

A pesquisa divulgada pelo Datafolha na última sexta-feira (14) trouxe para a mesa do mercado um terceiro elemento para um ano que, até então, prometia ser focado na dinâmica internacional com a volta de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos e na trajetória fiscal do Brasil. Na verdade, o que houve foi uma antecipação de um tema que só entraria na pauta em 2026, mas que parece ter começado a fazer preço nos ativos locais com 85 semanas de antecedência: as eleições presidenciais.
A pesquisa do Datafolha mostrou que a aprovação do presidente Lula (PT) caiu de 35% para 24% em dois meses. É o pior índice dos três mandatos do petista na Presidência. A reprovação do governo também é recorde e subiu de 34% para 41% desde dezembro.
A queda da popularidade de Lula foi noticiada já no final do pregão da sexta-feira, mas gerou impacto nos mercados em um dia que já era positivo. Lá fora, as surpresas positivas em relação às tarifas recíprocas de Trump, nos EUA, criavam um ambiente de apetite a risco – mas, para especialistas, isso acabou fora do foco após a chegada da pesquisa do Datafolha. O dólar, que estava em queda ante o real, acelerou o ritmo até cair a R$ 5,69 pela primeira vez desde o início de novembro. O Ibovespa, que também já tinha um pregão de valorização, engrenou até terminar a sessão com um salto de 2,7%, no maior nível de encerramento desde meados de dezembro.
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“A reação do mercado foi muito mais pautada pelo resultado da pesquisa do que pela questão das tarifas do Trump”, diz Marco Noernberg, head de renda variável da Manchester Investimentos. “Lá atrás, esperava-se que uma possível reeleição de Lula fosse factível. Mas essa queda de popularidade abrupta fez o mercado mudar a visão.”
Lula para baixo, mercado para cima
Especialistas explicam que a euforia causada pela pesquisa do Datafolha passa pela expectativa de agentes econômicos que, em um cenário de baixa popularidade, as eleições de 2026 possam trazer uma mudança na agenda econômica que, até aqui, desagrada o mercado. Boa parte da queda vista na Bolsa em 2024 teve a ver com uma reprecificação negativa dos ativos brasileiros dado à piora das expectativas para inflação, juros e câmbio.
“Grande parte da situação que estamos vivendo hoje é por causa desse turbilhão de notícias que envolvem a questão de gastos, com o atual governo gastando mais e poupando menos. Uma mudança mais para centro-direita, que olhe para a questão econômica de contas públicas, deve ter um impacto positivo”, destaca Noernberg, da Manchester. “O mercado está entendendo que a Bolsa está comprimida demais e pode subir muito forte se tivermos um governo que olhe mais por essa lógica da economia.”
Para especialistas, o movimento da sexta-feira – apesar de exacerbado – foi um ajuste natural de uma Bolsa que vinha há muito tempo sendo descontada. Mas Rodrigo Cohen, analista de investimentos e co-fundador da Escola de Investimentos, destaca que não dá para atribuir o salto do Ibovespa somente ao Datafolha.
“É óbvio que as quedas de popularidade do Lula fazem com que o mercado se anime, porque ele não é um presidente market-friendly. A mesma coisa aconteceu com o Milei, na Argentina”, destaca. Mas, para frente, o analista vê outros fatores voltando a fazer mais peso. “O principal, na minha opinião, é o que temos em relação ao mercado do cenário externo, com o Donald Trump não cumprindo as promessas tão grandes que ele tinha falado em relação à tarifação, principalmente, em virtude do nacionalismo que ele tem em relação aos Estados Unidos.”
Cedo demais para pensar em 2026?
Ainda que o tema comece a respingar na pauta do mercado, ainda falta muito tempo para que as eleições de 2026 efetivamente aconteçam. Na avaliação do JP Morgan, a notícia da queda de popularidade de Lula é um dos poucos gatilhos favoráveis ao investimento no Brasil no momento, mas que chama a atenção dado o bom desempenho do mercado no ano, e não porque já seria a hora de se posicionar pensando na disputa política do ano que vem.
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“Para aqueles que não estão investidos, há uma clara sensação de ‘FOMO’. Até mesmo nossa mesa detectou isso: quando os preços estavam mais baratos do que agora, não havia compradores, mas, conforme os preços subiam, mais pessoas se interessavam. E isso vem com notícias na frente política, que é um dos poucos gatilhos locais”, explica o time comandado por Emy Shayo em relatório publicado nesta segunda-feira (17).
O JP Morgan destaca que, em anos anteriores, a eleição só começou a fazer preço seis meses antes da votação. Até lá, o governo tem tempo para readequar as estratégias e ganhar apoio da população novamente. Algo que o PT já fez em ocasiões anteriores, destaca o banco: “Em 2014, o governo adotou medidas pouco ortodoxas para ajudar a atrair o eleitorado, o que abriu o caminho para a presidente Dilma aumentar sua popularidade após o protesto estudantil de 2013 e ser reeleita no ano seguinte. Em 2005, após o escândalo do ‘mensalão’, a popularidade do presidente Lula caiu, mas uma economia em expansão fez de sua reeleição em 2006 uma vitória fácil.”
O problema, do ponto de vista econômico, é que esses momentos de virada costumam vir acompanhados de aumento de gastos públicos. Em um momento em que a maioria dos agentes econômicos cobra o governo para reduzir o orçamento para tentar equilibrar a trajetória da dívida – como mostramos aqui, a preocupação com o macro fez o mercado voltar a falar de “dominância fiscal”.
Para Flavio Conde, head de renda variável da Levante Ideias de Investimentos, o mercado “esqueceu” dessa possível consequência. “Foi mesmo um movimento eufórico, porque não foi tudo ponderado na balança. Querem tanto que o Lula não seja reeleito que não se importaram com a possibilidade dele gastar um monte para reverter isso.”
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Ele levanta um outro ponto, que também é destaque no relatório do JP Morgan, e que o faz manter o ceticismo com o impacto das eleições de 2026 no mercado no curto prazo. Ainda que a popularidade presidencial tenha caído, não há um oponente claro de que possa tomar o lugar em 2026. “Lula não só tem tempo para reagir, como não existe ninguém claramente perto dele como candidato. O Bolsonaro, que seria um, está inelegível”, destaca o head da Levante. Uma pesquisa de janeiro da Quaest indicou que, se as eleições fossem agora, Lula venceria todos os cenários de 2º turno.