Isto porque as projeções apontam para uma taxa Selic em 15% ao ano até o final de 2025 e acima dos dois dígitos até 2028. Esse desenho, entretanto, não assusta a varejista, que nesta terça-feira (1º) comemora marcos históricos em sequência. Há 20 anos, a Renner foi a primeira companhia a ter a totalidade das ações negociadas na Bolsa de Valores, sem controlador definido, após a saída da rede americana JC Penney do quadro acionário. Também faz duas décadas que a Lojas Renner está listada no Novo Mercado, um grupo seleto que reúne as empresas com maior nível de governança corporativa da B3. De lá para cá, segundo levantamento feito pela Elos Ayta, a LREN3 subiu 1.447%. No mesmo período, a valorização do Ibovespa foi de 315%.
No total, são 60 anos de experiência no varejo – e de adaptação aos diversos ciclos e crises da economia brasileira. Agora, com o maior nível de juros desde 2006, essa capacidade de se adaptar será testada novamente. “Trabalhamos muito em encurtar os nossos ciclos produtivos e sermos mais responsivos à demanda”, diz Fabio Faccio, CEO da Lojas Renner, em entrevista ao E-Investidor. “Dessa forma, temos uma empresa mais sustentável e que gera valor ao acionista porque produzimos o que é necessário, o que está sendo consumido e nada em excesso. Evita desperdício e prepara a empresa tanto para bons quanto para maus momentos.”
Apesar de estar preparado para o pior, Faccio não transparece pessimismo. O executivo vê as ações da Lojas Renner, que já sobem mais de 60% no ano, como descontadas. “Acreditamos tanto nisso, que temos em curso o maior plano de recompra da nossa história”, afirma o CEO, que planeja abrir pelo menos 26 lojas físicas em 2025.
E-Investidor – O que foi essencial para a Renner conseguir navegar esses 20 anos de Novo Mercado trazendo resultados?
Fabio Adegas Faccio – Desde a fundação da Renner nós sempre tivemos um foco muito grande nos clientes e isso continuou sendo a essência: o engajamento do time com o propósito de gerar encantamento. Estamos sempre em busca de evoluir e inovar para continuar superando as expectativas dos clientes e gerando valor para os acionistas. Eu diria que nesse período, principalmente por sermos uma empresa com mais de 100 mil “donos”, reforçamos ainda mais as nossas práticas de ESG (boas ações sociais, ambientais e de governança dentro de empresas). Já vinha das raízes da empresa desde sempre, mas nessas últimas duas décadas nos destacamos ainda mais em inovação e sustentabilidade.
Lógico que tivemos altos e baixos ao longo da nossa história. Momentos mais difíceis, como na pandemia, mas, se olharmos do período de 2005 até 2024, a nossa receita operacional bruta saiu de R$ 1,5 bilhão para R$ 18,4 bilhões.
O “aniversário” vem em uma boa fase nos números. No primeiro trimestre houve crescimento do lucro líquido, vendas e margens, além de diminuição da inadimplência. Quais estratégias foram implementadas para alcançar esses resultados?
Nós viemos de um investimento muito grande, feito nos últimos dois ou três anos, na melhoria do nosso negócio. Tanto na parte da melhoria de moda, de termos mais assertividade nas nossas coleções, como na disponibilização de mais ferramentas para o nosso time de desenvolvimento e uma integração maior com a nossa rede de fornecimento de forma digital, com uso de inteligência artificial (IA).
Investimos muito para sermos uma empresa cada vez mais conectada, digital, encantadora. Estas características têm sido reconhecidas pelos clientes, o que acaba gerando resultados crescentes também no nosso balanço, para o nosso acionista. Mesmo em um cenário desafiador, temos um plano de investimento bastante robusto, em torno de R$ 850 milhões de reais para serem investidos no ano. Devemos aumentar o número de lojas novas em relação aos anos anteriores. Queremos abrir de 15 a 20 lojas da marca Renner, de 10 a 15 lojas da marca Youcom e de 1 a 2 lojas da Camicado, o que mostra o potencial da empresa em cenários difíceis continua sendo importante.
Mas como a Lojas Renner tem se preparado para o cenário esperado de juros em 15% por mais tempo e uma possível desaceleração do consumo no segundo semestre?
Juros altos não ajudam ninguém, é um cenário difícil para o nosso País, mas estamos com uma performance positiva mesmo assim. Com todos esses investimentos, nos preparamos para sermos uma empresa mais flexível e preparada para lidar com qualquer situação. Trabalhamos muito em encurtar os nossos ciclos produtivos, desde o desenho dos produtos e captura das tendências, até chegar nas nossas lojas, sites e aplicativos. Logo, conseguimos ser mais responsivos.
Produzimos só o que é necessário e ajustamos os estoques para a demanda. Se o mercado está mais aquecido a gente consegue ter uma produção maior, se o mercado desaquece e temos um cenário mais difícil, conseguimos rapidamente ajustar os estoques. Assim, temos uma empresa mais sustentável e que gera valor ao acionista porque produzimos o que é necessário, o que está sendo consumido e nada em excesso. Evita desperdício e prepara a empresa tanto para bons quanto para maus momentos.
E esses investimentos serão o suficiente para frear o aumento da inadimplência na carteira com juros de 15% ao ano?
Mesmo com o ambiente tão difícil vemos uma inadimplência bastante controlada, no nosso caso, caindo. Na nossa empresa, investimos muito no time de moda, operações de varejo e muito também na nossa financeira, a Realize.
Investimos muito na qualidade do nosso time na Realize e na melhoria das ferramentas tecnológicas para a decisão (de crédito). Então mesmo em um cenário desafiador, vemos a inadimplência em queda e temos uma carteira bastante controlada.
As ações da Lojas Renner já sobem quase 60% no ano, mas estão longe dos patamares pré-pandemia. O que falta para essa retomada?
Por mais que a ação da Renner tenha subido bastante nesse ano, ela ainda tem muito potencial para subir. Acreditamos tanto nisso, que temos em curso o maior plano de recompra da nossa história. Do nosso lado, acho que a consistência na entrega dos resultados vai gerar uma confiança cada vez maior nos acionistas. Mas tem uma parte desse valor (a ser destravado) que vem de termos uma segurança maior no País, no cenário macro, e da própria situação da taxa de juros.
Quando é feita uma redução na taxa de juros de um país, o valor de todas as empresas aumenta porque o custo de capital fica menor. Então os múltiplos respondem à eficiência das organizações e a um cenário macro que quanto maior for a diminuição do risco, maior será a confiança no país. Espero que em breve possamos ter uma redução da taxa de juros.
Qual a análise sobre a situação atual do varejo, de forma geral, e as perspectivas para os próximos meses?
O varejo brasileiro é um varejo muito moderno, com empresas muito competentes. E o varejo de moda, especificamente, vem performando muito bem – as empresas que operam no Brasil estão crescendo cada vez mais em qualidade e competência. É um setor que batalha muito, gera muito emprego, movimenta bem a economia e merecia ser melhor reconhecido em geral pela importância na economia do País.