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O que fez a Bolsa cair 3% em outubro? Três pontos explicam o desempenho ruim

O Ibovespa foi o terceiro pior investimento para o mês, segundo levantamento do consultor Einar Rivero

O que fez a Bolsa cair 3% em outubro? Três pontos explicam o desempenho ruim
Avanço das treasuries rouba fluxo da Bolsa brasileira. Foto: Amanda Perobelli/Reuters
  • Três fatores foram determinantes para acorrentar a performance do principal indicador de ações da B3 no campo negativo em outubro: o avanço dos títulos do Tesouro Americano, a guerra em Israel e os ruídos em relação ao fiscal no Brasil
  • Sobre o Tesouro Americano, as “treasuries”, como são conhecidos esses papéis dívida, se mantiveram em patamares elevados durante todo o mês. Já os conflitos no Oriente Médio aumentaram a aversão a risco
  • O último golpe ao Ibovespa em outubro ocorreu na última sexta-feira (27), quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) declarou que “dificilmente” o Governo iria conseguir entregar a meta fiscal de déficit zero no ano que vem

Dos 21 pregões da Bolsa brasileira em outubro, 12 sessões foram de baixa, contra apenas nove pregões de alta. O Ibovespa fechou o mês com uma queda acumulada de 2,94%, aos 113.143,67 pontos, consolidando o índice como o terceiro pior investimento do período, atrás de empresas pagadoras de dividendos (representadas pelo IDIV) e Small Caps (empresas de baixa capitalização). O levantamento foi feito pelo consultor financeiro Einar Rivero.

Por trás do cenário amargo, há três fatores determinantes que explicam a performance do principal indicador de ações da B3: o avanço dos títulos do Tesouro Americano, considerado o principal driver para a queda do IBOV, a guerra em Israel e os ruídos em relação ao fiscal no Brasil.

Sobre o Tesouro Americano, os “treasuries”, como são conhecidos os papéis de dívida, se mantiveram em patamares elevados durante todo o mês. O título americano de prazo para 10 anos, uma das principais referências desse mercado de dívida, viu seus rendimentos subirem de 4,18% para o patamar recorde de 4,89%, segundo dados de Rivero e Investing. A escala dos “T-Notes” no mês ocorre na esteira da percepção de que os EUA terão juros altos por mais tempo.

Para conter a inflação no país, o Federal Reserve (Fed, banco central americano) passou a subir os juros, hoje entre 5,25% e 5,5% ao ano, maior nível em 22 anos. E a expectativa é de que a autoridade monetária continue a elevar as taxas, já que a economia americana não dá sinais de desaquecimento.

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“A economia americana ainda está acelerando e os dados de emprego também estão fortes”, afirma Bruce Barbosa, sócio-fundador e analista de ações da Nord Research. “O Fed foi claro e sinalizou que precisaria manter os juros mais altos por mais tempo, até ameaçou subir a taxa um pouco.”

Por aqui, entretanto, juros altos nos EUA significam diminuição da atratividade do mercado acionário. Isto porque as treasuries são consideradas os ativos mais seguros do mundo e, quando as taxas desses papéis sobem, os investidores globais engatam um movimento de evitar riscos, principalmente em países emergentes, e voarem para a renda fixa americana.

De acordo com a B3, entre 1 e 26 de outubro, o fluxo de investimento estrangeiro na bolsa brasileira estava negativo em R$ 2,5 bilhões. “Outubro foi mais um mês em que o ambiente fora do Brasil deu as cartas”, afirma José Cataldo, head de research da Ágora Investimentos. “Houve uma preponderância global sobre o ambiente local.”

Essa também é a visão de Gabriel Bassotto, analista chefe de ações do Simpla Club. “Só vai ocorrer uma virada nesse fluxo de capital estrangeiro na B3 e no Ibovespa quando a situação nos EUA se acalmar. Enquanto as treasuries estiverem com uma volatilidade muito grande, não sabemos o que vai ser do Brasil e dos demais mercados emergentes”, afirma. “As taxas nos EUA precisam estabilizar, mesmo que em um patamar mais alto.”

