Melhor forma de o investidor pessoa física se expor a debêntures incentivadas é através de fundos de infraestrutura. (Foto: AdobeStock)
O mercado de fundos incentivados passou por uma recuperação em 2025, mesmo com as ameaças do governo de tributar esses veículos isentos, proposta derrubada no Congresso no início de outubro. A retomada foi puxada principalmente pelos Fundos Incentivados de Investimento em Infraestrutura (FI Infra). Ainda que tenham valorizado, alguns estão sendo negociados com desconto em relação ao seu patrimônio líquido. Mas para o investidor, isso traz uma janela de oportunidade ou representa fragilidade das carteiras de investimentos desses fundos?
Mario Markus, superintendente de Renda Fixa e Crédito Privado do Banco Daycoval defende que esses deságios podem ser lidos como oportunidade de entrada e não sinais de alerta. Segundo ele, o deságio dos fundos são resultado de marcação a mercado, liquidez limitada e comportamento da pessoa física, principal cliente desses fundos.
Os investidores institucionais não têm a vantagem da isenção do Imposto de Renda (IR), restrita à pessoa física nos FI Infras. Para Markus, a ausência de grandes investidores acentua as distorções de preço. “Vários fundos estão negociando abaixo do par porque a pessoa física vê, principalmente, o quanto o fundo paga no mês”, diz.
Entre aqueles que hoje se encontram nessa condição está o fundo da Rio Bravo RBIF11, com preço na casa de R$ 72,70, o que representa um desconto de 20% em relação à sua cota patrimonial. O IRIF11, da Iridium, a R$ 8,68, tem um deságio de 18% e o CPTI11, da Capitânia, está 12% mais barato cotado a R$ 83. Todos eles são fundos listados, negociados na Bolsa de Valores.
Levantamento da Economática a pedido do E-Investidor mostra uma clara recuperação este ano dos FI Infras. Enquanto a classe deu um retorno negativo de 1,87% em 2024, de janeiro para cá os fundos já estão entregando em retorno de 11,62%.
Markus diz que parte da queda de rentabilidade observada em alguns fundos tem relação com os efeitos da marcação a mercado. Quando os preços dos títulos em suas carteiras recuam, o valor do patrimônio líquido (PL) do fundo diminui e, consequentemente, o rendimento aparente fica menor, o que pode ter levado os investidores a vender suas participações listadas.
“Se você tem uma carteira aplicada no fundo que teve uma marcação a mercado, o patrimônio líquido saiu de R$ 100 para R$ 90. Ele não vai continuar pagando R$ 1 (de rendimento mensal), vai pagar menos”, exemplifica. Na visão dele, fundos assim estão com um “belo desconto”.
“Eles têm uma rentabilidade implícita bem mais alta que os fundos abertos, só que ninguém quer comprar porque caiu muito”, diz.
Fundos geralmente são fechados
A maioria dos FI Infra é estruturada em condomínio fechado, em que não há resgates diários nem novas aplicações após a oferta inicial. O investidor só consegue sair vendendo suas cotas no mercado secundário – no caso dos listados, em negociação na Bolsa –, ou quando o fundo é encerrado, no caso dos produtos de balcão, chamados Cetipados.
Essa característica fechada dá ao gestor maior estabilidade e previsibilidade, permitindo que ele mantenha os investimentos até o vencimento dos ativos, sem precisar vender em momentos desfavoráveis, justamente quando o investidor retira a aplicação.
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Já nos fundos abertos há entradas e saídas contínuas de recursos – ao sabor do humor do investidores –, o que exige maior liquidez da carteira e pode forçar o gestor a realizar operações em condições de mercado menos vantajosas.
Ulisses Nehmi CEO da Sparta Investimentos afirma que o mercado de fundos já passou pelo pior momentoem dezembro de 2024. Para ele, 2025 vem mostrando uma recuperação expressiva nos principais segmentos, incluindo Fundo de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (Fiagros), Fundo de Investimento Imobiliário (FII) e os FI Infra.
“No ano passado a gente teve uma surpresa negativa dos investidores com os Fiagros. Isso fez com que os preços caíssem. A alta de taxa de juros também não é muito bom para o mercado imobiliário. Tudo isso fez com que vários fundos acabassem tendo quedas nos seus valores na B3“, comenta.
Nehmi pondera que ao longo de 2025 houve uma recuperação consistente, puxada principalmente pelos FI Infras. “Esses praticamente não tiveram problemas na carteira e apresentaram recuperações mais vigorosas”.
Investidor passou a exigir mais yield
Os juros elevados, com o Certificado de Depósito Interbancário (CDI, principal parâmetro de rendimento nos investimentos) pagando na casa dos 15%, também faz o investidor exigir rendimentos (yields) maiores. Aquele R$ 1 de renda mensal pago pelos fundos já não chama a atenção.
“Na medida em que o juro sobe, o investidor exige mais yield; se o retorno do dividendo em si não muda, ele vai ajustar no preço da cota, e a cota acaba caindo”, diz Giancarlo Gentiluomo, head de Fundos Alternativos da AZ Quest.
“Com o juro a 15%, obviamente, as exigências são mais altas, porque existem instrumentos concorrentes de renda fixa, como as Letras de Crédito Imobiliário e do Agronegócio (LCI e LCA), que vão pagar seus 85%, 90%, 95% do CDI”, completa.
Gentuliomo diz que essa pressão por yields mais altos pode gerar risco, caso o fundo tente acompanhar o aumento das taxas de juros assumindo mais risco de crédito. “Se o gestor tenta ajustar o retorno dele ao momento de mercado, eu acho que ele pode correr mais risco. Mas, se o mandato do fundo é o mesmo desde sempre, e ele já entrega um retorno razoavelmente gordo, ele não vai estar assumindo mais risco na carteira”, observa.
Ainda com relação aos riscos, Markus do Banco Daycoval reforça que o deságio de alguns fundos listados não tem relação com risco estrutural de suas carteiras. “São carteiras cuidadas por um profissional com muitos papeis AAA e AA. É importante ver a composição da carteira. Até 20% de papéis sem rating ainda está ok”, diz.
Relação de risco e retorno
No final, é o investidor que precisa saber o que quer, se deseja ganhar um pouco mais aceitando algum risco ou se prefere uma carteira mais conservadora. “O fundo Occam (não listado) é mais arriscado, o JURO11 (da Sparta) é mais conservador. É importante ler o material dos fundos e ver o perfil de crédito e prazos. Nos produtos Cetipados, tem que pensar em segurar até o vencimento, porque a liquidez é baixa”, afirma Fernando Siqueira, head de Research da Eleven Financial.
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O gestor da B. Side, Mauro Orefice também acredita que a conjuntura de juros elevados contribuiu para enfraquecer o fluxo para os fundos, com os investidores buscando, por conta própria, além dos LCIs, os Certificados de Recebíveis Imobiliários e do Agronegócio (CRIe CRA), as debêntures incentivadas.
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Na visão dele, isso pode se configurar com um erro de estratégia, pois a melhor forma de o investidor pessoa física se expor às debêntures incentivadas ocorre exatamente por meio dos fundos de infraestrutura.
“Comprar os papéis diretamente exige um acompanhamento bem mais próximo. É muito difícil para uma pessoa física fazer uma boa seleção de crédito. Precisa olhar balanço, endividamento, fluxo de caixa, covenants. Não é trivial.”
Orefice reforça que os FI Infra são uma forma mais eficiente de investir. “O fundo é uma boa alternativa para quem quer ter exposição ao crédito privado sem precisar acompanhar cada empresa.”