O investidor precisa colocar a geopolítica na conta, porque ela impacta diretamente as estratégias, os ativos e os retornos das aplicações do mercado financeiro. (Foto: Adobe Stock)
“Quando os fatos mudam, eu mudo de opinião. E você, o que faz?” Essa frase famosa do economista britânico John Maynard Keynes resume bem o dilema do investidor moderno no Brasil: aceitar que decisões tomadas bem longe daqui mexam diretamente no seu bolso.
Não estou falando de “tendências” em tom acadêmico, mas sim de impactos reais no lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda) das empresas, nos custos logísticos e na volatilidade cambial, coisas que ou queimam dinheiro ou aumentam retornos rapidamente. É por isso que, em pleno 2025, qualquer investidor sério precisa colocar a geopolítica na conta.
Sem enrolação, seguem cinco pontos-chave que conectam as decisões políticas globais ao retorno financeiro de quem investe por aqui.
Primeiro ponto: o risco sistêmico que vai além do fiscal brasileiro
Sanções a fertilizantes russos, bloqueios no petróleo no Mar Vermelho ou mudanças repentinas nas regras de exportação na África mudam rapidamente a oferta global, impactando diretamente os resultados de empresas exportadoras na B3. Ignorar esses fatores pode gerar um erro caro: modelos financeiros que só olham para o mercado interno não preveem o susto que vem de fora.
Segundo ponto: cadeias de suprimentos que quebram mais fácil do que parecem
Um lockdown (fechamento geral) na China ou um engarrafamento no Canal de Suez bastam para inflacionar custos de frete, reduzir margens em empresas de autopeças mineiras ou atrasar entregas de agroquímicos em Mato Grosso. Quem não monitora esses riscos geopolíticos acaba errando feio no preço-alvo.
Terceiro ponto: políticas industriais como ferramentas estratégicas
O Inflation Reduction Act (política de redução de inflação, em tradução livre) nos EUA e o programa chinês “Made in China 2025” não são apenas planos burocráticos, eles definem para onde vai o dinheiro global. Determinam se o lítio chileno será um produto premium ou só mais uma commodity e quem capturará valor em baterias, semicondutores ou hidrogênio verde. Avaliar investimentos sem considerar esses planos é enxergar só metade do cenário.
Quarto ponto: políticas comerciais e tarifas como fontes de vantagens e desvantagens competitivas
Desde abril deste ano, exportadores brasileiros enfrentam uma tarifa geral de 10% nos EUA. Em junho, as taxas sobre aço e alumínio – veja aqui as empresas afetadas – subiram para 50%, atingindo diretamente indústrias siderúrgicas e automotivas. Produtos chineses passaram a sofrer tarifas de 55%, empurrando cargas do país asiático para outros mercados, como Europa e Índia.
Para investidores brasileiros, isso significa margens menores no curto prazo, oportunidades de buscar fornecedores alternativos como México ou Vietnã e maior volatilidade cambial devido aos novos custos embutidos nos preços. Sem uma visão estratégica dessas questões, as empresas viram reféns do noticiário diário.
Quinto ponto: arbitragens regulatórias geram oportunidades reais
Acordos como o da Índia com Emirados para pagamentos em moedas locais podem criar janelas de captação de capital mais barato para empresas brasileiras. A aproximação do Mercosul com Singapura abre oportunidades para o agro brasileiro reduzir custos e melhorar a logística. Essas oportunidades são vistas apenas por quem acompanha minutas de acordos e os bastidores diplomáticos, algo que ultrapassa qualquer análise quantitativa tradicional.
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Entender geopolítica hoje é parte obrigatória da estratégia de investimento. Não se trata de luxo, mas sim de proteção contra riscos reais. Em um mundo em que um único tweet presidencial muda tudo, seguir o conselho de Keynes e ajustar rapidamente sua visão às novas realidades pode ser a diferença entre quem dorme melhor à noite e quem acorda com melhores resultados financeiros.