Em paralelo, a guerra entre Israel e o grupo terrorista Hamas, iniciada em 7 de outubro, também intensificou a aversão a risco no mês. No primeiro pregão após o início dos conflitos (9 de outubro), os barris de petróleo Brent e WTI avançaram 4,22% e 4,34%. Contudo, os impactos sobre os ativos devem se restringir ao curto prazo.

“Nos primeiros dias havia o receio de que o conflito escalasse e tomasse uma proporção maior, envolvendo outros países do Oriente Médio, como o caso do Irã (produtor de petróleo)”, afirma Bassotto. “Como vimos, o conflito não escalou e até o temor que tínhamos em relação ao impacto no petróleo, já está se dissipando.”

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Já para Bruna Sene, analista da Nova Futura Investimentos, se a escalada do conflito está saindo do radar, as altas recentes do petróleo podem inflar as preocupações com a política monetária nos EUA. “A conjunção de um aumento nos preços do petróleo, um mercado de trabalho competitivo e uma economia ainda aquecida podem acelerar a inflação nos próximos meses, continuando a impactar as taxas de juros de longo prazo”, afirma.

 

Cenário fiscal: o último golpe

O último golpe ao Ibovespa em outubro ocorreu na última sexta-feira (27), quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) declarou que dificilmente o governo iria conseguir entregar a meta fiscal de déficit zero no ano que vem, prometida no Arcabouço Fiscal.

Na data da declaração, o IBOV fechou em baixa de 1,29%. “O presidente deveria dar uma sinalização de que o País tem uma meta. Só que ele detonou essa meta e descredibilizou seu ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT)", diz Barbosa, da Nord Research. “A equipe econômica vinha trabalhando para convencer o mercado de que a meta de déficit zero era possível. Se o mercado já não acreditava antes, agora vai acreditar menos ainda.”

Para Barbosa, o principal efeito dessa perspectiva de não cumprimento da meta é o avanço dos juros futuros e das perspectivas para a inflação. Juros e inflação mais altos significam também maiores dificuldades para a população tomar empréstimos e das empresas financiarem suas atividades. Essa situação, com os títulos de dívida dos EUA em alta, são uma combinação danosa para a bolsa brasileira.

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O sócio-fundador da Nord não recomenda a compra de ações ligados ao cenário doméstico, mas exportadoras de commodities. “O nosso governo sem meta fiscal tira a confiança de qualquer um que queira investir no Brasil. Afinal, você não vai emprestar dinheiro para alguém que não consegue economizar, é compulsivo, gastador, que é o nosso caso”, diz Barbosa. “Talvez o fluxo que entre seja nosso mesmo, de pessoas físicas indo para a bolsa.”

Cataldo, da Ágora, e Sene, analista da Nova Futura, também recomendam uma carteira mais resiliente aos possíveis solavancos do mercado nos próximos meses. “É importante seletividade na escolha dos ativos”, diz Cataldo. “Preferimos empresas com previsibilidade de receita, como as do setor elétrico, que sejam pagadoras de dividendos, mais defensiva.”

“O momento é de manter uma carteira equilibrada, um pouco mais defensiva, e composta por ativos de qualidade. Oportunidades mais curtas podem surgir para quem acompanha a análise gráfica e movimentos mais curtos do mercado. E a diversificação é sempre o melhor caminho”, afirma Sene.

Bassotto, por sua vez, diz que as falas do presidente Lula foram "infelizes", mas ainda assim tem uma expectativa positiva para o mercado brasileiro quando houver estabilidade dos juros nos EUA. Para o analista, o Brasil tem um cenário “relativamente” melhor do que a de outros países, com taxa de juros alta e atrativa, embora já tenhamos iniciado os cortes na Selic.

Na visão do especialista da Simpla, as oportunidades estão justamente nas empresas mais doméstica, expostas ao ciclo de juros. “Obviamente essas companhias podem ter no curto prazo uma leve pressão por causa de todo esse efeito econômico, mas estão descontadas e sendo empresas boas, sustentáveis e para o longo prazo, são boas oportunidades”, diz. Bassotto cita como exemplos de setores interessantes, o segmento de aluguel de veículos e construtoras.

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