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“A China é tão importante para o Brasil quanto os EUA”, diz Paulo Gala

O economista-chefe do Banco Master conversou com o E-Investidor sobre aversão ao risco e futuro da Bolsa

“A China é tão importante para o Brasil quanto os EUA”, diz Paulo Gala
Na avaliação do economista Paulo Gala a bolsa está muito barata. Foto: Banco Master.
  • O economista-chefe do Banco Master afirma que estímulos do país asiático devem elevar os preços das commodities
  • Ele diz acreditar que a Bolsa brasileira deve performar melhor no segundo semestre deste ano

Choque de juros nos Estados Unidos e na Europa, lockdown na China e conflito entre Rússia e Ucrânia. Juntas, essas circunstâncias têm criado a “tempestade perfeita” nas bolsas de valores mundiais e penalizado os ativos da renda variável. No acumulado do ano, Nasdaq e S&P 500 acumulam quedas de 23,13% e 14,34%, respectivamente.

Já o Ibovespa, após ter registrado queda de 10,10% em abril, se recuperou em maio e agora tem ganho geral de 5,99% em 2022.

Paulo Gala, economista-chefe do Banco Master, explica que a volatilidade atual na renda variável é incomum, especialmente para as bolsas americanas, e ocorre em momentos de forte correção e de “quase pânico”. Ele também diz acreditar que a Bolsa nacional deve ter uma performance ainda melhor no médio e longo prazo.

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Segundo ele, ainda não é o momento de ir às compras, a não ser que o investidor tenha muito estômago e capacidade de ficar nas posições por muito tempo. No entanto, na avaliação do economista, a bolsa está muito barata e há oportunidades. “A ideia é comprar ao som dos canhões e vender ao som dos violinos”, diz.

Confira os principais pontos da entrevista:

E-Investidor – Qual o peso do choque de juros nos Estados Unidos nas bolsas mundiais? 

Paulo Gala – Tem acontecido uma aglomeração de volatilidade. Isso é bastante incomum e ocorre em momentos de forte correção e de “quase pânico”. Às vezes, a bolsa fica 1 ano, 2 anos sem ter quedas maiores do que 2%. A causa básica disso é a alta de juros do Banco Central americano. O problema não foi a alta em si, mas sim uma alta maior do que se esperava. O que temos visto é uma reprecificação da taxa de juros que estava muito otimista.

Acredito que o Fed seguirá no passo de 0,5%, apesar de sempre ter um ou outro falando de 0,75%. Eles estão dispostos a fazer mais ajustes graduais de 0,5% do que poucos de 0,75%. A vantagem de mais ajustes de 0,5% é que você tem tempo para observar o que acontece.

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O Banco Central brasileiro elevou antes a taxa básica de juros do País. Por que isso não pesou no Ibovespa?

Gala – Pelo canal da alta de juros, a bolsa brasileira deveria ter caído, mas outros canais ajudaram o Brasil, como o boom das commodities, que trouxe o fluxo estrangeiro.

Quando as commodities explodiram, os estrangeiros passaram a enxergar o Brasil como o “paraíso das commodities”. O País está entre os dez maiores exportadores de petróleo neste ano, é um dos grandes players do mercado mundial de minério de ferro e o agronegócio brasileiro está indo bem. Então o fluxo estrangeiro acabou contrabalanceando essa alta de juros no Brasil, a bolsa foi às máximas, passando de 120 mil pontos (em abril).

Mas é necessário observar o setorial: a bolsa foi às máximas com bancos e empresas ligadas às commodities, não com mid e small caps. O ciclo de alta de juros no Brasil castigou muito essas empresas. Então é necessário fazer essa separação, são duas bolsas que nós temos.

Estamos vivendo um momento de incertezas causadas pelos juros mais altas, guerra entre Ucrânia e Rússia e as consequências do lockdown na China. Qual é o maior desafio para o investidor de renda variável?

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Gala – As bolsas brasileiras acabaram sofrendo um contágio, com a fuga de investidores preocupados com as bolsas dos Estados Unidos e do exterior. A bolsa brasileira era o grande destaque mundial e subiu 35% em dólar do início do ano até março. Estruturalmente, o Brasil ainda é uma boa oportunidade. O que ocorreu foi a reprecificação de risco do mundo e a mudança da trajetória dos juros nos EUA.

