Dólar encontra suporte no Brasil: diferencial de juros alto neutraliza o risco doméstico. (Imagem: Dilok em Adobe Stock)
O dólar encerrou outubro acumulando ganhos de 1,08%, a R$ 5,3803. Apesar de fechar praticamente estável, o mês foi marcado pela volatilidade – a moeda norte-americana chegou a bater os R$ 5,5 no dia 10. Para novembro, a perspectiva é de cenário um pouco mais calmo.
Em setembro a moeda teve queda de 1,83% acumula perdas de 12,94% em 2025.
A trajetória do dólar em outubro foi influenciada por uma combinação de fatores externos e internos. Nos Estados Unidos, a paralisação temporária do governo (shutdown) suspendeu a divulgação de dados importantes, como emprego e inflação, aumentando a incerteza nos mercados.
As tensões comerciais entre a maior economia do mundo e a sua principal rival, a China, também pesaram, com ameaças de novas tarifas comerciais seguidas por recuos da Casa Branca, o que levou investidores a buscarem proteção, atitude que, por consequência, pressionou moedas emergentes, como o real. No final do mês, os dois países fecharam uma trégua em encontro entre os presidentes Donald Trump (EUA) e Xi Jinping (China) – veja os detalhes aqui.
Jerome Powell, presidente do Federal Reserve (Fed) (Foto: Yuri Gripas/Reuters)
Bruno Shahini, especialista em investimentos da Nomad, lembra que a política monetária dos EUA continua sendo a principal determinante para o movimento dólar. “Desde 2022, o país vem em uma trajetória de aperto monetário, mantendo as taxas dos Fed Funds (como são chamados os juros americanos) em patamares elevados para garantir a convergência da inflação à meta de 2%” contextualiza.
Esse cenário começou a ser distensionado em setembro, quando o Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA) anunciou cortes de juros, trazendo expectativa de mais duas quedas ainda em 2025. “Em outubro, a divulgação do CPI (índice de preços ao consumidor) veio abaixo das expectativas, o que reforça as apostas em novos cortes de juros ainda este ano“, diz Shahini.
Na quarta-feira (29), o Fed anunciou uma redução de 0,25 ponto porcentual na taxa básica de juros, para o intervalo entre 3,75% e 4,00% ao ano. Para a reunião de dezembro a expectativa da maioria do mercado financeiro é por um novo corte no mesmo patamar.
“Apenas eventos extremos poderiam demover o FOMC de realizar mais um corte de 0,25”, aponta Paula Zogbi, estrategista-chefe da Nomad.
O FOMC é o órgão do banco central americano equivalente ao Comitê de Política Monetária (Copom) do Branco Central (BC) brasileiro.
No Brasil, que ainda não entrou no ciclo de cortes, o diferencial de juros contribui para a queda no câmbio. Enquanto países desenvolvidos iniciam a redução dos juros, o BC brasileiro mantém a taxa Selic em 15% ao ano, indicando que ela deve continuar alta por mais tempo.
Diferencial de juros ajuda a controlar câmbio
Essa diferença em relação às economias centrais torna o real mais atrativo para investidores globais, que buscam rendimento maior em países emergentes. “O Brasil apresenta um diferencial de juros superior a 10 pontos porcentuais em relação aos EUA, com a volatilidade do câmbio relativamente controlada. Esses dois fatores favorecem a entrada de fluxos voltados a operações de carry trade, que buscam rendimentos mais elevados”, comenta Shahini.
Dá-se o nome de carry trade à estratégia para obter lucros com base na diferença entre o custo de empréstimo de dois países – pega emprestado no de taxas mais baixas e deixa o dinheiro rendendo naquele que oferece o juro mais alto.
Rafael Cardoso, economista-chefe do Banco Daycoval reforça esse argumento explicando que, quando o diferencial de juros se encontra muito elevado, a percepção de risco doméstico se torna secundária. “A gente sabe que momentos de flexibilização da política monetária lá fora, especialmente com juros mais altos aqui dentro, ajudam a defender o nosso câmbio.”
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O dólar mais barato, no entanto, não é exclusivo do Brasil. A política comercial de aumento de tarifas implementada pelo presidente americano Donald Trump tem enfraquecido a moeda globalmente, segundo o índice DXY, que mede o valor do dólar frente a uma cesta das principais divisas globais.
Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante encontro com a imprensa em Kuala Lampur. Rigor com contas fiscais em ano eleitoral é ponto-chave para o dólar e o mercado financeiro. (Imagem: Ricardo Stuckert/PR em Agência Brasil)
Apesar de seguir o contexto global, o câmbio no Brasil vai continuar reagindo às incertezas fiscais. Com o governo tentando equilibrar as contas com prioridade ao aumento de receitas, o debate sobre novos impostos e mudanças tributárias eleva a imprevisibilidade, trazendo pressão sobre o real.
“A grande chave é o que o governo Lula vai fazer e gastar em busca de uma popularidade perdida. Isenção de Imposto de Renda (IR), auxílios, benefícios… O quanto disso vai custar aos cofres públicos e o quanto disso vai custar ao setor produtivo”, observa Bruno Perottoni, diretor de Tesouraria do Braza Bank.
Por enquanto, lembra Shahini da Nomad, “a política monetária vem cumprindo seu papel de ancorar a inflação“. A taxa Selic, definida pelo Banco Central, está em níveis históricos muito altos – 15% ao ano.
Dólar não deve ir abaixo de R$ 5,30
Shahini diz que, para novembro, o dólar deve continuar oscilando entre R$ 5,30 e R$ 5,50, faixa que vem se mantendo nos últimos meses. Segundo ele, há demanda compradora próxima de R$ 5,30, o que limita quedas mais fortes.
“Em nossos modelos econométricos proprietários, o real aparece desvalorizado em relação ao valor justo, estimado entre R$ 4,90 e R$ 4,80”, diz, apontando que há espaço para valorização do real, embora o ritmo dessa correção seja incerto.
Em novembro, os mercados estarão atentos aos dados de inflação e emprego, que definem o rumo dos juros no Brasil e nos EUA.
Perottoni, do Braza Bank, lembra também do calendário e do fluxo corporativo de novembro, apontando o feriado de Ação de Graças no EUA como período de menor atividade externa e, para o último mês de 2025, as saídas de capitais por remessas de multinacionais, o que vai gerar pressão compradora no dólar. “Eu olharia novembro com um pouco mais de calma e dezembro com um pouco mais de preocupação”, diz.