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Educação Financeira

Do arroz à batata, alta da inflação tira mais dinheiro do seu bolso; veja como se proteger

Alimentos e bebidas apresentaram avanço expressivo recentemente, segundo dados do IBGE

Do arroz à batata, alta da inflação tira mais dinheiro do seu bolso; veja como se proteger
Inflação medida pelo IPCA teve avanço de 0,46% em maio puxada pelos alimentos e pelas bebidas, que tiveram alta de 0,62% na comparação com abril. (Foto: Nejron Photo em Adobe Stock)

Batata, café, leite, cebola… Alimentos comuns no dia a dia dos brasileiros estão ficando mais caros. E não há apenas uma explicação que dê conta do movimento. Talvez a crise climática do Rio Grande do Sul seja o fator mais aparente do quadro, mas nem de longe é o único. Fenômenos cíclicos, safras ruins e alta nos tributos estaduais contribuem para que a situação seja mais complexa.

Enquanto técnicos e especialistas procuram respostas para o momento, muitos trabalhadores se veem obrigados a tirar a calculadora da gaveta e mudar hábitos de consumo, para que sobre algum dinheiro no final do mês. Por razões matemáticas, quanto menor a renda de uma família maior será seu gasto com consumo, proporcionalmente falando. É aí que as coisas começam a se complicar.

Um indicativo do momento delicado pode ser visto pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que registrou avanço de 0,46% em maio. A variação do indicador oficial da inflação no País veio maior do que o esperado e foi puxada pelos alimentos e pelas bebidas, que tiveram aumento de 0,62%, na comparação com abril, conforme apresentado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

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Entre os itens que mais chamaram a atenção no mês está a batata-inglesa (aumento de 20,61%) e o leite longa vida (5,36%) — tornando proibitivo o bom e velho purê de batatas. Mas não só: os preços da cebola e do café moído também devem ter assustado quem visitou o supermercado nas últimas semanas: aumento de 7,94% e 3,42% respectivamente.

O efeito da inflação

No entanto, compreender a fundo o impacto do aumento demanda mais do que a análise dos números. Isso porque o IPCA mostra uma média nacional de preços. Em seus 8,5 milhões de quilômetros quadrados, o Brasil apresenta diferenças locais que a frieza dos dados não consegue traduzir. A começar pelo ciclo de cada item (ou commodity) produzido.

O mercado de hortaliças, por exemplo, funciona regionalmente e muito impactado pelo regime das chuvas. “A alface teve aumento de 1,86% no País, mas se pegar só Porto Alegre a alta foi de quase 15%”, explica Jefferson Mariano, analista socioeconômico do IBGE.

Casos como o das hortaliças apresentam grande variação de um mês para outro. Isto é, estão submetidas a ciclos mais curtos. Já para itens como leite e arroz, a lógica reflete ciclos longos: se a safra for comprometida, toda a produção anual pode ser impactada. E quando há um choque de oferta, muito provavelmente há redução do poder de compra do outro lado.

Amanda Pereira Silva, assistente de coordenação pedagógica, conta que nas últimas semanas deixou de comprar pelo menos dois produtos entre os que mais subiram em maio: a batata, que encontrou a R$ 12 o quilo; e o pacote de 500g de café, vendido a R$ 18 no supermercado. Mesmo assim, mantém o costume de fazer compras maiores, em atacadistas ou feiras livres, para cozinhar em casa.

Os preços praticados por restaurantes por quilo e “prato-feito” impedem que estes sejam aliados dos trabalhadores. “Se for almoçar fora, gasto de R$ 25 a R$ 30, sem bebida”, justifica Silva sobre a decisão de levar as refeições de casa para o trabalho. Atenta à saúde, a assistente de coordenação pedagógica também não vê motivos para mudar o hábito: “A comida [na rua] não é saborosa, além de conter muita gordura e sal”, complementa.

Amanda está inserida na classe média brasileira. Nesse segmento é comum que os consumidores troquem um determinado produto por outro; a marca favorita de manteiga por uma mais simples, um corte de carne mais caro por um mais em conta. Para esses cidadãos existe margem de manobra para readequações do orçamento, ainda que sintam a inflação atacar seu poder de compra.

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“Mas quando falamos no sujeito de baixa renda, não há muita escolha”, destaca Paula Sauer, planejadora financeira CFP pela Planejar. Com a disparada dos preços, maiores são as chance da situação levar parte da população ao endividamento. Não raramente, a armadilha está no cartão de crédito. “Se uma família com renda mensal de R$ 1,8 mil parcelar em três vezes uma compra de R$ 600 no supermercado, ela começará o mês seguinte com R$ 1,6 mil”, alerta a planejadora financeira. O efeito tende a ser o da “bola de neve”.

Para quem já está endividado, a atenção a todos os gastos recorrentes deve ser intensa. Por mais confortável que seja optar pela cobrança de débito automático, fazer uma varredura em serviços por assinatura, pacotes de canais, jogos e streamings se torna uma obrigação inadiável. “É preciso ter estratégia. Renegociar é interessante, para quitar a dívida por um valor menor”, ensina Luis Guingo, também planejador financeiro CFP pela Planejar.

Como fugir da alta dos preços?

Não raro consumidores apelam para os congelados e ultra processados em meio ao sobe e desce do preço de alimentos. Sendo categórico: o encarecimento impacta a qualidade da dieta dos trabalhadores brasileiros. Nessas horas, uma feira perto de casa ou do trabalho sempre ajuda. Para Amanda Silva, esse hábito vale a pena manter: “Com R$ 40, trago legumes, frutas e verduras para a semana toda”, relata.

