Mas será que essa regra se aplica a todas as empresas e resiste ao tempo? Decidi testar a teoria do Barsi com as pagadoras trimestrais dos últimos três anos (2022-2024). Um estudo exclusivo feito para esta coluna pelo analista Bruno Oliveira, do Vida de Acionista, em parceria com a Economatica, mostrou que apenas 17 empresas distribuíram proventos pelo menos trimestralmente nesse período. Menos de 5% do total de companhias listadas.
Entre elas estão Banestes, Bradesco, Banco do Brasil, Camil, Celesc, Cemig, Eztec, Gerdau, Gerdau Metalúrgica, Irani, Itaúsa, Banco Itaú, Klabin, Lojas Renner, M.Dias Branco, Banco Santander e WLM.
O critério: pagamentos ao menos trimestrais todos os anos, em 2022, 2023 e 2024. No caso de bancos, como Banestes, Bradesco e Itaú, que distribuem JCP (juros sobre capital próprio) mensais, com frequência maior do alvo, também foram considerados os pagamentos complementares nos trimestres. Companhias como Caixa Seguridade (CXSE3) e Taesa (TAEE11) ficaram de fora. A primeira só iniciou a recorrência trimestral em 2024, e a segunda deixou de pagar todo trimestre no ano passado.
A partir da lista, Oliveira ranqueou as 5 melhores pagadoras por dividend yield (retorno em dividendos) de cada ano. Cemig (CMIG4), Banco do Brasil (BBAS3) e Banestes (BEES4) apareceram entre as TOP 5 nos três períodos. Uma evidência da teoria de Barsi: setores perenes, como bancos e energia, concentram boas pagadoras. Veja abaixo:
Mas Oliveira pondera que dividend yield alto não significa necessariamente a “melhor empresa” destes setores. “Não considero que a Cemig seja a melhor do setor elétrico, posto que deixo para Engie (EGIE3). O mesmo vale para Banestes, que perde para Itaú, indiscutivelmente o melhor banco, seguido do Banco do Brasil”, afirma o analista.
Outro ponto em comum entre essas três pagadoras trimestrais de destaque: todas têm participação estatal. Isso reforça a lógica de que os controladores precisam de caixa e proventos recorrentes, o que, por tabela, também favorece o investidor minoritário.
Esse critério dialoga com outro indicador citado por Barsi para identificar empresas boas pagadoras: o compromisso de subsidiar ou remunerar alguém. Barsi mencionou o banco Santander, que envia recursos à matriz na Espanha, e a Klabin, que precisa pagar grandes acionistas que não integram a gestão da empresa.
Além disso, nenhuma dessas companhias é novata. Todas acumulam décadas de histórico na bolsa de valores.
As que não provam a tese do Barsi
O estudo apontou empresas que, apesar da frequência, não servem para uma carteira de renda passiva. Entre elas estão Camil (CAML3) e M. Dias Branco (MDIA3) – que passou a pagar mensal em abril de 2025, mas ainda com dividend yield baixo. Segundo Oliveira, ambas do setor de alimentos sofrem com margens apertadas e custos voláteis de commodities, com inconsistência nos lucros.
A Lojas Renner (LREN3) precisa investir pesado para se manter competitiva, o que reduz espaço para dividendos. A construtora Eztec (EZTC3) é sensível a juros e ciclos econômicos. Já a WLM (WLMM4), concessionária de caminhões, ônibus e serviços da Scania, tem margens estreitas e também sofre com os juros.
Oliveira lembra ainda que a frequência pouco importa e o próprio Barsi já sustentou isso em seu livro O Rei dos Dividendos, no capítulo 7 (“O milionário”). Ali, Barsi escreve: “Se eu desejava me aposentar com dividendos, e se escolhesse empresas que os pagam duas vezes ao ano, deveria ter meia dúzia de empresas. Afinal, se pagassem uma vez ao ano, precisaria de 12. Acabei concluindo que 12 era um bom número, e nas décadas seguintes procuraria me ater a essa média, oscilando um pouco, para menos ou mais, ao sabor das oportunidades que o mercado apresentava.”
Na visão de Oliveira, a própria biografia de Barsi trata a frequência como algo prático e traz uma solução simples: quanto menor a frequência de pagamento, maior a quantidade de companhias na carteira. O analista concorda e resume: dinheiro não tem carimbo. “R$ 1 recebido da Taesa vale o mesmo que R$ 1 pago do Banco do Brasil”, diz.
Por isso, a dúvida “toda empresa que paga dividendo trimestral é boa ou toda empresa boa paga trimestral?” nem sempre se sustenta. Pesam na decisão outros indicadores, como governança, histórico, cumprimento de projetos, retorno sobre capital investido (ROIC), dividend yield e crescimento de receitas e lucros constantes. “Tudo isso é mais importante que a frequência estabelecida na política de proventos”, aponta Oliveira. Exemplo disso é a elétrica Taesa: deixou de pagar trimestralmente em 2024, mas continua sendo boa pagadora.
Boas pagadoras não trimestrais
Algumas empresas provam que não é preciso pagar trimestralmente para estar entre as melhores.
A BB Seguridade (BBSE3) distribui dividendos semestrais e não pretende mudar a política como contei nesta coluna. Ainda assim, entrega resiliência mesmo diante de juros e cenário macro volátil e remunera os investidores com mais de 90% do lucro.
A CSN Mineração (CMIN3) também paga ao menos duas vezes ao ano e consegue competir com a Vale (VALE3). “Possui alavancagem negativa, caixa líquido e, desde a abertura de capital, distribui mais de 100% do lucro em dividendos, mesmo com o desafio de expandir a produção”, diz Oliveira.
Já a transmissora Isa Energia (ISAE4) reduziu a frequência e agora paga anualmente em parcelas, buscando eficiência. Mesmo assim, segue entregando valor, mesmo em ciclo forte de investimentos.
Opinião sincera
Concordo com Barsi: pagar trimestralmente pode ser um bom sinal, mas não é regra. Qualidade não se mede pela frequência.
Muitas empresas adotaram proventos mensais ou trimestrais nos últimos anos só para atrair investidores e gerar liquidez. Nem tudo que reluz é ouro. Ou, como diz o ditado, “macaco de seda continua macaco”.
Investidor, não se iluda só pela frequência dos dividendos das empresas. Quer conhecer quem realmente passa no teste? Descubra as boas companhias na coluna Dividendo à Vista.