- Em vez de passar nossas percepções de mundo, carregadas das nossas frustrações e experiências pessoais, temos que apresentar aos jovens a realidade e, a partir disso, mostrar como construir caminhos que podem levar aos sonhos deles
- Está tudo bem em comemorar uma conquista mesmo que ela não seja ainda tudo aquilo o que você deseja. Confie no processo. Sonhos grandes não são conquistados de um dia para outro
No último fim de semana, fizemos visitas a escolas públicas em busca de parcerias para reforçar nossa missão de levar educação financeira para jovens de baixa renda. Em uma delas, algo me chamou atenção: a alegria de uma menina que havia ido muito bem na primeira fase do Enem, o Exame Nacional do Ensino Médio, que aconteceu no último domingo, dia 21 de novembro.
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A comemoração dela era de quem já havia passado no vestibular de Medicina, que ela pretende cursar no ano que vem. Mas o pai dela, com medo das altas expectativas da filha, tentou acalmar os ânimos dizendo que ainda era cedo para comemorar, afinal ainda falta a segunda fase da prova e até mesmo a correção da redação, que confere boa parte da nota final. Vi calado, compreendi a tentativa do pai em proteger a filha da decepção, mas discordei.
Acredito que, assim como nas finanças, toda e qualquer conquista deve ser comemorada com entusiasmo. Afinal, são os pequenos passos que nos levam ao destino no qual tanto queremos chegar. Reconhecer as pequenas vitórias dos jovens e incentivá-los a se manterem firmes em suas jornadas faz toda a diferença. Vibrar com eles a cada pequena conquista não vai fazê-los “sonhadores demais”, mas sim mais confiantes de que podem seguir para o próximo degrau.
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Em vez de passar nossas percepções de mundo, carregadas das nossas frustrações e experiências pessoais, temos que apresentar aos jovens a realidade e, a partir disso, mostrar como construir caminhos que podem levar aos sonhos deles. Se eles vierem a se frustrar, faz parte da vida e é importante aprender a lidar com esse sentimento também.
“Grandes objetivos não se conquistam do dia para a noite. Exigem planejamento, resiliência e consistência. A noção de senso de progresso, de que estamos avançando aos poucos, nos ajuda a manter o foco nos objetivos mesmo quando o caminho parece tortuoso e longo demais”, diz Isabella Paschuini, mestranda em Economia Comportamental na London School of Economics e diretora de Estudos Comportamentais da Multiplicando Sonhos.
Decidi trazer esse tema aqui porque vejo muito isso pelas escolas onde passo. Pais que falam para os filhos que eles precisam ter noção da realidade humilde da família, que precisam trabalhar desde cedo e que certos sonhos são altos demais para eles. Isso tende a gerar um ciclo de aprisionamento da família onde ela nunca ascende socialmente porque ninguém ousa pensar fora da caixa ou, às vezes, nem sabem que existem outras perspectivas.
Em 2019, na minha estreia no projeto piloto da Multiplicando Sonhos em uma escola do extremo leste da capital paulista, eu iniciei a aula perguntando qual era o sonho dos alunos. Enquanto quase todos foram externando seus sonhos, um aluno me chamou atenção. Na hora não demonstrei, mas confesso que fiquei completamente estarrecido quando ele me respondeu que não tinha sonhos.
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Ele não pensava no futuro, em construir uma carreira ou continuar os estudos. Ele simplesmente “deixava a vida levar”. Felizmente, o programa da Multiplicando Sonhos cruzou com esse jovem e hoje ele tem outra mentalidade, cursa Ciências Contábeis e já planeja seus objetivos futuros poupando a cada mês.
Assim como o nosso programa educacional, que incentiva e comemora cada centavo poupado, pergunto ao leitor: você se permite comemorar cada conquista por menor que seja? Você incentiva seu filho e comemora com ele cada progresso alcançado?
Nem sempre, não é mesmo?
A escola e projetos como o da Multiplicando Sonhos têm um papel fundamental. Acabamos sendo uma porta para que esses alunos que vivem em famílias restritivas ampliem seus horizontes. E mais: já vimos muitos casos de alunos que acabaram levando o conhecimento aos pais depois que fizeram o programa e descobriram que juntos podem buscar por alternativas e alcançar sonhos.
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Não à toa, esses jovens criam laços com os professores da Multiplicando Sonhos, que chamamos de multiplicadores. Isso acontece porque estamos ali dizendo a eles que são capazes. E um dos maiores motivadores do comportamento humano é o senso de progresso. A ciência do comportamento mostra que quando temos um feedback positivo sobre algo que fazemos, a tendência do nosso cérebro é buscar mais e mais por esse estímulo de prazer.
Mas o que esse senso de progresso tem a ver com você e a educação financeira? Tudo! Normalmente, quando iniciamos o planejamento da nossa vida financeira, começamos pelo orçamento, cortando os supérfluos e readequando as despesas, quando o dinheiro efetivamente sobra e começamos a guardá-lo, essa economia acontece com pequenos valores, que com constância, esse dinheiro vai crescendo
e possibilitando o alcance das metas de pequeno, médio e longo prazos.
Esse crescimento do dinheiro, que aqui eu chamo de progresso, não é fácil, exige muita disciplina, foco e principalmente determinação. Por que não comemorar cada novo passo?
Nas aulas, o time da Multiplicando Sonhos incentiva os alunos a guardarem dinheiro, começando pequeno para alcançar valores maiores. Existe uma máxima no mercado financeiro que diz: o importante não é o quanto você guarda, mas é guardar sempre com constância para fazer disso um hábito. “Saber que estamos progredindo em uma missão funciona como um motivador e minimiza o gap que existe entre o sonho e a concretização, gap esse que faz com que muitos se desanimem de dar um primeiro passo. É importante entender que o progresso nunca é uma linha reta crescente. Existem altos e baixos no caminho, e é preciso lidar com eles”, explica Isabella.
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Por fim, reforço: está tudo bem em comemorar uma conquista mesmo que ela não seja ainda tudo aquilo o que você deseja. Confie no processo. Sonhos grandes não são conquistados de um dia para outro.
Gosto muito de uma frase: “Sonhe grande, mas comece pequeno”. E isso se aplica muito às nossas finanças, se não comemorarmos as pequenas conquistas como teremos ânimo para curtir as grandes?