A assistente de coordenação pedagógica frequenta, todas as semanas, uma feira no município de Osasco, região metropolitana de São Paulo (RMSP). No horário da xepa, às 13h, os preços ficam mais atraentes do que de costume, porque os feirantes precisam vender todas as frutas, legumes e hortaliças que serão perdidos até o próximo dia. Na tentativa de evitar o prejuízo completo, descontos de até 70% do preço podem ser negociados — vai do bom papo e do carisma de cada um.

Amanda conta que compra bandejas de legumes com apenas R$ 2, cachos de banana a R$ 4 e três pés de alface por R$ 5 na feira do bairro de Cipava. Como se não bastasse, os compradores ainda colocam em prática seu poder de pechincha com o vendedor. Vez ou outra, dá para garantir um desconto inesperado ou uma condição mais vantajosa. De quebra, as idas às feiras livres de bairro ainda contribuem com a economia local.

A título de comparação, nos supermercados mais tradicionais da capital e RMSP, uma unidade de alface era vendida na faixa de R$ 4 a R$ 7; cachos de banana, por sua vez, entre R$ 7 e R$ 12. Uma diferença expressiva para a contabilidade no final do mês. Os preços foram apurados em 25 de junho de 2024 pela reportagem do E-Investidor.

Em 2023, um levantamento da Proteste, entidade de defesa do consumidor, atestou com números aquilo que os compradores relatam na prática todos os dias. Comprar em feiras livres saía até 22% mais barato para os paulistanos e 15% mais em conta para os cariocas.

Vale a pena fazer compra do mês?

Com a variação dos preços de bebidas e alimentos, uma dúvida revisita muitos brasileiros: é melhor fazer compras grandes, para se proteger de novos aumentos, ou comprar tudo “picotado”? A vida prática tende direcionar muita gente para uma combinação de ambos os métodos.

“A compra grossa faço mensalmente em atacadista, onde consigo descontos”, explica Amanda Silva. Mas não descarta que as idas ao mercado variem de acordo com as necessidades por cada produto. Com parte dos alimentos e itens de higiene pessoal garantidos, a economia com frutas, legumes e verduras fica a cargo da próxima ida à feira.

É possível que a memória (e o medo) dos tempos de hiperinflação faça alguns trabalhadores optarem pelas famosas compras de mês. Quem nunca foi ao supermercado e se deparou com clientes empurrando carrinhos abarrotados, como quem vai estocar comida a perder de vista? Entretanto, o cenário atual não guarda qualquer relação com aquele vivido após a ditadura militar e início dos anos 1990.

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“A compra semanal ajuda, porque há flutuação dos preços”, explica Aline Soaper. Aqui vale destacar o termo “flutuação”: com avanços e regressões. Em maior escala, isso tende a ser observado nos produtos com variações de curto prazo (como as hortaliças). No entanto, o consumidor deve organizar aquilo que precisa de imediato. Sem um controle, o risco de desperdiçar dinheiro e alimentos é grande.

Além disso, é sempre recomendado planejar a quantidade de cada produto. “Saber o que sobrou da última compra para não comprar de novo”, aconselha a educadora financeira. Ainda assim, itens em promoção, sem o risco de estragarem rapidamente, acabam invertendo essa lógica. A decisão precisa ser avaliada com base na capacidade real que o consumidor tem — tanto de gastar (sem se endividar) quanto de consumir a compra.

Outros fatores que pesaram no IPCA

É comum que os Estados brasileiros ofereçam incentivos fiscais a produtores locais como forma de alavancar a atividade econômica e, consequentemente, melhorar a arrecadação de tributos estaduais. No entanto, com a aprovação da reforma tributária, algumas unidades federativas optaram por aumentar a cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).

“O ovo no Rio Grande do Sul ia sair de zero para 17% [de tributação]. Os supermercados teriam que aumentar o preço em mais de 30% para ficar com o mesmo dinheiro”, explica Fabrício Tonegutti, especialista em tributação para varejo e diretor executivo da Mix Fiscal. A medida só foi revista após o decreto de calamidade pública, em decorrência das enchentes que impactaram quase todo o território gaúcho. Ainda assim, Pernambuco, Bahia e Rio de Janeiro são alguns exemplos de entes federativos que já elevaram a cobrança do tributo em 2024.

Ainda vale ressaltar que o Rio Grande do Sul é um dos grandes produtores de arroz do País e tem peso de 8,6% na inflação nacional. Diante do cenário, o governo federal estuda maneiras de aliviar a pressão inflacionária do grão mais consumido pelos brasileiros, ao lado do feijão.

O analista socioeconômico do IBGE Jefferson Mariano ainda chama atenção para outro fator determinante na elevação dos preços dos alimentos: os combustíveis. Diferente de outros países, o Brasil carece de uma malha ferroviária extensa.

São caminhões, camionetes e outros veículos automotores que rasgam o País em todas as direções, transportando alimentos, dia sim, dia também. De modo que o grupo dos transportes pesa muito nessa equação. “Variações positivas no diesel afetam a cadeia de distribuição e, indiretamente, a alimentação”, destaca Mariano. O IPCA de maio mostrou que o preço dos combustíveis subiu 0,45%, puxado pelo etanol (aumento de 0,53%) e pelo óleo diesel (avanço de 0,51%), no período.

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*Colaborou Janize Colaço