam R$ 13,2 bilhões em ativos. O motivo é muito simples. O dinheiro está saindo do Brasil e indo para osEUA

O investidor institucional estrangeiro, que precisa entregar rentabilidade, prefere alocar os recursos nos Estados Unidos, mercado mais líquido e seguro do mundo e garantir uma rentabilidade de praticamente 0,5% ao mês na renda fixa e com segurança. O dinheiro continua saindo do Brasil e de diversos mercados emergentes em todo o mundo e levará um tempo até estes recursos retornarem. Enquanto isso, a tendência é que a bolsa continue andando de lado.

Com os juros americanos nas alturas e fundos entregando mais de 140% do CDI, o investidor pensa duas vezes antes de tomar risco. Tradicionalmente, no Brasil, num investimento conservador, é possível dobrar o capital investido num período entre 5 e 6 anos. Isso é emocionalmente confortável para o investidor. O que vimos no passado, taxa de juros em 2%, será difícil vermos este cenário novamente.”