Olhando a médio e longo prazos, o Brasil ainda tem muita chance de se recuperar. As altas que víamos eram das commodities, principalmente Petrobras (PETR4), Vale (VALE3), PetroRio (PRIO3), siderúrgicas e bancos. Por outro lado, quem sofreu demais foram as small caps, porque são ações de baixa liquidez. Quando os grandes investidores saem, o efeito é dramático. Mas é importante lembrar que no ano que vem teremos um ciclo de cortes de juros no Brasil, com muito espaço para alta da bolsa brasileira.

Não estou falando que o Brasil está bombando, mas não há sinais de que vai entrar em recessão. O Brasil está resiliente e o preço dos ativos não está compatível com a situação estrutural macroeconômica do País.

Onde estão as oportunidades?

Gala – A bolsa brasileira está muito barata. Basta lembrar que, em março, ela havia subido 35% no ano, se observada em dólar. Quando olhamos os múltiplos, o prêmio está elevadíssimo. Temos grande chance de uma boa recuperação no segundo semestre.  Não é para sair comprando bolsa agora, só se você tiver muito estômago e uma capacidade de ficar nas posições por muito tempo, porque a correção americana ainda não acabou.

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E como identificar o momento de ir às compras?

Gala – Os clusters (aglomerações) de volatilidade são interessantes para observarmos. Quando as bolsas estão caindo 3% e 4% ao dia, é um sinal de que os nervos estão à flor da pele. Quando voltarmos para uma oscilação mais normal, quedas de 1% e 0,5%, é o sinal de que os mercados se acalmaram e digeriram o choque de juros dos EUA. Eu olharia isso para aí sim começar a montar posições no Brasil. Claro, não pode esperar demais senão o Brasil pode voltar rápido e ficar caro. A ideia é comprar ao som dos canhões e vender ao som dos violinos.

Quais setores estão valendo a pena?

Gala – Para o curto prazo, commodities, que foram bem castigadas com o lockdown na China. Bancos também, que estão surfando esse cenário de juros altos.Para médio e longo prazo, destaco mid e small caps, as cíclicas domésticas. Quando o Brasil voltar a crescer no ano que vem e a Selic voltar a cair, aí haverá um espaço muito grande para essas ações.

Há alguns meses, a China anunciou um programa de investimentos em infraestrutura, na tentativa de retomar o fôlego da economia do país. O Sr. acredita que essa medida pode reverter a desaceleração da economia chinesa?  

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Gala – A política de ‘covid zero’ castigou muito a atividade econômica. A economia chinesa parou, mas o governo não vai deixar isso se prolongar. Assim que passar essa onda de covid, o governo vai pisar no acelerador com toda a força, como conhecemos bem a China. É difícil prever quando vai passar, mas me parece que, lá para julho, os estímulos virão com força e isso será mais uma carga para preços de commodities.

Além das commodities, toda a cadeia do agronegócio se beneficia. Os outros setores também, de uma forma mais indireta, porque quando a China volta a crescer o mundo fica mais tranquilo e, quando o mundo fica mais tranquilo, os fluxos de capitais voltam para os países emergentes. Dá uma aliviada geral no cenário. Hoje estamos em uma tempestade perfeita. Tem lockdown na China, com desaceleração econômica, conflito na Rússia e Ucrânia e choque de juros nos EUA. São três eventos muito bombásticos. Quando esses eventos vão sendo desmontados, teremos um cenário muito mais tranquilo.

O investidor brasileiro precisa observar a China mais de perto?

Gala – Hoje 10% das exportações brasileiras vão para os Estados Unidos e 30% vão para a China. A China é tão importante para o Brasil quanto os EUA. Claro que os EUA tem o peso das finanças, mas deveríamos desenvolver essa cultura no Brasil de olhar para China.

Investir já é um pouco mais delicado, tem ETFs que replicam grandes empresas da bolsa de Xangai, operacionalmente é relativamente tranquilo. Mas eu sou um pouco cético em relação ao pequeno investidor sair fazendo investimentos em outros países sem o devido estudo. Tem que fazer o dever de casa, não dá para comprar sem saber. Se for para investir lá fora, precisa estudar muito bem as companhias.

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